Estatuto do pessoal dirigente da Administração Pública
Intervenção de Jorge Machado
23 de Junho de 2005
Senhor Presidente
Senhor Ministro
Senhoras e Senhores Deputados ,
No passado dia 14 de Abril o Governo fez a apresentação nesta assembleia, do diploma que hoje discutimos.
O Governo apresentou-o com um belo discurso de moralização da Administração Pública, um discurso cheio de floreados e anúncios de boas intenções.
Nessa altura, considerámos positivo que o Governo olhasse para os problemas da Administração Pública e apontasse como prioritária a alteração das regras de admissão e recrutamento dos Dirigentes da Administração superior e intermédia do Estado.
Contudo foi sol de pouca dura.
Depois tudo correu mal:
O governo começou por não respeitar os prazos para os pedidos de parecer das estruturas sindicais, num claro sinal que estes não eram para ser tidos em conta.
Depois surgiram as verdadeiras propostas e “reformas” para a Administração Pública um conjunto de medidas que são um ataque cerrado aos direitos dos trabalhadores da Administração Pública.
Quando dissemos naquela altura, que era neste sector da Administração Pública, isto é, dirigentes superiores e intermédios, e não noutros, que residem alguns dos mais graves problemas da Administração Pública já estávamos a espera do que a seguir aconteceu.
Afinal os funcionários da Administração Pública são também, para este Governo, a causa de todos os males, o bode expiatório, para poderem anunciar a boca cheia que desta vez os sacrifícios são para todos.
Contudo, apesar de diversas vezes repetida, uma mentira nunca se transforma em verdade.
Numa altura em que aos trabalhadores da Administração Pública são exigidos sacrifícios e mais sacrifícios, este diploma permite contratações milionárias com regalias quanto baste e prémios de gestão pelo cumprimento de objectivos para os dirigentes, como se fossem eles e só eles os responsáveis pela concretização dos objectivos.
Quando chega a altura de pedir sacrifícios este Governo, qual fiel aprendiz do anterior Governo, vai bater a porta dos mesmos do costume, ou seja aos trabalhadores. Sejam eles do sector privado, sejam eles da Administração Pública.
Isto é, quando falamos em aumentar a idade de reforma, subida do IVA, congelamento das carreiras e aumentos que na prática são reduções salariais, então, quem é chamado a fazer estes sacrifícios são os trabalhadores da Administração Pública.
Quando falamos de grandes salários, regalias, e prémios pelo cumprimento então quem “sofre” quem se sacrifica são os boys do PS, que estão dispostos a fazer esses “sacrifícios” a bem da Nação.
Outro aspecto menos positivo foi o facto de o Governo já ter feito um conjunto de nomeações de dirigentes intermédios, convinha pois que o Governo esclarecesse quais as regras aplicadas: foram nomeados ou procedeu-se a concurso ?
Senhor Presidente
Senhor Ministro
Senhoras e Senhores Deputados ,
Se o objectivo central era a modernização da Administração Pública então o Governo falha redondamente.
Não se moderniza a Administração Pública aumentando a idade de reforma, congelando carreiras ou propondo aumentos salariais que na prática são reduções salariais.
Este diploma também não ajuda a este objectivo uma vez que alarga de uma forma muito significativa as nomeações, e não privilegia os concursos. É o cartão do partido a sobrepor-se à competência, impondo assim restrições ao princípio da imparcialidade da Administração Pública, estabelecendo condições para a sua partidarização pelos governos.
Para o PCP, as nomeações na Administração Pública devem ser claramente uma excepção e não a regra.
Para o PCP a modernização da Administração Pública faz-se com a melhoria das condições de trabalho e de remuneração dos trabalhadores da Administração Pública; faz-se com uma formação profissional de qualidade e acessível para todos os trabalhadores; faz-se com a revogação da legislação que se refere ao contrato individual de trabalho na Administração Pública, onde os critérios de admissão são mais permissivos e faz-se garantindo a participação dos trabalhadores na gestão da Administração Pública.
A modernização da Administração Pública, em suma e em síntese faz-se ao lado e com os trabalhadores da Administração Pública e não contra eles.
Senhor Presidente
Senhor Ministro
Senhoras e Senhores Deputados
O presente diploma apresenta ainda um outro conjunto de aspectos negativos que não podemos deixar de referir.
O primeiro aspecto diz respeito ao número de excepções que este diploma comporta. São de tal ordem e magnitude que se fica na dúvida a quem é que se aplica efectivamente o presente diploma.
Na verdade, quando as excepções previstas abrangem mais de 50 % da actividade da Administração Pública, então a excepção é a regra.
Quando se estipula que não se aplica este diploma às áreas da Saúde, Justiça, Educação, forças de segurança e aos dirigentes de carreira, o que o Governo está efectivamente a fazer é aumentar o n.º das nomeações.
Por exemplo na área da saúde, se se pode compreender a necessidade de haver nomeações para as Administrações Regionais de Saúde, já nada justifica as nomeações para os directores dos Hospitais, centros de saúde e respectivas extensões, tal só se pode explica com a necessidade de saciar o aparelho partidário do PS.
Assim quando o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares dizia que se iria reduzir o n.º de lugares de confiança política e aumentar os concursos, tal não tem correspondência neste diploma, bem pelo contrário.
Quanto à formação dos dirigentes esta tem-se mostrado claramente insuficiente: este diploma permite que, além do Instituto Nacional da Administração, possam as instituições de ensino superior ministrar os cursos, contudo, falta estipular os critérios, os currículos, quem pode aceder a essa formação e principalmente com que custos.
Se a formação continuar a ser um negócio quer para o INA quer para as universidades, onde os preços tornam incomportável o acesso aos cursos, então a formação vai continuar a ser uma miragem para a maioria dos trabalhadores da Administração Pública.
O presente diploma estipula que a carta de missão pode atribuir prémios de gestão para o serviço, e ou para o titular do cargo em função do cumprimento dos objectivos, sendo admissível que o serviço receba um prémio em função do cumprimento de objectivos. O mesmo não será de admitir para o titular do cargo, uma vez que estaremos face uma forma dissimulada de remunerar o dirigente e atribuir um prémio ao dirigente pelo trabalho que é forçosamente resultado do esforço de todos os trabalhadores do serviço.
Outro aspecto negativo prende-se com o facto de, no concurso para os cargos de direcção intermédia, não se proceder à ordenação dos candidatos, nem haver lugar à audição dos interessados.
Isto é, não compreendemos a utilização de um concurso que não dá aos concorrentes as necessárias, e indispensáveis garantias de recurso.
Uns dos aspectos mais negativos deste diploma é o facto de por um lado, serem abonadas despesas de representação e prémios cujo montante é discricionário, e por outro lado permite-se que o dirigente opte pelo vencimento do serviço de origem. Com estes mecanismos estaremos a abrir a porta a contratações milionárias, tão severamente criticadas pelo PS quando estava na oposição.
Um dos problemas que nem sequer foi abordado diz respeito ao facto de sucessivos Governos terem vindo a minar a Administração Pública com nomeações, algumas das quais feitas momentos antes da tomada de posse de um novo Governo, este diploma não responde ao problema das nomeações feitas perto de períodos eleitorais, quando podia e devia ter-se criado um período de “nojo” dentro do qual não fossem permitidas nomeações.
Outro problema que fica por resolver diz respeito à alteração à Lei 23/2004. De nada adianta limitar as nomeações se depois se permite os contratos de direito privado na Administração Pública, onde os critérios de admissão são mais permissivos.
E, por fim, o diploma não criou os mecanismos necessários para garantir a autonomia e independência das diferentes inspecções. Estas, dada a sua natureza e missão, deviam ter um regime próprio que assegure a sua autonomia e independência face ao Governo.
O Governo, aquando da apresentação do presente diploma afirmou que pretendia dar um passo relevante para a história da Administração Pública Portuguesa. Ora da análise deste diploma resulta que o Governo perdeu uma excelente oportunidade para o fazer.
Disse.
(...)
Sr. Presidente,
Sr. Ministro,
É só para dizer que há, efectivamente, uma
excepção àquela regra de os vencimentos não ultrapassarem o do Sr. Primeiro-Ministro, prevista no n.º 4 do
artigo 31.º, que refere que os dirigentes da direcção intermédia que não tenham vínculo à Administração
Pública podem ter vencimento acima do Primeiro-Ministro.
Para terminar, uma vez que tenho pouco tempo, devo dizer que esta Câmara assistiu a um autêntico jogo
de pinguepongue. Um atira com 3500 € e o outro responde: «Não, não! São 4000 €»; depois, um diz: «Foram
17 nomeações por minuto» e o outro diz «Foram 14 nomeações por minuto»; um atira com a Galp e outras
empresas públicas e o outro com as Águas de Portugal!
Ora, aquilo que verificamos nesta Assembleia — e o povo português está a ouvir ecomprova-o facilmente — é que, em relação a esta questão, são todos «farinha do mesmo saco». Isto é,
competem em relação a quem nomeia mais e quem recebe mais, mas não limitam essas nomeações a sério,
como deveriam fazê-lo!