Intervenção do Deputado
Agostinho Lopes
Sobre a «consulta pública»
dos Planos das Bacias Hidrográficas
dos Rios Lima, Cávado, Ave e Leça
(em sessão de perguntas ao Governo)
20 de Abril de 2001
Com um atraso de cinco anos relativamente ao prazo previsto no Decreto-lei N.º
45/94, de 22 de Fevereiro (que previa a conclusão dos Planos das Bacias
Hidrográficas «no prazo máximo de dois anos»), foram
concluídos os projectos dos Planos das Bacias Hidrográficas dos
Rios Lima, Cávado, Ave e Leça. Mas mais vale tarde do que nunca!
O grave agora é a fraude de uma anunciada consulta pública, que
terminou 2ª feira, 16 de Abril.
Sr. Secretário de Estado do Ambiente
Onde o cumprimento da alínea d) do N.º2 do Artigo 2º do Decreto-lei
N.º 45/94, que estabelece que o planeamento de recursos hídricos
«deve observar os seguintes requisitos: Participação, envolvendo
agentes económicas e as populações directamente interessadas
e visando o alargamento de consensos».
Onde o cumprimento da Lei N.º 48/98, de 11 de Agosto (Bases da política
de ordenamento do território e urbanismo) que estabelece no N.º
6 do Artigo 20º que «Os planos sectoriais com incidência territorial»
exigem a audição das «autarquias locais abrangidas»,
e no Artigo 21º, que «1 - Os instrumentos de gestão territorial
são submetidos "a prévia apreciação pública"
e que na elaboração "2 - (...) são objecto de mecanismos
reforçados de participação dos cidadãos (...)"».
Onde o cumprimento do Decreto-lei N.º 380/99, de 22 de Setembro (desenvolvimento
do regime jurídico da Lei N.º 48/98) que estabelece, no seu Artigo
6º - Direito de Participação, que «1 - Todos os cidadãos
bem como as associações representativas dos interesses económicos,
sociais, culturais e ambientais têm o direito de participar na elaboração,
alteração, revisão, execução e avaliação
dos instrumentos de gestão territorial»!
Ou o Governo considera que publica um anúncio no imprensa diária,
põe os Planos na Internet e manda o Governador Civil promover uma reunião,
espera pelo fim do prazo, e a consulta pública está feita?
Ou julga mesmo que umas duas ou três reuniões feitas em Universidades,
com a participação de especialistas, é a tal participação
prevista nos normativos legais?
Então as Juntas de Freguesia e as Câmaras Municipais não
são autarquias? E as Assembleias Municipais não são ouvidas?
E que associações económicas, sociais, culturais e ambientais
foram consultadas? Que esforço foi feito para envolver as populações
abrangidas em algo que lhes diz profundamente respeito? Que papel teve a imprensa
regional e as rádios locais? Zero! Zero! Zero!
Sabe-se que o Governo, de campeão do diálogo e do debate, se tornou,
com o correr dos tempos, renitente e relapso ao debate público, à
consulta pública. Basta ver o que fez com a publicação
do Decreto-lei N.º 69/2000, de 3 de Maio, que substitui o Decreto-lei N.º
180/90, de 6 de Junho, em que praticamente liquidou a audição
pública colectiva dos Estudos de Impacto Ambiental. Quase se passou a
exigir a cada cidadão para participar e ter voz na matéria, um
curso superior e ligação à Internet!
Não, senhor secretário de Estado, o que foi feito não é
sequer um simulacro de debate público dos Planos das Bacias Hidrográficas
dos Rios Lima, Cávado, Ave e Leça. É ainda pior do que
o mau que sucedeu com a também discussão pública do Plano
de Ordenamento da Barragem da Caniçada!, que termina hoje, 20 de Abril.
Senhor Secretário de Estado
O PCP levanta esta questão porque, avaliando positivamente os projectos
avançados, considera de grande importância um profundo e abrangente
debate público.
Essencial para a adesão das populações e instituições
da área geográfica dos Planos. Decisivo para garantir a sua participação
activa e voluntária na defesa e recuperação do importante
património (natural, social, económico, cultural,...) que esses
rios representam. Decisivo para ganhar desses cidadãos e instituições
os conhecimentos práticos, em alguns casos seculares, que possuem da
«vida» e «pensamento» desses cursos de água,
a sua essencial contribuição para o enriquecimento dos Planos
das Bacias Hidrográficas. Decisivo porque só essa participação
impedirá que os Planos das Bacias Hidrográficas não sejam
apenas mais um papel bonito, bem feito, mas completamente inócuo e à
margem da vida das populações ribeirinhas, como tantos que conhecemos.
Porque um Plano cumprido pela força das coimas, não resultará,
não existirá!
Senhor secretário de Estado, duas questões:
1. Que debate foi feito até ao passado dia 16 de Abril? Quantas e onde
foram feitas sessões públicas de debate? Quantos e quais os intervenientes?
2. Está o Governo na disposição de realizar o debate público
necessário (considerando que praticamente nada aconteceu) envolvendo
de facto as populações, autarquias, instituições,
alargando prazos, cirando e usando os instrumentos necessários, fomentando
uma autêntica participação cidadã?
(...)
Sr. Presidente,
O Sr. Secretário de Estado acabou por não responder a nada do
que perguntei.
Ou, antes, dá-me a informação, de que eu já tinha
conhecimento, que houve três sessões com especialistas, mas, de
facto, a participação com as populações ribeirinhas
destes rios, concretamente com as autarquias, com as juntas de freguesia, com
as associações locais, foi nula, Sr. Secretário de Estado.
Diga-me qual foi o jornal regional ou a estação de rádio
local (e elas são relativamente activas na região) que participaram
neste debate? Como é que o Sr. Secretário de Estado confunde o
formalismo com a participação real das populações?
O que continuo a perguntar é se os senhores estão interessados
num plano bem feito, bonito, mas sem a participação das populações
e que, inevitavelmente, vai conduzir àquilo que todos nós sabemos
que são planos que estão no papel mas que, depois, não
têm qualquer aplicação prática, exactamente porque
não contam com a participação activa das populações,
desde a sua elaboração e, depois, na sua aplicação.