Sobre o embargo da Comissão Europeia à produção bovina nacional
Declaração de Agostinho Lopes, da Comissão Política do
PCP
28 de Outubro de 1998
1. A decisão da União Europeia de embargar a exportação de bovinos vivos e de carne de vaca portuguesa constitui um sério revés para a agricultura e os agricultores nacionais não só pelo impacte directo do embargo nas exportações mas também pelas suas repercussões no consumo interno e no comportamento dos consumidores nacionais.
O Partido Comunista Português responsabiliza o Governo PS pela situação e manifesta o seu desacordo frontal com a decisão da União Europeia. A decisão é desproporcionada, injusta e hipócrita.
2. A decisão é desproporcionada porque o número de casos de BSE ocorridos em Portugal, desde 1990, num total de 161 (correspondente a 4 casos por cada 10 mil bovinos leiteiros do efectivo nacional) não justifica uma medida tão drástica. Desproporcionada porque tomada com uma celeridade que não usou para com o Reino Unido, quando era bastante maior a gravidade quantitativa e qualitativa da situação epidemiológica, para lá da longa cumplicidade na ocultação do problema. Injusta porque atinge milhares de produtores nacionais, a esmagadora maioria dos quais com efectivos completamente indemnes. Hipócrita porque a Comissão, com esta decisão, pretende apresentar serviço escondendo as suas responsabilidades no alastramento da doença entre os Estados membros e que foi alvo de condenação no inquérito realizado pelo Parlamento Europeu. Hipócrita ainda porque enquanto toma a decisão do embargo a Comissão Europeia prepara o terreno para permitir a importação de gado dos Estados Unidos tratado com hormonas. Hipócrita porque a Comissão Europeia continua a defender uma PAC - inclusive nas suas propostas de reforma contidas na Agenda 2000 - não só injusta socialmente, mas também onde o critério guia é a competitividade sem fronteiras. Assim se incentivam modelos agrícolas produtivistas, onde vale tudo para reduzir os custos de produção e aumentar as taxas de rentabilidade, inclusive com a introdução na cadeia alimentar de produtos e subprodutos químicos, biológicos, transformados geneticamente, etc., cujas consequências não estão suficientemente testadas e acauteladas. Hipócrita, finalmente, porque a desregulamentação e liberalização dos mercados, sem controle de fronteiras, impulsiona o alastramento de doenças em todo o espaço comunitário.
3. Mas é evidente a responsabilidade dos Governos portugueses nesta matéria. Responsabilidade particularmente grave porque estava e está em causa a saúde dos portugueses e, em questões de saúde pública não poderia nem deveria haver adiamentos, hesitações ou reflexões contabilísticas sobre os custos das medidas necessárias. Responsabilidade pelos problemas causados a muitos milhares de agricultores e à agricultura portuguesa, Responsabilidade, finalmente, pelo espaço de manobra que proporcionaram á Comissão Europeia.
Do governo anterior, do PSD, está feita a história: a estratégia de sigilo, ocultação da doença e sonegação de informação, entre 1990 e 1994, é responsável pela não adopção atempada de medidas contra a BSE, pelo alastramento da doença, pelo clima de suspeição criado na opinião pública e nas instâncias internacionais. O PSD não tem, hoje, o mínimo direito moral de criticar uma situação cuja origem é da sua própria responsabilidade.
4. Contudo, nada disto pode fazer diminuir as elevadas responsabilidades do actual Governo do Partido Socialista por, ao longo deste mandato, não ter tomado as medidas que controlassem e impedissem a propagação da doença e que não dessem á Comissão Europeia o pretexto para o embargo agora decidido. O Governo do PS limitou-se, no essencial, a uma operação mediática de abate de todos os bovinos suspeitos. Mas não adoptou as medidas mais importantes que se impunham, que tinham absoluto consenso entre as forças políticas, a comunidade científica e os próprios serviços do Ministério, quais sejam: a proibição do uso de farinha de carne e de ossos e outros materiais de risco em toda a cadeia alimentar animal (proposto ao então Secretário de Estado da Agricultura e hoje Ministro da Agricultura Capoulas Santos pelo menos, desde Abril de 1996, pelo Instituto de Protecção da Produção Agro-Alimentar, e só decidido agora, a correr, nas reuniões de 24 de Setembro de 1998 e 22 de Outubro 1998 do Conselho de Ministros); o controlo efectivo das unidades de transformação de subprodutos de origem animal com a presença em cada uma de agentes sanitários e veterinários e a proibição de laboração de todas aquelas unidades que não tivessem procedido á sua reconversão tecnológica para assim se garantir a não reciclagem da doença; a regulamentação e criação efectiva de um Corpo Nacional de Inspecção Sanitária.
5. Acresce que o Governo do PS não desencadeou, ao contrário do que foi aprovado e recomendado por todas as forças políticas no relatório da audição parlamentar realizado pela Assembleia da República em Maio de 1996, nenhuma campanha sistemática de informação á opinião pública e de promoção da produção nacional de carne bovina, designadamente das raças autóctones com denominação e certificação de origem.
6. Face ao embargo agora decretado o PCP exige: