Incêndios Florestais em 2005
Declaração de Agostinho Lopes, da Comissão Política do PCP, em conferência de imprensa
27 de Julho de 2005

 

1. O balanço dos Incêndios Florestais destes primeiros 7 meses de 2005, aponta para 55 000 ha de área total ardida, destacando-se o facto de só nos dias 20 e 21 de Julho terem sido consumidos 15 000 ha, nos grandes incêndios ocorridos nos distritos de Coimbra, Castelo Branco e Guarda. Destaque ainda para o facto das chamas terem, mais uma vez, atingido a Tapada de Mafra, o Parque Natural da Arrábida e o Parque Natural da Serra da Estrela, onde a área ardida atingiu cerca de 3 mil ha. Balanço que contém a trágica morte de um cidadão em Alvaiázere, as aldeias cercadas pelas chamas e mesmo evacuadas, os enormes prejuízos materiais e ambientais.

E não deve haver qualquer subestimação (como parece ir acontecendo) da gravidade dos incêndios verificados, decorrente da constatação aritmética de que os 55 000 ha representam apenas 13 ou 14% dos 424 000 ha ardidos em 2003!

2. O PCP, com a autoridade política que lhe é reconhecida, pela intervenção, análise e proposta, que ao longo dos anos foi produzindo, sempre considerou que nenhum governo evitará e resolverá a 100%, em definitivo, o problema dos incêndios florestais. Mas perante o que mais uma vez está a acontecer no presente ano, o PCP não pode deixar de assinalar as responsabilidades de sucessivos governos, em particular dos que estiveram e estão em funções depois de 2003, pela continuação do flagelo com a dimensão, o número e os impactos verificados, consolidando nos portugueses a ideia da incapacidade e impotência dos poderes públicos em lhe fazerem frente.

A responsabilidade dos governos PSD/CDS-PP de Durão, Santana e Portas, que durante quase 2 anos, após a tragédia de 2003, não tomaram ou concretizaram as medidas reconhecidamente necessárias, muitas das quais vertidas em Resoluções da Assembleia da República, para o ordenamento, prevenção e vigilância da floresta portuguesa. Em particular não avançaram em tempo adequado com a aquisição dos meios aéreos e outros recursos (humanos e materiais) necessários e suficientes para responder em termos de combate aos fogos.

Mas também a responsabilidade do Governo PS, que tendo tomado posse em Março, depois de muito discurso e algum folclore mediático, não desenvolveu com a urgência suficiente, as medidas ainda possíveis de prevenção e limpeza das matas e as medidas para o reforço significativo dos meios para a vigilância das florestas e detecção de incêndios, claudicando mesmo, no assegurar a tempo e horas dos meios aéreos, que foram claramente insuficientes (ou inoperacionais) até meados de Junho.

Não tiveram correspondência com a realidade que o País vai enfrentando, as palavras do Primeiro-Ministro de inícios de Maio “este ano vai ser difícil, certamente, porque os factores climatéricos não ajudam, mas estamos preparados para responder a todas as eventualidades”. Não estavam!

Foram também frustradas as sucessivas e diversas tentativas do PCP (desde 18 de Maio) na AR, para que o Governo desse uma informação adequada sobre a situação e as medidas tomadas ou ensejadas para lhe responder.

3. O PCP renova a denúncia das intenções do Governo (mas não só) de consolidação das teses de que a principal causa dos incêndios florestais é a dominância na floresta portuguesa da pequena propriedade privada, mal gerida ou abandonada (“não gerida de forma activa”).

Teses que têm 2 objectivos políticos evidentes:

- Primeiro, desresponsabilizar a política de direita, em particular a política agro-florestal de sucessivos governos do PS, PSD e CDS-PP, pelo estado a que chegou e em que se encontra a floresta e o mundo rural;

- Segundo, justificar e suportar o desenvolvimento de processos de concentração da propriedade florestal (sob a eufemística designação de promoção do associativismo florestal) apoiada na intervenção coerciva do Estado e de recursos financeiros públicos, para servir os interesses dos grupos económicos que monopolizam a fileira florestal (celuloses, aglomerados, cortiça, etc.);

A recente Conferência “Investir nas florestas portuguesas”, que teve a presença do Presidente da República, promovida pela API (Coimbra, 11 e 12 de Julho), apadrinhada pelo Governo PS com intervenção de vários ministros e a colaboração activa de destacadas figuras desses grupos (Belmiro de Azevedo, Américo Amorim, José Honório da Portucel, etc.) foi a expressão visível e viva das confluências dessas teses, propostas e políticas.

Particularmente grave é o facto do Governo PS, não só retomar as teses da culpa da pequena propriedade florestal e da necessidade da sua “gestão activa” promovidas a política oficial pelo governo PSD/CDS-PP, como aprovar um conjunto de medidas nesse sentido. O conjunto de instrumentos para intervenção na floresta portuguesa anunciados recentemente pelo Ministro da Agricultura, como as denominadas ZIFs e um pacote financeiro onde se destaca a criação do Fundo de Investimento Imobiliário Florestal (velha reclamação dos grandes proprietários da CAP), uma Sociedade de Garantia Mútua e um Fundo de Capital de Risco, apoiados em dinheiros comunitários e nacionais. Nas GOP para 2006/2009 refere-se “a implementação de linha de crédito para aquisição de terras florestais”!

4. O Governo PS (e todos os advogados da responsabilidade da pequena propriedade florestal e da sua “má gestão” pelos incêndios) não explica porque razão a floresta não é rentável ou é abandonada – nada dizem por exemplo sobre a estagnação ao longo dos anos do preço da madeira! Não explicam porque razão continuam a arder grandes áreas florestais de um só proprietário, ou extensas áreas sob tutela e à guarda do Estado, como sucede nos parques naturais e áreas protegidas. E quando falam da fragmentação da propriedade florestal portuguesa, fingem não saber que 1% das explorações florestais dispõem de 55% da superfície florestal total!

O que o Governo PS e os adeptos dessas teses não querem é afrontar a PAC e as políticas agro-florestais nacionais, responsáveis pela desertificação económica e humana de vastas regiões do País, pelo abandono do mundo rural português, pelo agravamento das assimetrias regionais. Ou pretendem fazer esquecer coisas tão comezinhas como o facto do efectivo do Corpo de Guardas Florestais continuar reduzido a 1/3 do número do seu quadro, ou o facto de instrumentos decisivos para o ordenamento das florestas, como os PROFs e os PGF, contidos na Lei de Bases da Floresta de 17 de Agosto de 1996, aprovada por largo consenso na AR, continuarem passados quase 10 anos, sem ver a luz do dia!

5. O PCP após audição dos mais directamente interessados na floresta portuguesa – os pequenos proprietários florestais e os compartes dos baldios – e das entidades intervenientes nas operações de combate aos fogos, dará continuidade na Assembleia da República, no PE e noutras instâncias à sua persistente intervenção em defesa da floresta portuguesa.

O PCP combaterá quaisquer tentativas de esbulho de terras florestais das explorações agrícolas familiares do Norte e Centro do País, e dos muitos cidadãos que a ruína da agricultura empurrou para as cidades, combaterá qualquer tentativa para atentar contra os direitos dos compartes dos baldios. Até porque há soluções constitucionais de associativismo e emparcelamento para os problemas da pequena propriedade florestal, que respeitando aqueles direitos, poderão dar uma contribuição positiva para uma floresta sustentável, ordenada e de fins múltiplos.