Gestão das áreas protegidas
Intervenção do Deputado Honório Novo
28 de Novembro de 2002

 

Senhor Presidente
Senhores Membros do Governo
Senhoras e Senhores Deputados

A verdade é que a lei é bem clara. Sem planos de ordenamento, as áreas protegidas nacionais, independentemente da sua natureza – não deveriam poder funcionar legalmente.

E, registe-se e sublinhe-se, a lei que obriga a aprovar os planos de ordenamento das áreas protegidas, seja dos parques nacionais ou dos parques naturais, seja das reservas naturais ou das áreas de paisagem protegida, essa lei, data já de Janeiro de 1993!

Ao longo de quase dez longos anos, apenas três áreas protegidas portuguesas aprovaram planos de ordenamento: Peneda Gerês, Sintra Cascais, Litoral Alentejano e Costa Vicentina. Há, é certo, outros três parques naturais – o da Ria Formosa, o da Serra da Estrela, o da Serra de Aire e Candeeiros – que já tiveram planos de ordenamento mas que a lei de 93 fez caducar. Mas a verdade é que as restantes dezanove áreas protegidas (num total de 25) nunca tiveram Planos de Ordenamento. Nem antes, nem depois de 1993. Nem antes nem depois da Lei 19/93. Com as responsabilidades a terem que ser repartidas por diversos e sucessivos governos.

Há casos de áreas protegidas criadas há mais de vinte anos, que nunca tiveram Planos de Ordenamento. É o caso do Parque Natural da Arrábida (criado em 76 e que apenas possui um plano de ordenamento parcial), do Parque Natural de Montesinho (criado em 79), das Reservas Naturais do Estuário do Tejo (criada em 76), do Sapal de Castro Marim e Vila Real de Santo António (criado em 75), da Reserva Natural do Estuário do Sado (criada em 1980).

Só esta constatação, verdadeiramente inaceitável, confirma a responsabilidade que pesa sobre governos anteriores e mostra, também, como era absolutamente inevitável a prorrogação dos prazos legais estipulados para a elaboração dos diferentes Planos de Ordenamento.

Umas vezes adiou-se, com o pretexto de se estar à espera da elaboração de PDMs ou de Planos Regionais de Ordenamento. Outras vezes, com o pretexto de estar a ser definida a Rede Natura. Outras ainda a pretexto de nada. É que os pretextos escondem apenas a falta de vontade política para vencer interesses instalados, para fazer dotar as áreas protegidas dos meios humanos que pudessem, com rapidez e eficácia, elaborar diagnósticos, motivar a participação das populações, das associações de interesses económicos e das organizações ambientalistas na elaboração dos planos de ordenamento das áreas protegidas.

O desenvolvimento das áreas tem que se basear em planos que a todos motivem, incluindo as populações aí residentes, as quais deverão reconhecer nessas zonas oportunidades acrescidas de melhoria da sua qualidade de vida, em vez de se sentirem relegadas para a cauda do desenvolvimento civilizacional. Isto só é possível com a participação empenhada dessas populações, isto só se consegue com uma gestão que sirva e defenda a natureza mas não esqueça a qualidade de vida dos homens e mulheres que aí vivem e trabalham.

Senhoras e Senhores Deputados,

As áreas protegidas não podem continuar a ser áreas desprotegidas pelo poder político. E o que este governo anuncia não augura, desde já, nada de bom.

A pedra de toque que mostra como está a ser encarado o futuro das áreas Protegidas revela-se no Orçamento de Estado, no investimento que o governo prevê para o conjunto da Rede Nacional da Áreas Protegidas.

Contra factos não há argumentos. E a verdade é que, como o algodão, os números não enganam, antes pelo contrário, traduzem opções politicas bem nítidas. E a opção política deste Governo parece ser a do estrangulamento das áreas protegidas.

O investimento global nas áreas protegidas vai diminuir mais de 12 milhões de euros. O governo vai gastar cerca de 23 milhões de euros na Rede Nacional das Áreas Protegidas, 65% do que se vai investir este ano.

Há casos em que a diminuição supera os 50%. No Parque Natural de Montesinho a diminuição é superior a 60 pontos percentuais; na Reserva Natural da Malcata a quebra atinge quase 75 pontos percentuais; na Reserva Natural das Dunas de S. Jacinto ronda os 77 pontos percentuais, o mesmo acontecendo na Lagoa de Santo André.

E se na Reserva Natural do Sapal de Castro Marim e Vila Real de Santo António a diminuição do investimento é “apenas” de 67 pontos percentuais, o caso mais violento de estrangulamento abrange o Parque Natural de Sintra Cascais - onde o investimento vai cair quase 90 pontos percentuais. É sobre isto que gostávamos de ter ouvido falar o Sr. Deputado Luís Rodrigues mas o PSD optou por fazer o discurso voltado para o passado, não se entendendo porque foi pedido este debate de urgência.

É que não é apenas o estrangulamento financeiro a única nuvem negra a pairar sobre o futuro das Áreas Protegidas. O Governo quer, simultaneamente, que os respectivos directores não protestem e permaneçam bem calados. Vai daí, os directores dos parques, coordenadores das Comissões Directivas criadas pela Lei 19/93, que em 1999 passaram a ser nomeados após concurso público, (salvaguardando assim capacidades e competências técnicas) voltam, por decisão recente deste Governo a serem pessoas nomeadas por critérios estritos de confiança política do Governo.

Os amigos podem ficar descansados que há mais lugares disponíveis para ocupar. A competência funcional que estava prevista na lei vai de novo ser substituído pela competência política e partidária (vamos é ver como é que distribuem os outros lugares entre membros do PSD e do CDS/PP).

A única exigência que provavelmente se fará aos futuros directores é que permaneçam mudos perante o quadro negro que se anuncia e que poderá vir a comprometer, já não a capacidade de intervenção, mas seguramente também a própria sobrevivência das Áreas Protegidas em Portugal.