Regime das infracções às normas estabelecidas no âmbito do Sistema Nacional de Defesa da Floresta contra Incêndios
Intervenção de Agostinho Lopes
10 de Fevereiro de 2006
Sr. Presidente,
Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas,
Face à repetição da tragédia dos incêndios florestais, este Governo faz, no essencial, o que fizeram outros antes dele. Sem qualquer criatividade e sem qualquer resultado, muda as leis e altera a estrutura de combate aos incêndios florestais.
Decidiu, por exemplo, o Governo revogar o Decreto-Lei n.º 156/2004, porque — diz-se no preâmbulo do decreto-lei que o vai substituir — «A experiência de copiosa importância decorrente da aplicação do diploma em duas épocas de incêndios permitiu (…)». Permitiu o quê, Sr. Ministro? Que experiência, se não houve qualquer aplicação deste Decreto-Lei? Se os senhores não o aplicaram, qual é a experiência da não aplicação?
Por que razão não se interroga o Governo, de uma forma séria, sobre as razões da não concretização de resoluções desta Assembleia da República, de resoluções do Conselho de Ministros, de decretos-leis, de portarias e de despachos? Porque razão, Sr. Ministro, a Lei de Bases da Política Florestal, aprovada em 1996, continua, em 2006, sem concretização? Que razões explicam que sucessivos governos não o tenham feito?
Quem é que «deixou andar», Sr. Ministro? Foram os agricultores, os proprietários florestais e as suas associações ou foram os governos e a política de direita prosseguida nos últimos anos, tanto nesta matéria como noutras?
Não serão questões de ordem orçamental, Sr. Ministro? Não será a tentativa de, mais uma vez, querer resolver o problema sem um investimento público forte e significativo?
O Dr. Oliveira Salazar, em meados dos anos 50, resolveu acabar com o «pé descalço», com a «pata ao léu» — dava mau aspecto — e resolveu pôr a polícia a aplicar multas. É uma evidência, Sr. Ministro, que os portugueses só passaram a andar calçados, pelo menos de tamancos e socas, quando passaram a ter dinheiro para isso!
O que os governos continuam a querer fazer é a resolver este problema sem investimento. E, pela terceira vez — fi-lo durante o debate do Orçamento do Estado e na Comissão de Assuntos Económicos, Inovação e Desenvolvimento Regional —, questiono-o: qual o valor das verbas orçamentadas no Orçamento do Estado para 2006 que vão permitir implementar algumas das medidas, alguns dos instrumentos que os senhores propõem no decreto-lei que vem associado ao pedido de autorização legislativa?
É que sem compromisso orçamental certo, Sr. Ministro, o pouco e o mau que o Governo se propõe fazer reduz-se a zero.
Aliás, falando de compromissos do Governo, aproveitava para lhe perguntar, Sr. Ministro, se confirma a informação de que os compromissos do Governo, assinados em 2005, no quadro das medidas agroambientais — protecção integrada, agricultura biológica, raças autóctones —, não vão ser cumpridos relativamente aos projectos que assinou com os agricultores em 2005.
(…)
O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Membros do Governo, Srs. Deputados, Sr. Ministro
da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas: Não é verdade que todos os partidos sejam
culpados nesta matéria.
A Sr.ª Heloísa Apolónia (OS Verdes): — Muito bem!
O Orador: — Basta uma leitura séria do Diário da Assembleia da República, ao longo destes 30 anos,
para o verificar. Sr. Ministro, se quiser fazer o favor, poderá verificá-lo com facilidade.
Vozes do PCP : — Muito bem!
O Orador: — Sr. Presidente, Sr. Ministro e Srs. Deputados, para o Governo do PS a solução para os
incêndios florestais é muito simples: a responsabilidade é dos proprietários florestais, fundamentalmente
dos pequenos, e também das autarquias, que não fazem a gestão activa das suas áreas florestais. Logo,
tudo se vai resolver agravando-se significativamente o valor das coimas, em 40%, e, aparentemente,
melhorando o policiamento, entregando-o à GNR, que será reforçada com 400 guardas florestais, dos
quais, simultaneamente, se decretou a extinção.
Sr. Ministro, é uma verdadeira fraude política, uma solução mistificadora aquilo com que o Governo
avança para responder aos gravíssimos problemas dos incêndios florestais. O Governo parte, e fá-lo conscientemente,
de premissas e de teses falsas.
A gestão activa não é uma questão de boa ou de má vontade dos proprietários florestais, é a questão
comezinha da racionalidade económica dos diversos tipos de proprietários, é a questão da rentabilidade
económica da floresta e, em particular, do preço do seu principal produto, a madeira! Ora, disto nem este
nem os anteriores governos quiseram ou querem ouvir falar!
O preço da madeira está estagnado há 10 anos, em virtude da concertação monopolista das celuloses,
e desde Outubro que está a descer, tendo em três meses caído entre 5% e 12%.
São premissas, teses e passa-culpas demagógicas! Se a responsabilidade é do proprietário e também
das autarquias ficam absolvidas e desresponsabilizadas as políticas agro-florestais, e não só florestais, de
sucessivos governos responsáveis pelo estado a que chegaram a floresta e a agricultura portuguesas!
São premissas e teses convenientes, porque o Governo não precisa de gastar muito! É uma tese que se
ajusta à política orçamental do Governo de obsessão pelo défice e pelo Pacto de Estabilidade e Crescimento,
porque não faz investimentos e reduz ao mínimo a Administração Pública, o que é visível no processo
de liquidação da Direcção-Geral dos Recursos Florestais!
São premissas e teses que ignoram a realidade florestal e, em particular, a diversidade das suas lógicas
económicas e sociais, que não têm suporte técnico-científico e que têm a oposição generalizada das associações
do sector!
O Governo diz que as ouviu, não refere é o que elas dizem sobre as suas propostas, mas basta ler o
parecer do Instituto Superior de Agronomia.
São premissas e teses que, inevitavelmente, não conduzem a uma verdadeira estratégia de combate
aos incêndios florestais! As propostas são medidas avulsas, desarticuladas e inconvenientes – também
aqui vale a pena ler o parecer do Instituto Superior de Agronomia.
Nos textos do diploma em análise há premissas e teses que, inevitavelmente, conduzem a legislação
que viola e ofende a autonomia do poder local, tentando repor inaceitáveis comandos e subsídios (imaginese,
subsídios! às autarquias, contando, por isso, com a frontal oposição da Associação Nacional de Municípios
Portugueses.
Por exemplo, é espantoso que a administração central não tenha prazos para aplicar os seus planos de
defesa da floresta e que aos municípios se imponha um prazo de 90 dias!
O Sr. António Filipe (PCP): — Exactamente!
O Orador: — Mas, Sr. Ministro, o pior de tudo, a crítica fundamental que fazemos às propostas do
Governo é a de que, infelizmente, os incêndios vão continuar inapelavelmente a percorrer as florestas portuguesas!
Não deixaremos de denunciar e de apontar os culpados, neste momento o Governo do Partido
Socialista, do Eng.º Sócrates!
Aplausos do PCP.