Intervenção de

Política de educação<br />Intervenção da Deputada Luísa Mesquita

Senhor Presidente, Senhores Deputados, Senhoras Deputadas,Numa política exclusivamente economicista, o actual governo olha os sectores sociais, e naturalmente a educação como uma empresa que a todo o custo e rapidamente terá que apresentar lucros.É nesta óptica que o Ministro da Educação informou que tem que cortar 114 milhões de euros em despesas no orçamento de estado deste ano.E nesta linha de raciocínio procuram-se os alvos a abater - a rede escolar e o ensino recorrente.Não para constituírem objecto de avaliação e de reestruturação que viabilizassem a racionalização dos custos e um melhor funcionamento das respectivas áreas.Porque estes mecanismos são procedimentos pouco céleres para quem reduz a governação ao ditame linguístico - Encerre-se e extinga-se!Mas se este exercício de governação nada tem de moderno e muito menos de pedagógico, se considerarmos o sistema educativo nacional concluiremos também que é paradoxal e decorre de uma azáfama "doméstica" cientificamente injustificável.Apesar da escassez de dados estatísticos postos à disposição do país pelas estruturas governamentais ou do Estado, o que é possível conhecer é deveras preocupante e demonstra inequívocamente a injustiça das medidas avulsas vindas a público.Os dados mais recentes afirmam que 62,6 da população activa portuguesa não tem 6 anos de escolaridade; 77% não tem a escolaridade básica e a OCDE prevê que 60% da população portuguesa não possuirá formação igual ou superior a 9 anos em 2015.São números assustadores que nos afastam dos restantes parceiros da União Europeia.O que faz o governo?Encerra centenas de escolas.E extingue, a eito, a única alternativa existente no país vocacionada para um, público adulto, que trabalha e que procura, a expensas próprias, uma segunda oportunidade no sistema educativo.E tudo isto é proposto em nome de uma suposta adequação da rede escolar que só a tutela conhece.E por isso impõe.E por isso informa as escolas por fax.E por isso ignora os parceiros.É o resultado do desconhecimento da realidade.É o resultado da ausência de critérios transparentes capazes de sustentar as soluções propostas.Como seria esperado, estas decisões arbitrárias têm sido objecto de contestação generalizada, particularmente por parte daqueles que, directamente implicados, não são ouvidos, nem admitidos como interlocutores.Neste processo mental limitador e limitativo do quero , logo posso, logo mando, não foi equacionado o conhecimento privilegiado da realidade que, nesta matéria, têm as autarquias e os órgãos de direcção e gestão das escolas.O governo preferiu ignorar a complexidade dos problemas levantados pelo ordenamento da rede escolar que obrigava a um amplo e ponderado debate, na procura de uma matriz que colhesse o mais vasto e diversificado consenso.O governo preferiu atacar parcelas do sistema, seleccionou, aqui sim, criteriosamente, as mais frágeis e vai proceder com a tranquilidade da insensibilidade que o motiva ao abate.Vai gerar conflitualidades que o governo pretende rentabilizar pelo atomismo das soluções que pôs em curso, em detrimento de uma proposta mais abrangente e construída por sucessivas aproximações de todos os parceiros.Nesta estratégia do encerramento e da extinção não se mediram as consequências .Senão vejamos.O Governo pretende encerrar todas as escolas do 1º Ciclo do Ensino Básico com menos de 10 alunos.Saberá o governo que está a falar de milhares de escolas.Saberá o governo que está a aumentar em milhares, o já grande número de professores com horário zero.Saberá o governo que o reduzido número de alunos na maioria destas escolas não decorre, exclusivamente, do vector demográfico, mas também de um desenvolvimento económico do país assimétrico, não sustentado, que provocou um crescimento urbano litoralizado e uma desertificação do espaço rural interior.Saberá o governo que o 1º ciclo do ensino básico foi sempre para as diferentes tutelas educacionais o parente pobre do sistema, particularmente nas zonas económicas mais débeis, onde a falta de recursos e equipamentos tem vindo a produzir um factor de profunda discriminação.Saberá o governo que no caminho da sucessiva e progressiva desresponsabilização do poder central em matéria educativa, foram as autarquias que sem as suficientes contrapartidas financeiras, assumiram a responsabilidade deste patamar do sistema.As autarquias têm de garantir a manutenção das escolas, o serviço de refeições, os transportes escolares, a ocupação dos tempos livres. Naturalmente que, depois da aprovação do orçamento rectificativo, pelo PSD e pelo PP, o garrote financeiro imposto ao poder locar democrático terá, também nesta área, as consequências previsíveis.Mas o governo não sabe ou não quer saber.E a confirmá-lo está o programa apresentado nesta casa que ignora, por completo, o 1º Ciclo do Ensino Básico.Nenhuma medida, nenhuma intenção é avançada para resolver os constrangimentos e as dificuldades que vive a generalidade das escolas deste ciclo da escolaridade básica.Mas a razão deste silenciamento é agora óbvia.Há problemas, encerram-se as escolas.Quem vai suportar as custos das deslocações?Quem vai suportar os custos das respostas sociais, imprescindíveis a crianças de meia dúzia de anos, afastadas das zonas de residência?Quais as previsões de insucesso e abandono escolares resultantes das medidas propostas?O governo não sabe, nem quer saber.Toma as decisões de forma arbitrária e depois se verá.E relativamente ao Ensino Recorrente os métodos foram os mesmos.Primeiro extinguem-se os cursos e depois pensa-se nisso.Mas entretanto, vai repetindo à exaustão que a qualificação dos portugueses é o primeiro e o último objectivo da política educativa deste governo.Como? É simples.· Extingue-se rapidamente e com fervor· Espera-se que um dia a alternativa chegue, quiçá por milagre.Dizia a Senhora Secretária de Estado aqui, recentemente, que o desaparecimento do ensino recorrente em inúmeras escolas se justificava porque "não funcionava bem".É um facto que não funcionava bem.Impunha-se proceder à avaliação desta experiência recente no sistema educativo e, a partir daí, equacionar as medidas necessárias a um funcionamento mais eficiente, mais motivador para alunos e professores, e mais propiciador do sucesso.Quando se fala de ensino recorrente é indispensável situá-lo nos seus objectivos - fomentar a aprendizagem ao longo da vida e acabar com o analfabetismo.Mas num país, onde os índices de reduzida qualificação da população activa são preocupantes, é no mínimo desastroso que se proceda à extinção de cursos, vocacionados para um público adulto que trabalha e procura uma primeira ou segunda oportunidade de aprendizagem, sustentando esta decisão por razões de natureza financeira e administrativa.Saberá o governo que a procura do Ensino Recorrente aumentou de 70.000 candidatos em 1997/98 para mais de 100.000 em 2001/2002.Era exigível, no mínimo, que se avaliasse o modelo que foi imposto às escolas.Que se caracterizasse a população que a ele recorre.Que se definissem com clareza os objectivos pretendidos.Mas o governo optou por medidas avulsas, sem nenhuma sustentação, sem nenhuma estratégia.Conhecerá o governo as implicações que esta decisão terá nas escolas, na vida profissional dos professores afectos a este tipo de ensino e nas expectativas dos alunos que, inesperadamente, foram confrontados com o desaparecimento do curso na escola que frequentam.Maia uma vez o governo não sabe, nem quer saber.Não foram minimamente acautelados os direitos dos professores e dos alunos, nem os interesses do país.O governo substituíu as urgentes medidas que o país precisa quer relativamente à rede escolar, quer relativamente ao ensino recorrente pela política da extinção e do encerramento.O governo não percebeu ainda que sem um investimento acrescido na área da educação e da formação não é possível qualquer mudança na sociedade portuguesa que nos aproxime da realidade dos países europeus.Sr. Presidente, Sr. Deputado Sérgio Vieira,De facto, o que o senhor não disse, não percebeu e não quis ouvir, porque é algo difícil de assumir, foi que o Governo do PSD e do CDS-PP e, particularmente, esta tutela educativa não governam a educação. É verdade que extinguem e encerram, mas isto não é governar a educação!O que o Sr. Deputado não ouviu e não quis ouvir, penso que por não poder confirmar aquilo que eu disse, é que todas as medidas que foram tomadas demonstram falta de rigor, de avaliação e de sustentação. Na verdade, o Sr. Deputado nunca poderia confirmar o que eu disse na minha intervenção, ou seja, que tudo isto só tem o fundamento economicista com que os senhores encaram a educação.Aliás, permito-me citar um professor que, na semana passada, em entrevista a um órgão de comunicação social, disse o seguinte: «A educação é cara para o Governo do PSD e do CDS?! Então, se a educação é cara, experimentem a ignorância e depois logo verão como é que o País fica!»O que o Sr. Deputado não justificou, porque nem o senhor nem o seu Governo o sabem fazer, foram as medidas por vós tomadas na área do ensino recorrente e na área do 1.º ciclo, sobretudo tendo em atenção que, no ensino recorrente, de 70 000 candidatos em 1997/1998 passámos para 100 000 candidatos em 2000/2001. O que o Sr. Deputado disse aqui - algo de gravíssimo que, espero, terá sido ouvido lá fora - foi que estes 100 000 candidatos são desonestos, não merecem o rendimento mínimo garantido e não merecem o ensino recorrente e que, por isso, o Governo do PSD e do CDS-PP acabou com ele!Sr. Deputado, isto é não ter respeito por aqueles que procuram o ensino recorrente e isto é não ter respeito pelos índices de ausência de qualificação, de formação e de aprendizagem que a população activa portuguesa ainda denota. Isto o Sr. Deputado não sabe justificar porque tal não tem justificação, a não ser, como já disse, pela vertente economicista do Governo, que o senhor sustenta e defende!

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