Eleições autárquicas
Experiências a reter e generalizar

 

Vanessa Silva
Membro do Comité Central do PCP

Em Junho de 2005, a CDU, reunida em Encontro Regional de Setúbal, decidiu quais os seus objectivos políticos e eleitorais na Península de Setúbal, bem como as principais linhas de campanha a serem desenvolvidas pelos militantes, activistas e simpatizantes das forças que a compõem. Assim, partimos para estas eleições alicerçados no profundo conhecimento que o PCP e a CDU têm dos problemas das populações que residem e trabalham na nossa região, na notável obra realizada pelos comunistas e seus aliados ao longo de 30 anos de Poder Local Democrático, e também no exemplo de homens, mulheres e jovens, que ao longo destes 30 anos se foram sucedendo num trabalho desinteressado, cujo único objectivo foi (e é) dar um contributo para a melhoria das condições de vida do nosso povo, tendo no horizonte o nosso objectivo mais global de transformação social.

Foi daqui que partimos, um lugar não muito distante dos pontos de partida de outras batalhas eleitorais; no entanto durante os meses anteriores tínhamos já percorrido uma parte da «campanha de contactos com os militantes do Partido para a actualização de dados», tínhamos reconquistado ligações e disponibilidades para o trabalho, saímos do XVII Congresso do Partido com mais entusiasmo e força para enfrentar as batalhas futuras, entre elas as eleições autárquicas. A Organização do Partido em cada concelho e freguesia foi também determinante para esta batalha, e se algumas dúvidas nos perturbam nos momentos de campanha eleitoral, sobre quais as melhores formas de levar os nossos programas e o nosso projecto às populações, nestas eleições autárquicas o nosso próprio trabalho ensinou-nos o caminho: ir a todo o lado onde há gente, falar com todos, não deixar de tentar fazer uma conversa, e por vezes surpreendermo-nos por não ser tão difícil como poderíamos pensar. Esta não foi uma linha de campanha inédita, é assim que procuramos fazer em todo o nosso trabalho, mas talvez tenhamos conseguido aprofundá-la nesta última batalha.

Nestas eleições também a situação política e social em que vivem os trabalhadores e as populações foi um dos factores que contribuiu para o nosso resultado eleitoral, na medida em que abriu caminho para que as pessoas votassem em consciência e fizessem do seu voto um voto de protesto. A acção governativa do PS voltou a penalizar os mesmos de sempre: os trabalhadores, os reformados e os sectores mais desfavorecidos da população. O Governo PS esqueceu rapidamente as suas promessas eleitorais e agravou a injustiça do sistema fiscal, através do aumento dos impostos indirectos (os impostos cegos). E as consequências desta política são de rápida identificação, o aumento do número das falências, mais desemprego, menos produção, menos investimento público e maior agravamento das condições de vida dos trabalhadores. Na Península de Setúbal, onde a taxa de desemprego é das mais elevados do país, foram-se avolumando os problemas laborais, com despedimentos, ameaças de despedimentos, e tentativas de retiradas de direitos laborais, nomeadamente na Alcoa, Merloni, Lisnave/Gestenave, Autoeuropa, EMEF. Neste período houve também resposta por parte dos trabalhadores, nomeadamente com acções de luta em várias empresas. E levou-se a luta ao voto.

Nos quatro anos de mandato entre 2001 e 2005 as populações puderam comparar a enorme diferença entre a gestão autárquica do PS e a gestão autárquica da CDU; em 2001 a CDU ganhou nos municípios de Almada, Moita, Palmela, Seixal e Setúbal, tendo o PS ganho nos municípios de Alcochete, Barreiro, Montijo e Sesimbra. A diferença do nosso projecto autárquico para a região foi-se tornando cada vez mais clara para as populações destes concelhos, nas pequenas e nas grandes obras, no facto de considerarmos a participação popular um factor determinante do desenvolvimento do nosso projecto, no simples gesto, mas de enorme importância política, dos nossos eleitos receberem as pessoas, falarem com elas na rua, estarem disponíveis para aprender com as queixas e reclamações de quem sente que os seus problemas ainda não foram resolvidos. Trabalho, honestidade e competência foram, e continuarão a ser, simultaneamente objectivos da acção dos eleitos do PCP e da CDU e traços distintivos dessa mesma acção, que deixam evidente a diferença entre nós e as outras forças políticas.


Moita – da luta ao voto

Na Moita onde obtivemos a maior subida quer no número de votos, quer em pontos percentuais, elevámos o nosso esforço de contacto directo com as populações, percebemos também aí que não basta a obra realizada, é preciso manter uma profunda ligação com as populações, e foi isso que fizemos. Este que era o município que o PS tinha como objectivo prioritário de conquistar à CDU, acabou por ser aquele em que mais subimos a nossa votação (refiro-me apenas aos que já eram de maioria CDU), pelo acerto da nossa direcção de campanha em responder à agressão sem conteúdo do PS com o exemplo do nosso trabalho, e pelo reforço, também durante a campanha, da nossa ligação às populações e aos seus problemas concretos. Nesta batalha eleitoral introduzimos no nosso discurso político, bem como na nossa propaganda visual e escrita, a denúncia da situação política e social vivida pelos trabalhadores do nosso país, fazendo a ligação com a situação vivida pelos trabalhadores da Moita. Esta denúncia foi feita a partir das responsabilidades que o PS teve, no que se refere ao encerramento de várias empresas no concelho da Moita, entre elas a Norporte, e que deixou no desemprego muitas mulheres e homens deste concelho. Também aqui levámos a luta ao voto.

Alcochete – acreditar na vitória

Foi a partir das premissas «Trabalho, Honestidade e Competência» que a organização do Partido em Alcochete encarou a derrota eleitoral da CDU em 2001. Rapidamente se passou para a acção política, informando a população, denunciando a gestão do PS nas autarquias e tratando os problemas das populações. O Partido conseguiu assim encarar de frente a nova realidade com todas as dificuldades inererentes a esta situação, e avançou com gande empenho, alicerçado no objectivo claro de reconquistar as autarquias do concelho. Também aqui a campanha de contactos teve uma importância decisiva na mobilização de vontades e esforços, quando cerca de um ano antes das eleições os nossos camaradas iniciaram no terreno o trabalho de contacto com as populações, que seria um dos factores decisivos para a nossa vitória. As acções de contacto directo com a população passaram a ser regulares, sendo encaradas com naturalidade pela população e pelo Partido. A organização local do Partido conseguiu chegar mais longe, alargar a base eleitoral da CDU, reunir apoios de sectores descontentes da população. O boletim «O Concelho», editado pela Coordenadora Concelhia da CDU foi um importante instrumento de informação sobre o nosso projecto e acção. Muitos foram os jovens envolvidos em todos os aspectos da campanha, desde a acção diária de ganhar o apoio de mais um amigo ou colega, até à participação nas listas, demonstrando também aqui a importância da aprendizagem e troca de saberes entre várias gerações. E agora partilhando responsabilidades enquanto eleitos.


Barreiro – aprender com o povo

No Barreiro, a quatro meses das eleições, traçámos um plano de campanha que passou pela presença dos nossos cabeças de lista uma semana em cada freguesia, reunindo com a comissão de freguesia do PCP, fazendo plenários de militantes e apoiantes das nossas candidaturas, mas também plenários com as populações, dinamizando reuniões com as colectividades e outras forças vivas da freguesia, tomando posição sobre os seus problemas, indo às empresas da freguesia , falando com os trabalhadores, estando solidários com as suas lutas. Passámos a pente fino cada uma das freguesias, entrando em cafés, casas de comércio, agências bancárias, cabeleireiros, oficinas. Fomos a todo o lado onde estavam pessoas. Fizemos a travessia do Tejo com os utentes da Transtejo e aí estabelecemos contactos, reunimos e conversámos com a célula dos trabalhadores da Câmara Municipal do Barreiro, aprofundámos o conhecimento dos seus problemas laborais, mas também dos problemas das populações do Barreiro. Foram 10 semanas seguidas no contacto directo com os trabalhadores e as populações, aprendendo com as suas experiências de vida e recolhendo um importantíssimo contributo para a elaboração do Programa eleitoral da CDU para os órgãos municipais e das freguesias. Confirmámos a importância e a necessidade de ligação dos organismos do Partido às massas, através da sua acção política diária.


Sesimbra – a luta dos pescadores

No concelho de Sesimbra podemos afirmar que, a par do trabalho mais geral desenvolvido pelo Partido, tiveram muita importância nos resultados eleitorais duas componentes. A primeira prende-se com o trabalho desenvolvido nos pelouros que nos foram distribuídos desde o início do mandato numa situação de maioria relativa do PS. O que nos permitiu concretizar o lema do projecto autárquico da CDU «Trabalho, Honestidade e Competência», introduzindo pela nossa acção melhorias nas condições de vida das populações de Sesimbra. Marcámos a diferença na gestão dos nossos pelouros, realizámos obra e estes foram factores que contribuíram para que as populações confiassem o seu voto à CDU. A outra componente cuja importância podemos salientar na obtenção do resultado eleitoral foi a luta dos pescadores pelo pão, ou seja a luta pela pesca artesanal. Esta luta, que foi a resposta e o protesto dos pescadores e de toda a população de Sesimbra às medidas que o governo do PS procura impor à pesca artesanal.

Estes foram apenas alguns dos factores que contribuiram para o resultado eleitoral das eleições autárquicas de 9 de Outubro, do qual resultou uma grande vitória para a CDU, traduzida em mais votos, mais presidências de Câmara, mais presidências de assembleias municipais, mais presidências de Juntas de Freguesia.

A manutenção da maioria nos cinco concelhos que já eram geridos pela CDU e a vitória da CDU nos municípios do Barreiro, Alcochete e Sesimbra, bem como a vitória da CDU na Junta de Freguesia de Sarilhos Grandes, do concelho do Montijo (o único actualmente de maioria PS), reflectem o aumento de influência da CDU, e reflectem também a enorme perda de influência do PS na Penísula de Setúbal. Com esta votação regional, a CDU reforçou e alargou a condição de maior força autárquica na península, reforçou a sua influência política, criou melhores condições para o seu trabalho nas instituições regionais e deu uma decisiva contribuição para a alteração da correlação de forças na Área Metropolitana de Lisboa, onde a CDU se afirma como a força política com mais presidências de Câmara.

Os resultados eleitorais alcançados pela CDU assumiram um valor político acrescido, tendo em conta que foram conquistados num contexto em que foram usados no debate eleitoral métodos que nada têm a ver com a saudável luta de ideias e de projectos, são sim instrumentos de manipulação, que visam condicionar as opções dos eleitores. Tomemos como exemplo o Barreiro, que, a oito dias do final de campanha, vê um jornal local apresentar uma sondagem que dava o PS 12 pontos à frente da CDU, ou falemos da Moita, em que o próprio PS anunciou sondagens que davam o PS e a CDU «taco a taco». E o resultado nestes dois concelhos foi o que se viu.

As vitórias alcançadas foram resultado dum árduo trabalho da organização do Partido e dos nossos eleitos e candidatos, esta batalha «não foi favas contadas». Neste percurso que foi a pré-campanha e a campanha ouvimos, conversámos, discutimos ideias, tomámos posição e afirmámos o nosso projecto, e sempre alicerçados no conhecimento e capacidade de intervenção da organização partidária em cada um dos concelhos, e também no trabalho desenvolvido pelos nossos eleitos, tanto em situações de maioria como de minoria.

«O Militante» - N.º 280 Janeiro /Fevereiro 2006