Intervenção do
deputado Joaquim Matias

Debate de Urgência sobre a co-incineração de resíduos tóxicos

14 de Janeiro de 1999



Sr. Presidente,
Sr.ª Ministra,
Srs. Deputados,

Estamos perante uma decisão do Governo, relativamente aos resíduos industriais tóxicos que é no mínimo incorrecta, extemporânea, mal fundamentada e muito pouco esclarecida.

Sempre nos pronunciámos pela imperiosa necessidade de se encontrarem com urgência as soluções correctas para o tratamento deste tipo de resíduos e acabar com a caótica e inaceitável situação actualmente existente em Portugal.

Tais soluções contudo, devem resultar da adopção de uma política correcta e coerente para o sector que este Governo, tal como o anterior, não possui, política que tenha como objectivos principais promover a melhoria da qualidade do ambiente e a defesa da saúde das populações, ao contrário do método adoptado que em detrimento destes objectivos privilegiou os interesses técnicos e de rentabilidade do grupo económico a quem o Governo atribuiu a elaboração da proposta.

Uma prática política correcta passa pela elaboração de um Plano Nacional de resíduos Industriais, assente numa estratégia de prevenção e integrado no ordenamento do território, o que implica a participação das autarquias locais na sua definição.

Ao tomar esta decisão, através do despacho da Sr.ª Ministra, o Governo manifestou um total desprezo pelo diálogo e pela participação popular, e transformou a discussão pública do Estudo de Impacte Ambiental numa farsa, defraudando a expectativa das populações que numa manifestação cívica exemplar, de cidadania responsável, se tinham empenhado nessa discussão. Nem uma resposta o Governo deu às muitas questões concretas que legitimamente lhe foram colocadas.

As populações por seu lado, têm uma fundamentada e legítima falta de confiança nos processos industriais e na administração pública, consequência de prática generalizada de atropelos à legislação em vigor e atentados à saúde pública cometidos quotidianamente, por numerosos empresários, perante a inadmissível passividade do Governo.

Sr.ª Ministra,

O parecer da Comissão de Avaliação do Impacte Ambiental registou importantes lacunas no estudo respectivo.

Ora sendo este indispensável ao licenciamento da actividade e o proponente reconhecido, pela mesma comissão, como não apresentando o património de desempenho ambiental local que lhe seria exigível pela sua natureza (leia-se prevaricador sistemático) como é possível ultrapassar as lacunas do Estudo de Impacte Ambiental e não exigir rigor antes de tomar a decisão?

Também o parecer do Conselho Nacional do Ambiente e do Desenvolvimento Sustentável alertou o Governo para o facto de não estarem reunidas as condições necessárias à decisão, mas o Governo igualmente ignorou.

Neste processo pouco se tem falado da estação de transferência e particularmente da Estação de Tratamento de Resíduos a localizar no Barreiro. No entanto, a já referida Comissão de análise recomendou que se ponderem outras estações o que aliás deveria ter sido feito de inicio, mas o Governo ignorou também a questão.

Muito ao gosto dos exemplos que a Sr.ª Ministra tem dado, confundindo a Europa com alguns países da Comunidade Europeia que utilizam a co-incineração, deveria dar o exemplo nesses países para as Estações de Tratamento que se localizam em locais afastados convenientemente de aglomerados populacionais e junto de nós viários escolhidos estrategicamente de acordo com os percursos de transporte dos resíduos. Ora os transportes são justamente uma das partes ignoradas nos estudos efectuados e a Estação de Tratamento situa-se bem no interior de um aglomerado urbano de elevada densidade, com cerca de 45.000 habitantes a menos de 2 Kms da Estação e com vias de acesso congestionadas.

Além de que é falso, como o Governo sabe, que a Quimiparque seja um parque industrial, pois a sua reconversão tem sido feita no sentido de ser um parque empresarial integrado no tecido urbano. 60% das mais de 300 empresas instaladas são de serviços, incluindo centro comercial com cinemas e até proposta para localização de estabelecimento de ensino superior com o aval do sr. Ministro da Educação que já visitou o local.

Tratando-se de um parque que tem actividades industriais, algumas das quais ainda comportam elevados riscos, a colocação desta estação ao lado, com as características definidas no próprio estudo, pode comportar-se como um detonador de grande risco para pequenos previsíveis acidentes que noutro local teriam proporções bastante inferiores e substancialmente diferentes.

Sr. Presidente,
Srª Ministra,
Srs. Deputados,

O que nasce torto... E este processo tem de facto tantas incorrecções, a falta de fundamentação é de tal ordem, e o esclarecimento devido e legitimamente reclamado pelas populações é tão escasso e sem objectividade, que não há comissão de acompanhamento que lhe valha.

É urgente parar este processo, corrigir os erros que desde a origem o deformam para que se possa o mais rapidamente possível caminhar no sentido correcto, isto é: pôr termo à insuportável situação dos resíduos industriais em Portugal com objectivos bem definidos e consensualmente assumidos, como a País há muito reclama.

Disse.