A tragédia dos incêndios florestais: Uma responsabilidade única da política de direita
Intervenção de Agostinho Lopes (Reunião da Comissão Permanente)
6 de Setembro de 2005
Sr. Presidente,
Sr. Ministro de Estado e da Administração Interna,
Começo por me congratular com o apoio que deu, nesta Assembleia, à proposta do PCP, contida num projecto
de resolução, entregue no dia 11 de Agosto, de criação de uma comissão eventual de avaliação,
monitorização e acompanhamento das medidas necessárias para responder aos problemas dos incêndios
florestais.
Ouvindo o Governo falar sobre os fogos florestais durante este mês de Agosto — e já
havia começado falar em Julho —, é legítimo interrogarmo-nos sobre se, além das responsabilidades do
clima, dos incendiários, das autarquias e do pequeno proprietário florestal, sobra alguma responsabilidadepolítica para os sucessivos governos, para as suas políticas agro-florestais e de contenção orçamental, com
impacto ao nível do ordenamento, da prevenção, da limpeza, dos guardas-florestais e do combate aos
incêndios florestais.
Penso ser possível poder dizer-se que é preciso alguma desfaçatez, para não dizer «lata» (o termo mais
popular), para vir acusar as autarquias, como veio o Ministro de Estado e da Administração Interna, ou o
pequeno proprietário florestal, como veio o Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas,
quando o poder político não foi capaz, durante nove anos, de implementar os principais instrumentos de
ordenamento florestal contidos na Lei de Bases da Política Florestal!
Um poder político que ao longo de anos não foi capaz de tomar medidas — pelo contrário,
reduziu as verbas destinadas à limpeza das florestas, eliminando-as mesmo em alguns casos — para o apoio, a criação e o desenvolvimento das brigadas florestais e para a recomposição
total do corpo de guardas-florestais.
É preciso que o Governo deixe de subestimar, como tem feito até ao momento, este problema e assuma
a responsabilidade por tudo o correu mal no combate aos incêndios durante este ano.
O Sr. Ministro disse-nos que veio seis vezes à Assembleia da República, mas nessas seis vezes,
quando questionado sobre grande parte destas questões, o Governo disse zero! Zero! Ainda hoje espero
do Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas resposta a parte de um
requerimento, apresentado no início de Junho.
O Sr. Ministro falou do sucesso do combate aos incêndios, como, aliás, fez o Sr. Secretário de Estado
em 10 de Agosto deste ano. Sr. Ministro, gostaríamos de saber por que é que não foi capaz de responder de uma forma clara, quando questionado sobre o problema das
insuficiências de meios aéreos, na reunião de 11 de Agosto. Mas não foi preciso passarem 15 dias para
que, à pressa, o Governo tivesse de tomar medidas, e apenas perante a tragédia florestal ocorrida na
Pampilhosa da Serra, para responder a este problema!
Continuamos a aguardar esclarecimentos do Governo relativamente a estas questões, sobretudo às que
dizem respeito aos meios necessários para suportar as medidas que hoje anunciou.
(...)
Senhor Presidente,
Senhores Deputados,
Está o País, mais uma vez, confrontado com a dramática situação vivida por inúmeras regiões e povoações causada pelos incêndios florestais dos últimos meses. Repetiu-se neste ano de 2005, o que de há anos a esta parte (muito particularmente a partir de 2000, com mais de 100 mil hectares ardidos em média em cada ano) vem flagelando o País, com perdas de vidas humanas, destruição de habitações, instalações agrícolas e industriais, agressões profundas de ecossistemas nas nossas áreas protegidas e outros custos ambientais e gigantescos prejuízos materiais, situação tão mais grave quanto se junta à realidade da seca extrema que atinge grande parte do País.
A periódica, brutal e trágica presença dos incêndios florestais na vida dos portugueses exemplifica bem a identidade das principais orientações e comportamentos do Governo PS com governos passados, em que a insensibilidade frente ao drama das populações e a ruína do património agro-florestal, exigem a mais firme condenação. Primeiro a fanfarronice política do «estamos preparados para todas as eventualidades» do primeiro-ministro em inícios de Maio. Depois a clara subestimação da dimensão do problema, na avaliação dos meios necessários, apesar dos alertas da sua exiguidade, feitos inclusive pelo PCP. Depois ainda a ausência de respostas claras para os prejuízos ocorridos, para acabar na fraude da responsabilização da pequena propriedade florestal, para ilibar as políticas agro-florestais de direita de sucessivos governos e para ocultar os grandes interesses que acabam por beneficiar dos incêndios. Pelo meio a repetição estafada dos discursos e argumentos dos governos do PSD e CDS-PP.
É, por exemplo, de uma inaudita violência, a recente declaração do sr. ministro da Agricultura sobre o tema:
«O País não pode continuar a assumir os custos financeiros de uma ausência de gestão e de responsabilidade dos pequenos proprietários. A estes, que são a maioria, é dada a oportunidade de se associarem, de entregarem o arrendamento, de cederem a exploração ou de entrarem com a respectiva exploração como uma acção na sociedade de gestão imobiliária florestal. São-lhes dadas todas as oportunidades, mas no fim o Estado não pode ficar por aí se isso não for suficiente. Haverá penalizações. O novo quadro fiscal para a floresta terá penalizações e incentivos fiscais. Mas na situação orçamental actual seria obviamente demagógico prometer incentivos ou sequer estar a abordá-los. Vamos equacioná-los na lei e prevê-los para uma situação orçamental mais folgada.» (sic)
Sr. ministro da Agricultura, explique-nos lá porque arderam, só em 2003, 40 mil hectares de sobreiro na zona da grande propriedade? Diga-nos qual a área ardida em 2003, 2004 e 2005 nas propriedades das empresas de celulose. Explique-nos porque ardeu o Pinhal de Leiria, a Mata de Vale de Canas, a Mata Nacional do Urso, o Parque do Gerês, o Parque de Montesinho, o Parque da Serra da Estrela?
Mas não são só uma violência aquelas palavras. São uma clara fraude política e uma mistificação. Então as penalizações são para já e os apoios fiscais para mais tarde? Tenham juízo!
O PCP reafirma a sua mais veemente oposição a qualquer tentativa de absolvição dos responsáveis políticos e partidários, ou seja a «despolitização» da tragédia que mais uma vez atingiu o País, metendo tudo e todos no mesmo saco. Esta é uma questão central, e não apenas por razões político-partidárias. Porque é uma questão essencial, decisiva, para responder de forma eficiente e capaz a esta tragédia que, de ano para ano, se vai abatendo, como a rotina do dia e da noite, sobre o País. Porque é uma questão que põe em causa a credibilidade do Regime Democrático, consolidando nos portugueses a ideia da incapacidade e impotência do poder político para lhe responder.
Pela nossa parte continuaremos a intervir, e tudo faremos para que se tomem as medidas necessárias para pôr fim ao flagelo, como vimos fazendo na Assembleia da República e no Parlamento Europeu. Nesse sentido, propusemos no imediato o agendamento do Projecto de Resolução visando a criação de uma Comissão Parlamentar Eventual de Avaliação, Monitorização e Acompanhamento da concretização das medidas para a prevenção, vigilância, detecção e combate aos incêndios florestais.
No imediato, ainda, reclamamos do Governo o conjunto de medidas para resposta urgente às populações que ficaram sem casa nem bens, na reposição do potencial produtivo de explorações agrícolas, instalações industriais e comerciais, com indemnizações adequadas e a declaração do estado de calamidade pública em todas as freguesias e concelhos onde a dimensão da catástrofe o exigir. Em particular, contaremos que o Governo deve avançar com um Programa especial à recuperação dos concelhos fortemente atingidos.
O PCP declara a sua profunda solidariedade com as populações atingidas, saúda e valoriza o empenhamento de todos os portugueses – bombeiros, membros das Brigadas Florestais, militares, guardas e outros agentes florestais, povo de muitas aldeias, etc. – que estiveram envolvidos no combate aos fogos.
Disse.