Perguntas e Respostas

12. É possível conciliar os critérios de convergência (de Maastricht)
para a moeda única e o Pacto de Estabilidade
com a prioridade ao emprego e a coesão económica e social?


Alguns dos adeptos da moeda única, conscientes das graves consequências sociais daí decorrentes, dizem ser necessário (ou que basta) acrescentar aos critérios de convergência (défice, dívida pública, taxa de inflação, taxa de câmbio, taxa de juro), critérios sociais como o nível de emprego ou de despesas sociais (cláusulas sociais para o emprego e o social). Outros ainda falam de alargar os prazos ou flexibilizar/aligeirar os critérios.

Ora os cinco critérios (apesar da «irracionalidade económica» dos seus valores) não são anexos do projecto da União Económica e Monetária que possam modificar-se ou corrigir-se. São o coração da UEM: sem eles não há moeda única. A experiência em Portugal e noutros países mostra que eles são totalmente incompatíveis com o emprego e melhores salários, com o crescimento económico e o bem estar das populações.

E porquê? Porque o objectivo de alinhar as economias de diferentes países sobre uma mesma moeda, de curso elevado (alta taxa de câmbio) obriga forçosamente os países com economias mais débeis a dar maiores garantias (avales) aos mercados financeiros. Como dizem os dirigentes da direita e da social democracia, de Jacques Chirac a António Guterres: «É preciso inspirar-lhes confiança». Isto é, garantir uma forte remuneração para as suas aplicações e investimentos financeiros. Mas, mais para o capital é forçosamente menos para o trabalho, o que implica reduzir défices orçamentais e dívidas públicas, talhando nas despesas sociais (pensões) e privatizando empresas públicas, sacrificar o emprego e os salários.

Outra contradição absoluta é pretender afirmar a compatibilidade da coesão económica e social com a moeda única. Também aqui a experiência está feita e à vista de toda a gente: ainda só vamos a caminho da moeda única e já o cumprimento dos critérios de convergência, como o vão denunciando diversos Relatórios da própria Comunidade Europeia, alargam a divergência económica e social entre os diversos países comunitários num processo cumulativo com o crescimento de assimetrias entre as próprias regiões de cada país. Orçamentos restritivos, altas taxas de juro, desinflações aceleradas à custa da produção importada, implicam drásticas penalizações para os países e regiões mais pobres.

A solução, clamam advogados da moeda única, estará num grande reforço do Orçamento Comunitário. O que todos sabemos ser uma grande hipocrisia, porque não vai verificar-se. Mas não só, porque se o reforço orçamental poderia permitir ocorrer a situações de crise social agudas (apoio aos desempregados, suplementos sociais para os assalariados, medidas que respondem ao crescimento da pobreza e à desertificação de regiões) não eliminaria os efeitos destruidores de empresas e empregos e dos sectores produtivos pela moeda única.

Como na última década podemos constatar, em que apesar da transferência de muitas centenas de milhões de contos, a agricultura, pescas e indústria portuguesas viveram e vivem ainda profundas crises com a eliminação de milhares de empresas!

Eis porque não há remédio social possível sobre os pés de barro de Maastricht. Não é possível acrescentar um critério «emprego» ou conciliar a «coesão económica e social» com os critérios de convergência, com a prioridade absoluta à «estabilidade de preços». Pode desenvolver-se o emprego e a convergência real entre os diversos países e regiões da Comunidade Europeia, mas não com a moeda única.

 

In Relatório Económico Anual 1997, Crescimento, emprego e convergência no caminho
para a UEM, Comissão das Comunidades Europeias, Bruxelas, 12.02.97 COM(97)27 final

 

In Relatório da Comissão das Comunidades Europeias, Bruxelas, 4.12.96, CES(96)8 final
(Adaptado)

 

«No decurso da última década, as disparidades regionais de rendimento cresceram no interior de todos os Estados membros, as quais podem ser medidas, com excepção da Holanda. Simultaneamente, as diferenças regionais em matéria de taxa de desemprego aumentaram igualmente no interior de muitos Estados membros, com excepção notável do Reino Unido. Em França, na Alemanha (parte Oeste) e noutros países, aquelas diferenças foram de par com a distribuição mais desigual do rendimento entre as pessoas e uma diminuição da parte do trabalho no rendimento.»

Monika Wulf Mathies Relatório da Comissão das Comunidades Europeias sobre os progressos verificados na Coesão Económica e Social, 1996

«(...) Diz-se também que o facto de estarmos dentro da zona da moeda única nos permitirá exigir uma política mais intensa de apoio às regiões periféricas. Doce ilusão! Se nem sequer num país de forte coesão nacional como é o nosso se tem conseguido levar à prática uma política de desenvolvimento regional digna desse nome, como poderemos admitir que isso possa ser realizado num espaço sem governo (ou pior, desgovernado por bancos centrais que não respondem perante ninguém) e sem qualquer coesão nacional?

Num espaço que, além disso, não tem um verdadeiro orçamento, uma vez que o que se chama o orçamento comunitário pouco mais representa que 1% do PIB, contra os cerca de 20% do orçamento federal de um país como os E.U.A..»

João Ferreira do Amaral, Professor Catedrático do ISEG — Boletim do Grupo BFE — Março de 1996

«A probabilidade de da UEM resultarem consequências sociais nefastas é maior na Grécia, Itália, Espanha e Portugal, países que iniciam o processo com dificuldades variáveis no capítulo da inflação, do défice público e do desemprego. Significa isto que as piores consequências da convergência para a UEM se farão sentir nas regiões menos favorecidas da União Europeia. Caso não sejam adoptadas novas medidas que permitam contrabalançar esses efeitos nefastos, a falta de coesão social já existente dever-se-á agravar.»

«Não deixa de ser pertinente referir que a UEM virá afectar ela própria a repartição do rendimento a nível das regiões e das famílias. Mesmo tendo em conta a abertura de melhores perspectivas para a economia Europeia e, logo, uma maior coesão social e um melhor desempenho das regiões menos favorecidas, é pouco provável que a redução das disparidades seja suficiente para permitir a convergência de todos os Estados-membros ou a adequada coesão social revelada pelo processo político. Acresce que a UEM vai tornar mais necessário que sejam adoptadas medidas de igualização dado que implica a eliminação de muitos dos mecanismos alternativos de ajustamento.»

«Em relação ao segundo objectivo a conclusão fundamental deste estudo é esta: os benefícios da UEM não são automaticamente repartidos de forma equitativa.»

As consequências sociais da União Económica e Monetária Estudo elaborado para o Parlamento Europeu pelo departamento de Economia da Universidade de Cambridge

«Os desequilíbrios económicos regionais poderão crescer com a UEM. Contrariamente às preocupações dos Eurocépticos, estes desequilíbrios não precisam necessariamente de envolver mais transferências de fundos para os países mais fracos. Maior flexibilidade salarial e mobilidade dos trabalhadores, combinadas com os já existentes fundos regionais e estruturais da União Europeia, podem limitar aqueles efeitos.»

Associação para a União Monetária Europeia