Intervenção de João Ramos na Assembleia de República

É preciso voltar a entregar a gestão da Casa do Douro aos produtores

(projeto de lei n.º 57/XIII/1.ª)

Sr. Presidente,
Srs. Deputados:

Saúdo todos os que nunca deixaram de lutar em defesa da Casa do Douro.

O anterior Governo do PSD/CDS empenhou-se em destruir a representação da produção vitivinícola no Douro para abrir espaço e deixar mãos livres à comercialização, nomeadamente às grandes casas exportadoras. A comercialização e a produção têm interesses antagónicos e a Casa do Douro surgiu para salvaguardar a produção face ao poder da comercialização. Perante uma representação da produção e uma Casa do Douro fragilizadas, por decisões de sucessivos governos, que foram retirando competências e receitas à Casa do Douro e limitando a sua ação, a decisão do Governo PSD/CDS não foi a de reforçar a representação da produção mas, antes, acabar com a Casa do Douro, transferindo a representação da produção para entidades ligadas à CAP (Confederação dos Agricultores de Portugal), que nunca foi significativa na região, e às casas exportadoras.

A pretexto do saneamento financeiro, a representação da produção no IVDP (Instituto dos Vinhos do Douro e do Porto) está hoje nas mãos daqueles que ontem lá representaram o comércio, no quadro de um processo, no mínimo, estranho e com uma dimensão muito além do que a legislação previa. A representação da produção é hoje muito pior e feita por uma entidade privada, que representa menos de metade dos produtores e deixa de fora importantes subsectores, como as cooperativas e os produtores engarrafadores, que integravam a representação quando esta era assegurada pela Casa do Douro.

A Região Demarcada do Douro, Património da Humanidade, tem uma ligação íntima aos pequenos e médios produtores, e a sobrevivência destes depende de uma representação forte.

Foi para defesa dos viticultores e para a reversão do processo de destruição da Casa do Douro que o Grupo Parlamentar do PCP apresentou o projeto de lei em discussão, ou seja, para, cirurgicamente, anular todo o processo concursal de entrega da representação e sede da Casa do Douro a uma entidade privada surgida das casas exportadoras e da CAP, enquanto elemento importante de destruição da Casa do Douro. Por isso, reverter esta entrega é um passo importante.

O PCP não passou a concordar com a alteração aos Estatutos da Casa do Douro, mas quisemos priorizar a intervenção e começámos por anular o concurso.

Do mesmo modo, é necessário abordar de forma séria a questão financeira, afastando de vez o discurso de falência da Casa do Douro, que se foca apenas nas dívidas da instituição, esquecendo os ativos mais do que suficientes para cobrir os passivos.

O PS e o Bloco de Esquerda apresentaram também projetos de lei, ainda que não exatamente no mesmo sentido. Estes partidos, juntamente com o PCP, votaram contra a autorização legislativa ao abrigo da qual o Governo PSD/CDS promoveu a alteração dos Estatutos da Casa do Douro.

É entendimento do PCP que estão criadas condições para reverter a situação e criar uma forte representação da produção vitivinícola e dar resposta a problemas prementes, como a permanência de uma entidade privada na sede da Casa do Douro, onde está o histórico de uma entidade de natureza pública ou a administração do património, nomeadamente dos vinhos. Mas é também necessário apontar já um caminho, que tem de ser trilhado e construído desde já e que não abandone também os trabalhadores da Casa do Douro.

A posição do PCP, relativamente a esta situação, é a de que a produção tem de ser representada por uma entidade de natureza pública e de inscrição obrigatória, porque só com estas caraterísticas poderá representar todos e criar condições para uma defesa equitativa da produção.

A conflitualidade promovida pela entrega da Casa do Douro a uma entidade privada prova que o PCP tem razão. O PCP tem toda a disponibilidade para trabalhar em sede de especialidade uma proposta que responda aos anseios e interesses dos viticultores durienses.

(…)

Sr. Presidente,
Sr.as e Srs. Deputados:

Relativamente à ocupação da Casa do Douro, sei que o PSD e o CDS gostam de acusar o PCP. Aliás, foi o que fizeram a seguir ao 25 de Abril: mobilizaram os agricultores dizendo que o PCP lhes queria roubar a Casa do Douro.

Ora, aqui está a prova de que quem roubou a Casa do Douro aos viticultores e ao Douro foram os senhores. Foram os senhores que promoveram o seu arrombamento e que meteram lá dentro quem quiseram. Os senhores é que fizeram isso.

Sr. Deputado Abel Baptista, sobre a resolução dos problemas e sobre erros da administração, sugeria-lhe que falasse com alguns militantes do CDS que foram administradores da Casa do Douro e lhes pergunte que erros é que cometeram na sua administração.

Esses é que podem dar-lhe, inteiramente, a resposta dos erros da administração.

Mas culpar exclusivamente as administrações é esquecer o garrote que os governos impuseram à administração da Casa do Douro para o seu funcionamento.

Os Srs. Deputados gostam de dizer que nós, à esquerda, não nos entendemos. Ora, para destruir a Casa do Douro o PSD e o CDS entenderam-se muito bem. O PSD abdicou daquilo que defendia e andou a reboque do CDS nesta matéria de destruição e de ocupação da Casa do Douro.

Sei que vos incomoda que possamos tentar encontrar uma solução para a Casa do Douro. Incomoda-vos porque uma solução para a Casa do Douro significa tirar os interesses que os senhores instalaram na região.

Ora, é isto que vos incomoda.

Daremos todo o contributo para retirar os interesses que os senhores instalaram na região, porque a nossa solução e os interesses que defenderemos serão sempre os interesses dos pequenos e dos médios viticultores e os interesses da Região Demarcada do Douro.

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