Agostinho Lopes chama a atenção para
a grave situação da comunidade rural do Couço
Nota do Gabinete de Imprensa
e Carta do Deputado do PCP, Agostinho Lopes,
ao Presidente da Comissão Parlamentar da Agricultura da Assembleia
da República
6 de Agosto de 2001
Nota do Gabinete de Imprensa:
Na sequência da visita que efectuou ao Couço na passada
quinta-feira, onde avaliou as consequências do mau tempo, Agostinho
Lopes, deputado do PCP, enviou ao Presidente da Comissão Parlamentar
de Agricultura uma carta, cujo teor junto divulgamos, onde alerta para o facto
dos estragos provocados serem de grande dimensão, afectarem toda a economia
local e o conjunto da comunidade rural do Couço e propõe a declaração
do estado de calamidade pública e a realização
de uma reunião extraordinária daquela comissão.
Carta de Agostinho Lopes, Deputado do PCP:
PARTIDO COMUNISTA PORTUGUÊS
Grupo Parlamentar
Exmo. Senhor
Presidente da Comissão Parlamentar da Agricultura
Palácio de S. Bento
Lisboa
Lisboa, 3 de Agosto de 2001
Ex.mo Senhor
Presidente da Comissão Parlamentar da Agricultura
1. No passado dia 2 de Agosto, a convite das estruturas locais do PCP, visitei,
acompanhado pelo Sr. Presidente da Câmara de Coruche e pelos Srs. Presidentes
da Junta e da Assembleia de Freguesia, os campos do Couço.
A devastação causada na produção agrícola
por 15 minutos de granizo de grande dimensão e densidade é indescritível.
Searas de tomate e pimentos, melão e melancia, mas também milho,
beterraba, feijão, fruta, vinhas, oliveiras, abóboras, etc.
foram quase totalmente dizimadas. Todas as pequenas hortas familiares foram
fortemente atingidas. São visíveis nos estores de algumas casas
a violência do temporal que caiu sobre o Couço.
2. As consequências são de grande dimensão e impacto económico e social.
Prejuízos económicos para todos os produtores agrícolas localizados no Vale do Sorraia, dentro dos limites da freguesia do Couço (com algumas pequenas áreas anexas de freguesias vizinhas). Uma grande parte destes produtores são seareiros. A destruição das colheitas é, como referi atrás, praticamente a 100%. Muitos estão ainda a pagar dívidas de anteriores acidentes climatéricos. Outros endividaram-se para fazer as searas e pagar as rendas. A perspectiva de um bom rendimento, animava-os na possibilidade de no presente ano saldarem as suas contas. Para outros ainda, eram os rendimentos, que agora desapareceram, um insubstituível complemento para as magras pensões de reforma que recebem.
Problemas para as fábricas de transformação e conserva de tomate e pimentos. Algumas têm no Couço o núcleo principal dos seus fornecedores de matérias-primas.
Preocupações com a quota de tomate terá sido destruído um terço da produção de tomate do Vale do Sorraia 15.000/20.000 toneladas.
Problemas de emprego. Destruída a produção agrícola, não haverá lugar à contratação de trabalhadores para as colheitas. Serão fortemente atingidas as economias de muitas casas do Couço. Situação agravada pela destruição das hortas familiares.
Consequências portanto de significativas dimensões, afectando toda a economia local e o conjunto da comunidade rural do Couço.
3. A situação exige uma rápida intervenção
do Estado na tentativa de minorar prejuízos e prevenir problemas sociais
e económicos de maior gravidade. Os prejuízos morais de quem
viu, em breves minutos, desaparecer-lhe todo o esforçado labor de um
ano e as expectativas de uma boa colheita, ninguém conseguirá
ressarcir. O estado de comoção, as lágrimas nos olhos
dos pequenos agricultores, eram a expressão visível dessa tristeza
e desespero que nada pode pagar. Mas indemnizar os prejuízos materiais
e concretizar medidas para evitar uma crise social podem e devem ser concretizadas.
É assim quase obsceno que se possa pôr em causa a declaração
do estado de calamidade pública por considerações em
torno da contenção orçamental!
Não julgo minimamente satisfatório nem ajustado à gravidade do acontecido no Couço, as ideias apontadas pelos Assessores de Imprensa do Gabinete do Senhor Ministro da Agricultura sobre o assunto, em comunicado de 1 de Agosto.
Os serviços técnicos do Ministério tardam a entrar no terreno. Ontem, dia 2 de Agosto, passados 3 dias sobre o desastre, não havia ainda notícias da sua presença junto dos agricultores. Não se pode considerar que a visita do Director Regional da Agricultura do Oeste e Ribatejo possa substituir a intervenção dos seus técnicos em articulação com as associações de produtores, os próprios agricultores e a Junta de Freguesia do Couço, no levantamento urgente e rigoroso dos prejuízos em toda a sua extensão e consequências.
No referido comunicado não se fala na possível declaração do estado de calamidade pública e, praticamente, tudo se remete, em termos de possível reparação de prejuízos, para o sistema de seguros, classificado, apesar de todas as contestações e imperfeições que sobre ele impendem, como o mais generoso sistema de seguros agrícolas do mundo (?!) (não será exagero Sr. Ministro da Agricultura?). Admitem apenas medidas excepcionais para infra-estruturas danificadas (estufas).
O Governo e o Ministério sabem que não é por opção voluntária como se diz no comunicado que os agricultores não fazem seguro. Não o fazem, pelo estado lastimoso da situação financeira precária das explorações agrícolas. Sabem, apesar das bonificações generosas, que o custo do seguro é ainda particularmente elevado (e de âmbito pouco abrangente) para os pequenos produtores. Sabem que o sistema de seguros agrícolas existente é sobretudo generoso para as companhias de seguros. Sabem que os seguros apenas indemnizam 70/80% do capital seguro. E que, também por isso, é necessária a declaração do estado de calamidade pública.
Ex.mo Senhor Presidente
4. É face àquela situação e às posições conhecidas e assumidas pelo Ministério da Agricultura, e apesar das dificuldades decorrentes do período estival que atravessamos, que venho propor a realização de uma reunião extraordinária da Comissão da Agricultura, com a possível e desejável participação de um representante do Ministério, com os seguintes objectivos:
a) Avaliar da situação, inclusive noutras zonas do País como na Ereira, Montemor-o-Novo e Vale da Vilariça, Bragança (ontem, 1 de Agosto) onde houve também problemas. Se necessário fosse, considerar uma possível visita à região atingida para encontros com agricultores, associações, autarquias locais e técnicos do Ministério;
b) Reflectir sobre o conjunto de medidas tomadas pelo Governo e eventual sugestão de outras iniciativas a tomar.
Julgo de interesse para a reunião da Comissão que proponho, o fazer chegar ao Ministério esta carta e outros documentos que abordam o problema, bem como a solicitação ao Ministério da informação possível sobre a situação e medidas em curso para o Couço e outras zonas atingidas.
Com os meus melhores cumprimentos,
O Deputado
(Agostinho Lopes)