Proposta de Lei nº 128/VII, que estabelece o regime de exercício de direito do pessoal da Polícia Marítima (PM)
Intervenção do deputado João Amaral
16 de Outubro de 1997

 

Senhor Presidente,
Senhores Deputados,
Senhores Membros do Governo,

Começo por saudar os profissionais da Polícia Marítima, bem como todos os profissionais do Quadro de Militarizados da Marinha, e Associações representativas, a Associação Nacional dos Militarizados da Marinha e a Associação Sócio-Profissional da Polícia Marítima, pela luta desenvolvida ao longo dos anos para reconhecimento de um estatuto profissional digno e justo, para a afirmação dos direitos fundamentais, incluindo o direito de associação. Percorri velha documentação sobre esta questão, e fui encontrar exposições da Associação Nacional dos Militarizados da Marinha datada de 1981, expondo muitos dos problemas que hoje continuam a afectar a classe.

Este debate e a forma como é realizado é fruto das indefinições que têm atormentado o Sistema de Autoridade Marítima de há muitos anos para cá. O que aqui se está hoje a fazer é a praticar mais um acto na política de remendos em que tem vivido o sector. Afinal, o que quer o Governo para regular o Sistema de Autoridade Marítima ? A confusão é total e cada um puxa para o seu lado. O Ministério da Administração Interna avança com 3 milhões para lanchas, enquanto continua por definir o exacto limite de actuação da Brigada Fiscal em relação à Polícia Marítima. As opções de investimento na Marinha de Guerra são pensados em descoordenação com as necessidades de fiscalização. Há um grupo de trabalho interministerial a estudar o Sistema de Autoridade Marítima, mas ao mesmo tempo avança um Livro Branco no Ministério do Equipamento sobre os Portos que em numerosos aspectos conflitua e condiciona soluções para o SAM.

A Comissão Parlamentar de Defesa Nacional fez uma audição parlamentar sobre a matéria, por proposta do PCP. As audiências realizadas, transcritas em actas, mostram as indefinições existentes, permitindo uma gestão de conjuntura, que é a costumada solução dos que não sabem o que querer. Não há uma visão política e estratégica do sector, que levaria a vê-lo numa perspectiva de desenvolvimento económico e social do País, e a integrá-lo numa estratégia de poder marítimo. Não há a consideração do interesse nacional, tendo em conta as possibilidades das nossas frotas marítimas, comercial e pesqueira. Não há uma defesa coerente dos nossos recursos pesqueiros. Tudo isto é substituído pela política da "meia-bola e força".

Foi este tipo de "gestão de conjuntura" que levou o Governo do PSD em fim do mandato a aprovar o Decreto-Lei nº 248/95, que criou a Política Marítima como estrutura separada do Quadro de Pessoal Militarizado da Marinha. A junção tinha-se verificado em 75/76, depois da Polícia Marítima ter perdido a natureza civil que tinha desde diploma de 1946. Naquele Quadro de Militarizados, a Polícia Marítima convivia com a Polícia dos Estabelecimentos da Marinha, com os faroleiros e com os troços-de-mar. A solução para este pessoal deveria ter sido conjunta. Todos eles deveriam ter deixado a militarização. Porquê faroleiros militarizados ? E a polícia dos estabelecimentos? Não é uma polícia ? E os troços-de-mar, não conduzem meios navais da Polícia Marítima ?

Se não há uma definição clara do destino do Sistema de Autoridade Marítima, o Governo deveria ter feito àquelas classes o mesmo que fez à Polícia Marítima.

É importante recordar que em relação a todas essas classes, desde o acórdão 308/90 do Tribunal Constitucional que foi considerada inconstitucional a aplicação das normas de disciplina militar. O Tribunal Constitucional não distinguiu a Polícia Marítima das outras forças. O que deveria ter sido feito era desenvolver as soluções, que estão em curso para a Polícia Marítima, para todas as outras classes.

Aliás, o mesmo deveria ser feito para os chamados " Guardas da NATO", também eles sem estatuto definido e vivendo uma situação inaceitável.

Se assim, do lado do seu enquadramento, esta proposta de lei levanta problemas de fundo, também quanto às soluções adoptadas ela é questionável.

A única solução aceitável e possível é que esta Polícia Marítima tenha um estatuto que acompanhe o estatuto da PSP, em todos os seus itens. Aparentemente, foi isso que se pretendeu fazer, já que a proposta copia a Lei nº 6/90, (regime de exercício de direitos do pessoal da PSP), quer na caracterização da polícia, quer no regime de direitos e deveres, quer no dever de isenção, quer no direito de associação, quer nas restrições de direitos. Aliás o facto de a proposta ter sido agendada para o mesmo dia da proposta de alteração da Lei nº 60/90, sobre a PSP, torna essa similitude mais flagrante. Sucede até que, quanto aos direitos das associações, no corpo do nº 4 do artigo 5º e nas alíneas b) e d) do mesmo número, a proposta já tem as alterações que hoje discutimos como proposta do Governo para a PSP, designadamente a esquisita dispensa do mínimo de 10% para representatividade, a explicitação das condições de trabalho e sistema remuneratório nas questões nas quais as associações podem tomar parte e a eliminação da restrição do direito de apresentar propostas exclusivamente às autoridades hierárquicas.

Mas, depois, aparecem as diferenças. Para além de outras, há uma absolutamente inacreditável. É a introdução no artigo 5º de um nº6 segundo o qual : " as associações profissionais legalmente constituídas prosseguem fins diversos das associações de natureza sindical, não lhes sendo permitido entre outros, decidir o recurso à greve ".

Afinal, em que ficamos ? Caminha-se no sentido do sindicato, como andou a dizer o MAI, ou contra o sindicato?.

Também no que respeita às restrições de direitos, em relação à PSP aparecem mais restrições quanto aos direitos de reunião e manifestação .

Interviremos neste processo com a exacta noção de que para os profissionais da Polícia Marítima, a quem há escassos anos se fazia a aplicação da disciplina militar, todo este processo é de franco progresso, tal como sucedeu com a PSP há sete anos. Mas não vale repetir os erros cometidos no passado com os profissionais da PSP, nem cometer agora novos erros, como os que citei. Se a ideia é a aproximação à PSP, não há nenhuma, absolutamente nenhuma, razão para que a Polícia Marítima tenha um estatuto pior que a PSP.

É neste sentido que actuaremos neste debate.