Sr. Presidente,
Sr. Deputado Renato Sampaio,
Quero fazer-lhe uma pergunta muito breve, mas que, julgo, ajudará a esclarecer e até a complementar a pergunta feita pela Sr.ª Deputada Alda Macedo.
Tem a minha pergunta a ver com a distância de 1 km da linha de costa. Regra geral, quando falamos da distância da linha de costa, a esmagadora maioria das pessoas tem a ideia de que se trata da distância da costa para o mar, ou seja, da distância em sentido perpendicular da costa para o mar. No entanto, presumo que este projecto de lei se refira à distância para o interior, portanto na direcção da plataforma continental.
De qualquer das formas, há, muitas vezes, uma manifesta necessidade de dragar nos leques aluvionares os rios, nos que entram efectivamente pelo mar, isto é, que não estão situados dentro da costa, não estão situados da linha de costa para dentro.
Acho que seria importante clarificar esta matéria, tendo também em conta este aspecto: o de existir também dragagem para fora da linha de costa, nos leques aluvionares para fora da linha de costa — é claro que nem sempre, mas acontece.
Importava que esta matéria ficasse esclarecida, até para, posteriormente, se o Partido Socialista estiver nessa disposição, podermos encontrar uma redacção mais clara quanto a este ponto.
(…)
Senhor Presidente
Senhores Deputados
No entendimento do PCP, a protecção da Orla Costeira Portuguesa é uma necessidade de primeira ordem, não só pelo facto de a nossa faixa costeira estar sujeita a continuada degradação, essencialmente por acção desgovernada e descontrolada da actividade antrópica ou industrial, de forma particular, no que diz respeito às actividades extractivas de recursos minerais. No entanto, para o PCP, a protecção da Orla Costeira não termina na protecção das praias e das regiões da costa arenosa do País, mas estende-se também à necessidade de melhorar o exercício das políticas de urbanismo e Ordenamento do Território junto à linha de costa.
A pressão urbanística desmesurada que se verifica junto à linha de costa portuguesa, fruto, essencialmente, da construção desregrada para fins turísticos, por demais conhecida e identificada, mas ainda com deficiente fiscalização e actuação por parte das entidades competentes, o que tem muitas vezes vindo a constituir autênticos atentados contra o património costeiro e dunar do país; é também essa pressão urbanística uma matéria que consideramos dever ser englobada em políticas de protecção da Orla Costeira.
No entanto, o Partido Socialista, apresenta-nos um Projecto de Lei que avança no sentido da mera actuação junto da indústria extractiva. Não que não sejam as medidas propostas necessárias, mas consideramos que a protecção da Orla Costeira não se pode limitar a este diploma, nem mesmo ao conjunto deste com o que discutiremos no futuro sobre controlo da actividade de extracção de inertes.
A protecção da orla costeira portuguesa, nomeadamente dos seus areais e das frentes edificadas que lhe são próximas é, portanto, um imperativo de intervenção a nível legislativo. Existem casos de verdadeiro risco para as populações devido ao recuo da linha de costa. A colocação de esporões pode, efectivamente, desacelerar o recuo da linha de costa, mas de forma alguma a pode travar. A política e as opções erradas de ordenamento do território de que a linha de costa tem sido vítima preferencial também a conduzem a casos de risco e de perigo, já que não são raros os casos de construção em regiões que se encontram em nítido recuo.
Ou seja, a protecção da orla costeira portuguesa, principalmente da sua costa Ocidental, cujos sedimentos estão expostos a uma acção mais erosiva, carece de muito mais cuidados políticos, urbanísticos e legislativos do que os que lhe têm sido dedicados nos últimos anos e, também, do que aqueles que são agora apresentados com este Projecto de Lei.
O Projecto de Lei apresentado não constitui, obviamente, um retrocesso legislativo para as políticas de protecção da orla costeira e das populações que vivem junto a esta. Relembro que, na região de Praia de Mira, por exemplo, bairros inteiros estão neste momento confrontados com uma situação de risco que tem exigido construção de esporões a um ritmo acelerado. No entanto, e não representando um retrocesso, este Projecto de Lei não representa o avanço que seria necessário.
Como se sabe, o troço final dos rios é, não só a sua porção com menos capacidade erosiva, como também aquela que menos capacidade de transporte sedimentar possui, exactamente por dispor de uma energia muito baixa. As zonas com maior capacidade de erosão e transporte situam-se a montante no percurso dos rios. O Partido Socialista vem com esta lei agir sobre a porção final do rio, a mais próxima da foz e deixar intacta e intocável a extracção de inertes ao longo do curso do rio. Ou seja, o Partido Socialista propõe que até à distância de um quilómetro seja interdita a actividade de extracção de inertes nos cursos dos rios, salvo excepções que não explicita. Mas nada diz sobre o restante percurso dos rios e sobre as porções onde efectivamente são gerados e transportados os sedimentos, principal fonte de alimentação dos areais e da orla costeira arenosa. A construção de grandes barragens sem remoção de sedimentos provoca também a retenção destes, impossibilitando que cheguem à costa e se integrem nos areais, facto que só merece referência no preâmbulo do Projecto de Lei. Preâmbulo, que também refere a necessidade de medidas curativas, as quais não merecem uma linha no articulado proposto.
Claro que os fenómenos de avanço e recuo da linha de costa também existem sem actividade humana, mas os graves problemas que hoje se colocam advêm essencialmente dos dois vectores que já assinalei: a excessiva e desregrada retenção ou extracção de sedimentos e a construção em regiões de risco.
É perante esta dimensão do problema, bastante mais ampla que a estreita abordagem que o Partido Socialista lhe dedica, que o PCP considera que este Projecto de Lei pode não constituir o avanço necessário. Antecipando já, ainda que brevemente, o conteúdo do Projecto de Lei que o preâmbulo refere como complementar deste, consideramos que mesmo a sua conjunção não resolve no fundamental o problema, ainda que represente um passo significativo para a fiscalização do Governo no que toca às actividades extractivas de inertes.
No entanto, nenhum dos diplomas garante o essencial: que a extracção e a retenção de sedimentos ao longo do curso dos rios seja sempre inferior à necessidade de alimentação dos areais para que o balanço sedimentológico dos troços de costa em risco seja, no mínimo, próximo de nulo.
O PCP, como é aliás hábito, disponibiliza-se para contribuir para o aperfeiçoamento do diploma, introduzindo as questões que considerar necessárias. Esperamos que a aprovação deste Projecto de Lei não venha a significar que o Partido Socialista e mesmo o Governo considerem este assunto tratado e arrumado. O PCP tem mostrado a sua preocupação sobre esta matéria e considera, claro, que esta iniciativa constitui um passo positivo, contribuindo para a consolidação da legislação em torno da protecção da orla costeira, mas mantém o compromisso com o aprofundamento destas questões e fará sempre o necessário para relembrar que este Projecto por si, não chega. Por fim, esperamos também, que este Projecto não represente apenas mais um tiro de pólvora seca, não vindo a apresentar consequências de futuro e não sendo, também de futuro e a médio-prazo, seriamente complementado por um plano sério e rigoroso de protecção da orla costeira, baseado num consistente balanço das alterações morfológicas e topográficas da linha de costa que possa munir o Governo dos dados necessários para uma intervenção direccionada, tendo em conta as diferentes tendências de alteração da orla costeira.
Disse.