Sistema nacional de certificação energética e de qualidade do ar interior dos edifícios e as respectivas normas técnicas
Intervenção de Miguel Tiago
5 de Janeiro de 2006

 


 

 

Sr. Presidente,
Srs. Deputados:

Estamos perante uma discussão em torno de iniciativas de conteúdo importante e oportuno, que incidem sobre matérias que nos exigem actuação, quer no plano da saúde pública quer no plano da preservação ambiental e da qualidade de vida.

Os problemas já conhecidos, até mediaticamente, advenientes da ausência de controlo no que toca à qualidade do ar no interior dos edifícios podem, efectivamente, ser minimizados e deve o Governo empenhar-se no seu controlo.

Ao mesmo tempo, é cada vez mais importante, não só pela existência da Directiva 2002/91/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, que sejam adoptadas regras para a racionalização do consumo energético dos edifícios, quer seja pela importância da diminuição de emissão de gases com efeito estufa quer seja pela diminuição dos consumos sobredimensionados de energia.

O PCP valoriza a intenção dos grupos parlamentares que dão agora o seu contributo para avançar no que toca ao papel do Estado nesta matéria. No entanto, não é demais lembrar que, por várias vezes, não foram dados os necessários passos no desenvolvimento desta legislação por força das contendas partidárias.

Relembro que ainda na IX Legislatura o PSD e o CDS inviabilizaram uma proposta do Partido Socialista, invocando que o Governo de então estaria prestes a emitir tal legislação e regulamentação.

Veremos agora se não faz o Partido Socialista o mesmo, por via da aprovação exclusiva do seu projecto de resolução.

Para o PCP faz todo o sentido que esta legislação seja discutida na Assembleia da República ao invés de a remeter exclusivamente para o Governo, como propõe o Partido Socialista. No entanto, não queremos com isto dizer que esta Assembleia está em condições perfeitas de aprovar um projecto de lei, trazido claramente do anterior governo, que inclui todas as especificidades técnicas, como nos propõe o PSD.

Cremos que o processo mais indicado seria o de esta Assembleia elaborar um projecto, após o necessário envolvimento de especialistas e de entidades associadas à temática, com ponto de partida, claro, nos projectos de lei hoje aqui apresentados, que pudesse posteriormente servir de base a uma regulamentação por parte do Governo.

Julgamos que os problemas abrangidos pelos projectos de lei aqui presentes são bastante mais vastos do que o que possa parecer à partida, tendo em conta que este novo enquadramento, além da sua relação com uma vasta política de preservação ambiental, afectará transversalmente um amplo conjuntode edifícios, entre os quais se encontram escolas, hospitais e outros demais edifícios de serviços públicos.

A dimensão da influência do projecto não é, pois, de fácil tratamento sem recurso a uma também ampla consulta a todos os envolvidos nas modificações que serão introduzidas pela aprovação de legislação desta natureza.

Importa ainda relevar que a resolução dos problemas não é meramente legislativa e que, nesse quadro, é imperativo questionar quais serão os meios de actuação e fiscalização que o Governo estará disposto a afectar a este trabalho, bem como quais serão os custos envolvidos na adaptação e construção dos edifícios não residenciais, particularmente aqueles que são propriedade do Estado.

Acresce ainda que as formas que o PSD e o CDS-PP sugerem para a resolução dos problemas acarretam consequências que não cabem apenas a esta Assembleia julgar, quer pelos aspectos técnicos que transportam quer pelas novas exigências que viriam a colocar à Administração Pública e às entidades a que os projectos atribuem agora competências fiscalizadoras. Veja-se, por exemplo, que existem nos projectos algumas alterações de competências, nomeadamente possibilitando a transferência de competências entre autarquias e poder central.

Neste sentido, não seria de todo prejudicial aproveitar esta oportunidade para iniciar um processo de consulta pública, incidindo especialmente junto de especialistas e entidades envolvidas, desde o projecto à utilização, passando pela construção e fiscalização.

O PCP não está, obviamente, apostado em atrasar ainda mais o processo legislativo que venha actualizar os mecanismos legais existentes, como se propõem estes projectos de lei. Tanto o projecto de lei do PSD como o do CDS-PP tentam apenas vir adaptar o actual enquadramento legislativo da certificação do comportamento térmico dos edifícios, salvaguardando até, de alguma forma, a experiência passada e propondo uma aplicação faseada de um regime adaptado à transposição da Directiva 2002/91/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, bem como revela até preocupações no que toca ao cumprimento da Resolução do Conselho de Ministros que aprova o Programa de Actuação para Reduzir a Dependência de Portugal face ao Petróleo, tudo isto inserido no esforço de combate às alterações climáticas, previsto também em Resolução do Conselho de Ministros e no compromisso português com o Protocolo de Quioto.

O PCP não se oporá a nenhuma das soluções legislativas aqui propostas. No entanto, com todo o material legislativo técnico que nos é apresentado, consideramos que não é momento oportuno para assumir compromissos sem antes existir uma ampla discussão e consulta a especialistas, bem como consideramos não ser necessário remeter agora todo o processo para o Governo,.

O PCP dará o seu contributo para que, no quadro da discussão em comissão parlamentar especializada, seja possível alargar o leque de agentes intervenientes na elaboração dos aspectos mais técnicos e daqueles relacionados com as necessárias adequações das entidades competentes e dos seus trabalhadores.