Fixação dos termos de aplicação do actual sistema integrado de avaliação de desempenho da Administração Pública, criado pela Lei n.º 10/2004, de 22 de Maio, e determinação da sua revisão no decurso de 2006
Intervenção de Jorge Machado
23 de Fevereiro de 2006
Senhor Presidente,
Senhoras e Senhores Deputados,
A proposta de lei n.º 51/ X, que hoje discutimos, é a prova que o actual modelo de avaliação do desempenho dos trabalhadores da Administração Pública, aprovado pela lei n.º 10 de 2004 e regulamentada pelo Decreto Regulamentar n.º 19-A de 2004, não funciona.
Na verdade, esta proposta vem determinar os termos de aplicação do actual sistema de avaliação do desempenho para os anos de 2004, 2005 e 2006.
Esta proposta de Lei surge, devido ao facto de uma grande maioria dos serviços e organismos da Administração Pública não ter conseguido aplicar o actual sistema de avaliação, deixando milhares de trabalhadores sem classificação relativa ao ano de 2004.
As consequências destas más opções legislativas e políticas e a consequente falta de planificação recai, como de costume, sobre os trabalhadores da Administração Pública.
Os concursos praticamente não existem porque não há avaliação de 2004 e as progressões pararam porque até Dezembro de 2006 o tempo não conta para efeitos de progressão na carreira pondo em causa as legítimas expectativas dos trabalhadores da Administração Pública, esta última medida é já da inteira responsabilidade do actual Governo.
A avaliação pode funcionar mal mas a culpa desse facto não é dos trabalhadores e não podem nem devem ser estes a pagar pelos erros, incúria e a incompetência de sucessivos Governos.
Senhor Presidente,
Senhoras e Senhores Deputados,
Face a esta situação de confusão generalizada na avaliação do desempenho o Governo passa a avaliar a grande maioria dos trabalhadores da Administração Pública de acordo com o sistema de classificação revogado pela Lei n.º 10/2004.
Assistimos assim, relativamente aos anos de 2004, 2005 e 2006, a um regresso ao passado, o regresso a um período pré Barroso, para depois em 2007 termos um modelo de avaliação do desempenho pós Socrático que ainda não conhecemos.
Contudo, no meio deste vórtice temporal este Governo mantém aquilo que pior caracteriza o SIADAP o sistema de quotas, na verdade a proposta de Lei fixa a percentagem máxima de 25% para a classificação mais elevada.
E já que estamos a discutir uma Proposta de Lei que salta no tempo, recuemos a Janeiro de 2004, nessa altura e neste mesmo plenário o Partido Socialista vivia numa realidade paralela.
Nessa altura, e porque estava na oposição, o Partido Socialista perguntava e dizia:
“Como vai ser concretizado o efectivo reconhecimento do mérito dos Trabalhadores da Administração Pública, com a imposição de quotas que inibem e impossibilitam avaliações autênticas?”
“Como acreditar que se pretende implementar um modelo de excelência na função pública se essa excelência não pode ser superior a 25%?...”
“Não aceitamos um sistema como o que acaba de ser aprovado, que impõe quotas com o único objectivo de condicionar a promoção e a progressão das carreiras dos trabalhadores…”
Nessa altura, os deputados do Partido Socialista criticavam a utilização do contrato individual de trabalho para os trabalhadores da Administração Pública e diziam que esta avaliação do desempenho, nomeadamente as quotas eram injustas e que eram uma forma de instrumentalização das carreiras.
Hoje, o Governo do Partido Socialista utiliza o contrato individual de trabalho com milhares de trabalhadores da Administração Pública e aplica o mesmo sistema de quotas que então criticava.
É esta a coerência de um Partido Socialista que, mal entra no Governo, sofre uma profunda transformação e aquilo que ontem era mau passa de repente a ser “remédio santo”.
Os trabalhadores da Administração Pública estão também eles a avaliar o desempenho do Governo e do Partido Socialista. Desde já podemos afirmar que esta falta de coerência e a não concretização de objectivos a que se auto propuseram não abona em nada à sua avaliação, pelo que correm o risco de virem a serem despromovidos.
Senhor Presidente,
Senhoras e Senhores Deputados,
O Partido Comunista Português sabe que esta proposta de lei tem um cariz transitório, não é esta a reforma do sistema de avaliação do desempenho que o Governo anunciou.
Pelo que aproveitamos para lembrar que, na nossa opinião, qualquer sistema de avaliação do desempenho tem que contar com a colaboração activa dos trabalhadores e suas estruturas representativas.
Que o Governo deve olhar para esta experiência e retirar as respectivas lições, deve criar um sistema exequível e que seja devidamente testado com um período experimental.
E, acima de tudo, o Governo não pode insistir na ideia de quotas para as classificações mais elevadas.
Na verdade, a definição de percentagens máximas para as notas mais elevadas é um verdadeiro absurdo, existem na nossa Administração Pública organismos e serviços de excelência pelo que a impossibilidade de avaliar com notas elevadas esses trabalhadores é uma injustiça.
Em suma e em síntese, a avaliação do desempenho tem que ser justa e deve ter como objectivo melhorar cada vez mais os serviços que a Administração Pública presta aos Portugueses, e não pode nem deve servir para condicionar, dificultar, impedir ou instrumentalizar a promoção e a progressão da carreira dos trabalhadores da Administração Pública.
Disse.
(...)
Sr. Presidente,
Sr. Deputado António Gameiro,
Queria começar por
destacar duas ou três palavras suas.
O Sr. Deputado disse que o PS sempre se identificou com a actual revisão que o Governo apresenta e
que se compromete e cumpre. Deixe-me que lhe lembre, Sr. Deputado, o que o PS disse em Janeiro de
2004, nesta mesma Assembleia.
Portanto, há dois anos. Não é assim há tanto tempo.
O Partido Socialista, revoltando-se com indignação, perguntava ao governo de então: «Como vai ser
concretizado o efectivo reconhecimento do mérito dos trabalhadores da Administração Pública, com a imposição
de quotas que inibem e impossibilitam avaliações autênticas?».
Diziam isto os Deputados do Partido Socialista! Não foi um Deputado do Partido
Comunista Português mas um Deputado do Partido Socialista.
E acrescentava: «Como acreditar que se pretende implementar um modelo de excelência na função
pública se essa excelência não pode ser superior a 25% (…).»
Diziam também os Deputados do Partido Socialista: «Não aceitamos um sistema como o
que acaba de ser aprovado, que impõe quotas com o único objectivo de condicionar a promoção e a progressão
nas carreiras dos trabalhadores.»
Perguntava, ainda, um Deputado do Partido Socialista: «Desde quando é que a imposição
do autoritarismo e da 'ditadura do chefe', que obedece às directivas ou intenções de quem o nomeou, pode
conduzir à melhoria e à qualidade do serviço público?» Isto era dito por um Deputado do Partido Socialista.
A questão que lhe coloco é a de saber como é que reage a essas declarações feitas há
dois anos. É que há uma discrepância muito, muito grande entre essas palavras ditas há dois anos por um
Deputado da sua bancada e o que agora o Governo do Partido Socialista propõe, Sr. Deputado.
Gostava também de o questionar sobre o seguinte: se as quotas na Administração Pública são um princípio
tão justo, tão eficiente e é, hoje, o que o Governo do Partido Socialista defende, pretende ou não aplicá-
las, por exemplo, ao Governo do Partido Socialista? E, no fim do ano de 2006, iremos aqui avaliar,
dentro dos 25%, qual o ministro que tem a nota de «excelente» ou de «muito bom». Portanto, esse sistemaé que é a incoerência de todo este problema!…
Sr. Deputado, dizer que o PCP está sempre contra tudo é já uma cassete há muito tempo repetida e de
tal maneira gasta que nem os portugueses acreditam que é verdade. E o Sr. Deputado tem, nesta Assembleia,
dois belos exemplos muito recentes que comprovam que, quando existe uma proposta construtiva, o
PCP contribui para a melhorar. Os exemplos são os da lei da nacionalidade, que sofreu melhorias com o
apoio e os contributos do Partido Comunista Português, e da lei do rendimento social de inserção, em relação
à qual também demos contributos e, mais, a lei que surgiu, depois da discussão colectiva, foi significativamente
melhor.
Sr. Deputado, se o Governo pretender criar um sistema de avaliação justo que respeite os trabalhadores
e que os envolva na sua avaliação, terá o PCP ao seu lado e na linha da frente para melhorar esse mesmo
sistema. Se o modelo de avaliação continuar a insistir em quotas, em critérios absurdos para a limitação
daquilo que é bom e menos bom, então, terá a forte oposição do Partido Comunista Português, porque
sempre estivemos e estaremos ao lado dos trabalhadores!