Política da Água
Intervenção do deputado Joaquim Matias
6 de Maio de 1998

 

Senhor Presidente,
Senhores membros do Governo,
Senhores deputados,

A água como recurso estruturante do Desenvolvimento foi o tema do IV Congresso da Água, realizado no passado mês de Março, congresso onde o senhor Presidente da República afirmava na sua comunicação: "Sendo o recurso Água um elemento essencial da soberania nacional, tal implica, antes de mais, responsabilidades acrescidas na sua preservação e valorização e na repressão do seu desperdício e delapidação" fim de citação.

De facto, a gestão dos recursos hídricos deve fazer-se no quadro do ordenamento do território, visando compatibilizar o desenvolvimento económico-social com valores ambientais, tendo em conta que por um lado a utilização e o consumo da água constituem factores indispensáveis ao desenvolvimento económico-social e à melhoria da qualidade de vida, mas por outro, lado os recursos, sendo essenciais ao equilíbrio da maior parte dos ecossistemas e dos processos naturais, como a própria vida, são limitados, pelo que a sua preservação quantitativa e qualitativa é hoje uma preocupação dominante de todas as sociedades, incluindo naturalmente o nosso País, onde a excepção é este Governo cujo Ministério do Ambiente não é capaz de definir e aprovar uma política nacional de recursos hídricos.

Vejamos alguns exemplos:

40%dos nossos recursos em águas superficiais resultam de caudais e escorrências provenientes de Espanha o que nos expõe às consequências dos regimes e usos que esse País faz e venha, a fazer em termos de consumo e de degradação da qualidade.

O Ministério do Ambiente, como se verificou no recente debate de urgência sobre o Plano Hidrológico Nacional de Espanha, não consegue determinar o significado e o impacto desse plano nos nossos recursos em águas superficiais.

Não consegue determinar com rigor as causas que levaram à redução de 20% dos caudais nas bacias do Douro e Tejo e a mais de metade na bacia do Guadiana.

Não determinou ainda caudais ecológicos.

Mas aceita que Espanha reduza o caudal do Guadiana para valores abaixo do que estava estabelecido pelos dois países.

Nos rios portugueses, como o Lima, por exemplo, onde a escassez de caudal fez praticamente desaparecer as espécies piscícolas outrora abundantes, ignora os estudos da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade do Porto, encomenda a outra entidade, certamente para aliviar a consciência, novos estudos de caudal ecológico, mas entretanto assina um acordo com a E.D.P. para um caudal, na época seca, 16 vezes mais pequeno do que o que a primeira entidade havia calculado. Para culminar, não faz qualquer controlo de caudal, no Parque Nacional do Geres nem tem meios para controlar a qualidade, ao que parece muito má, dada a localização da válvula de descarga.

O Senhor Secretário de Estado Adjunto da Ministra do Ambiente no 4º Congresso da Água, enalteceu no seu discurso a estratégia aprovada na resolução do Conselho de Ministros para a faixa costeira e as medidas que o Governo tem vindo a tomar no sentido de valorizar o litoral e, refere ainda, o Programa de Valorização das Praias Fluviais.

No entanto, permite que continue a pilhagem desenfreada de areias por particulares e administrações públicas de portos, com graves prejuízos para os leitos dos rios e com efeitos desastrosos na eliminação do areal nas praias a sul da foz dos rios.

No programa do Governo atribui-se "grau de prioridade máxima", é o termo usado, à elevação dos níveis de atendimento no que respeita a abastecimento de água e saneamento básico.

Mas o Governo continua a licenciar furos de captação nas reservas aquíferas subterrâneas perdendo por completo o controlo do consumo e da deterioração da qualidade que estes provocam, mesmo nos locais sensíveis como o aquífero da Península de Setúbal que já em 1976, por suspeita de possível salinização, foi objecto de estudo, e da elaboração de um modelo matemático, por uma equipa de especialistas patrocinada pela UNESCO.

Apesar das recomendações da referida equipa e das preocupações das autarquias locais, o Governo que detém a exclusividade de licenciar captações fá-lo ao arrepio da legislação em vigor de forma totalmente irresponsável, sem controlo de caudais, níveis freáticos, consumos ou qualidade, seja qual for o motivo da utilização.

O atraso na aplicação das directivas comunitárias, em particular no que se refere ao controlo da qualidade da água para consumo humano tem sido constante, como refere o próprio secretário de Estado Adjunto no seu discurso no 4º Congresso da Água definindo como um dos objectivos de produção de normativo "sanar os diferendos com a Comissão Europeia, sendo que alguns deles já se arrastam há 6 ou 7 anos", Entretanto. o Ministério não possui ainda certificados os laboratórios em número suficiente, e com as valências necessárias, para efectuar um controlo adequado da água nas origens, dado que obrigar apenas os distribuidores a fazerem o controlo no consumo, não é de modo nenhum suficiente.

No que se refere ao tratamento de Águas Residuais Urbanas e Industriais, o Governo continua a dizer que há uma programação de valor superior ao valor comportado pelo Fundo de Coesão, mas o facto é que a programação não corresponde a obra feita ou a fazer durante o período de vigência do II Quadro Comunitário de Apoio. As verbas vão ficar por utilizar e o Governo não cumpre, nem sequer se aproxima, das metas com que se havia comprometido com a comunidade relativamente aos níveis de tratamento a atingir, devido essencialmente à forma centralizada como o fundo é gerido. A prová-lo, estão os bons níveis conseguidos nos sub-programas de aplicação directa pelas Autarquias Locais.

No programa do Governo aponta-se como medida a tomar, rever e completar a legislação em vigor, reforçar o papel do Conselho nacional da Água e criar condições de estudo e gestão do recurso a nível descentralizado, nomeadamente à escala da bacia hidrográfica.

No entanto a prática da gestão dos recursos hídricos deste Governo continua a ser centralizada e governamentalizadora, prática já hoje abandonada em quase todos os países por se mostrar desadequada. É actualmente consensual, na maior parte dos países, que a gestão das águas se exerce a três níveis: nacional, regional e local.

Sendo o nível nacional o de coordenação e de harmonização da política da água.

O regional, o das bacias hidrográficas, e da luta contra a poluição.

O local o do abastecimento de água potável e do saneamento, regra geral público.

O planeamento e gestão das bacias hidrográficas, base essencial para um plano hidrológico nacional deveria competir às Regiões Administrativas e é o atraso na sua institucionalização, por responsabilidade exclusiva do PS, o principal responsável pelo atraso dos planos de bacia só recentemente adjudicados, devido à inoperância do Governo nesta matéria.

Registe-se ainda que o Governo, afirmando-se adepto da descentralização tem no entanto no que se refere à composição e funcionamento do Conselho Nacional da Água e dos Conselhos de Bacia uma atitude em nada diferenciada do Governo anterior; centralista e governamentalizadora, não tendo alterado na legislação o papel das autarquias locais que permanece como um simples utente num organismo meramente consultivo, quando é público e notório que as autarquias locais têm feito muito mais por uma correcta política de gestão dos recursos hídricos do que os Governos.

Senhor Presidente,
Senhores Membros do Governo,
Senhores Deputados,

O Partido Socialista, quando oposição acusava justamente o Governo do PSD de desnorte e irresponsabilidade na gestão dos recursos hídricos.

Afirmava, com razão, que o Governo PSD não tinha orientação nem estratégia definida e não estava à altura das circunstâncias.

certo é que como se vê, a política do Governo do Eng. Guterres nesta matéria, continua idêntica à política do Governo anterior. A situação no país permanece idêntica a 1995. Vai ou não neste quadro o Grupo Parlamentar do Partido Socialista mudar de opinião relativamente ao Governo?

Disse.