Regime jurídico aplicável à permissão
de condução
de viaturas oficiais dos organismos e serviços do Estado
e das autarquias locais por funcionários
e agentes que não possuam a categoria de motorista
Sr. Presidente,
Sr. Secretário de Estado,
Sr.as e Srs. Deputados:
O Decreto-Lei n.º 490/99 pretende regular as condições
em que agentes e funcionários da administração central
e local sem a categoria de motorista podem ser autorizados a conduzir viaturas
oficiais.
Trata-se de um diploma que procura dar um enquadramento legal a situações
que, de facto, sucedem na Administração Pública. Em ministérios
e nos respectivos serviços, em câmaras e juntas de freguesia,
há, por vezes, a necessidade de fazer deslocar funcionários
sem que existam disponibilidades de motoristas para conduzir as viaturas e
fazer transportar os agentes em serviço. Por isso, sucede serem estes
últimos funcionários a conduzir as próprias viaturas
oficiais dos serviços a que pertencem.
São situações de facto mas que, na verdade, não
deveriam ocorrer, caso os quadros de pessoal fossem alargados e se tornassem
suficientes e adequados às necessidades verificadas tanto na categoria
de motoristas como em muitas outras categorias.
São situações que, em muitos outros casos, só
poderão e deverão ser resolvidas com o cabal preenchimento ou,
inclusivamente, com a criação da categoria de motoristas nos
actuais quadros de pessoal, designadamente em câmaras e especialmente
em juntas de freguesia, o que impõe, desde já, não apenas
por esta mas também por esta razão, o aumento das transferências
financeiras da administração central para a administração
local.
O PCP considera, no entanto, que é importante manter a capacidade de
resposta da Administração a todos os níveis e, apenas
por isso e neste contexto, compreendemos o espírito da iniciativa legislativa
do Governo, concretamente do Decreto-Lei n.º 490/99. Mas o PCP também
considera que esta iniciativa deve revestir um carácter transitório
e manter-se apenas e enquanto as questões relativas ao aumento e/ou
preenchimento dos quadros de pessoal não sejam adequadamente resolvidas.
Por isso, o PCP considera fundamental que o diploma em apreço se restrinja
ao carácter pontual das situações que pretende resolver.
Isto é, a permissão legal de condução de viaturas
oficiais por funcionários sem a categoria de motoristas deve ser excepcional,
devidamente fundamentada e concedida caso a caso, sempre e tal como consta
do n.º 1 do artigo 2.º.
Mas já não é aceitável que, a pretexto da resolução de uma questão que é pontual e transitória, se criem condições para que esta situação se torne permanente e, ainda por cima, tenha cobertura legal.
É precisamente isto que o decreto-lei pretende gerar com o n.º
3 do mesmo artigo 2.º, quando estatui que "poderá ser conferida
permissão genérica de condução aos funcionários"
que não possuem a categoria de motorista.
Não queremos que os quadros de pessoal deixem de possuir motoristas
e passem apenas a dispor de motoristas-auditores ou motoristas-fiscais.
O PCP considera, assim, necessário eliminar aquela norma e está
disponível para contribuir para a sua erradicação do
decreto-lei.
Mas, Sr. Presidente,
Sr. Secretário de Estado e Srs. Deputados,
este decreto-lei - acrescento - não nos suscita apenas estas dúvidas.
Em primeiro lugar, também não nos parece admissível que
os funcionários sem a categoria de motorista, a quem venha a ser permitida
a possibilidade de conduzir viaturas oficiais, não possam beneficiar
da atribuição de qualquer subsídio, abono e/ou suplemento,
designadamente nos casos em que esses funcionários tenham categorias
profissionais com remunerações e abonos inferiores à
categoria de motorista. Além de inadmissível, parece-nos também
injusto, já que o funcionário passa a desempenhar funções
profissionais sem que tenha direito ao vencimento ou aos abonos correspondentes
à categoria melhor remunerada.
Em segundo lugar, também não é visível o carácter
não obrigatório da permissão a conceder. O facto de haver
a possibilidade de funcionários poderem conduzir viaturas oficiais
não permite aos superiores hierárquicos, sejam eles quais forem,
obrigar qualquer funcionário a aceitar essa possibilidade. Poder permitir
não significa nunca, nem pode significar, poder obrigar. Mas este carácter
não obrigatório não está contemplado no decreto-lei.
Em terceiro lugar, o decreto-lei também não acautela os níveis
de responsabilidade a assumir pelos funcionários não motoristas
a quem venha a ser permitido conduzir veículos oficiais. No decreto-lei
apenas se prevê que estes funcionários respondam civilmente perante
terceiros nos mesmos termos que os colegas motoristas. No entanto, nada se
diz sobre a forma como lhes poderão ser imputadas responsabilidades
disciplinares e penais resultantes de acidentes que ocorram enquanto estiverem
a conduzir as viaturas oficiais. A criação de seguros que cubram
estas novas responsabilidades destes funcionários não é,
infelizmente, abordada no decreto-lei.
Trata-se, enfim, de um diploma que, com o argumento defensável - insisto
- de pretender superar questões que se prendem com a eficácia
e com a prontidão com que a Administração Pública
pode e deve responder, cria problemas com carreiras de trabalhadores da função
pública e da administração local que poderiam e deveriam
ter sido melhor acautelados e deverão ser resolvidos num futuro próximo.
Com esta apreciação parlamentar pretende-se apenas, e agora,
para já, assegurar, pelo menos, o carácter excepcional e pontual
do diploma. Muito mais haveria certamente a fazer - estaremos disponíveis
para tal -, mas para assegurar o carácter excepcional estamos, pontualmente
e desde já, disponíveis.
(...)
Sr. Presidente,
Srs. Deputados,
Sr. Secretário de Estado da Administração Pública
e da Modernização Administrativa,
começo por agradecer a sua intervenção e a forma benévola
como encarou a intervenção que produzi, bem como a possibilidade
que levantou de, num futuro mais ou menos longínquo, rever a posição
que neste momento traduziu perante a Câmara. Segundo percebi da sua
intervenção, o Sr. Secretário de Estado está mesmo
disposto, uma vez verificada uma prática não adequada às
intenções do Governo, a poder vir a alterar a formulação
do diploma. Creio, no entanto, que seria prudente fazê-la desde já.
Parece-me, também, que o Sr. Secretário de Estado vocacionou
muito a sua intervenção e a sua explicação apenas
para uma parte da Administração Pública a quem se dirige
este diploma. O Sr. Secretário de Estado falou dos serviços
da administração central, mas gostaria de lhe lembrar que este
diploma se aplica também à administração local.
Acrescento ainda que me parece que, no conjunto dos funcionários a
quem poderá ser aplicado este diploma no todo nacional, seria avisado,
desde já, criar condições para que ele fosse, de facto,
excepcional e para não poder vir a ser encarado, na globalidade da
Administração Pública, como genérico.
Antes de concluir, gostaria de colher a sua sensibilidade para esta questão
e de reafirmar que talvez fosse possível, com um melhor esclarecimento
de parte a parte, alterar alguns aspectos negativos deste diploma, ou que
poderão vir a verificar-se como negativos.
Para concluir, permita-me informá-lo que os parceiros sociais consultados
para a elaboração deste decreto-lei, tanto quanto sei, não
foram todos aqueles que poderiam ter sido e que, eventualmente, seria conveniente
que tivessem sido. Pelo menos, eles não foram todos favoráveis
aos termos deste diploma legal.