Intervenção de Jerónimo de Sousa na Assembleia de República

"Para haver um Estado moderno, os trabalhadores têm de ser respeitados"

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Sr. Presidente,
Sr. Primeiro-Ministro,

Antes de mais, permita-me uma ligeira introdução para dizer ao Sr. Deputado Nuno Magalhães que ou teve uma branca ou estava distraído, porque, tanto no anterior debate quinzenal, como ainda ontem no debate feito aqui, na Assembleia da República, se verificou que, afinal, o PCP continua a considerar que ainda em 2016 é possível um aumento das pensões e das reformas, e estamos a trabalhar para isso.

Creio que era importante fazer esta correção.

Sr. Primeiro-Presidente, neste debate, ficou claro que o que preocupa o PSD e o CDS não é a opinião da UTAO sobre o Orçamento e o défice. As preocupações do PSD e do CDS têm a ver com outras duas questões.

A primeira é a de que andou por aí muito contrabando: PSD e CDS, durante quatro anos, andaram a dizer aos portugueses que os cortes eram temporários, mas diziam à Comissão Europeia que eram definitivos.

Esta manobra ficou agora a descoberto. Ficou claro que enganaram os portugueses e agora estão preocupados em tentar esconder esse engano premeditado.
Por outro lado, PSD e CDS estão preocupados não com o défice mas com a real possibilidade da reposição daquilo que cortaram, dos salários e das pensões. A Assembleia da República já decidiu e o Orçamento confirmará.

O que preocupa PSD e CDS é que esses cortes que fizeram sejam eliminados, que esses direitos e rendimentos sejam repostos, e que os trabalhadores possam ver devolvidas as suas condições de vida e de trabalho. E esta é uma questão central para a discussão do Orçamento do Estado, mas também para discutir a própria modernização do Estado, tema que o Sr. Primeiro-Ministro trouxe a debate.

Para haver um Estado moderno, os seus trabalhadores têm de ser valorizados e reconhecidos, tem de haver respeito pelos seus direitos e pelos seus salários, têm de ser valorizados os seus horários de trabalho, têm de ser definidos com dignidade e respeito pela conciliação da sua vida familiar e pessoal, tem de haver condições de progressão de carreiras e de valorização profissional e tem de se pôr fim ao drama, que atinge milhares de trabalhadores, dos vínculos precários na Administração Pública, dos contratos emprego-inserção, dos contratos individuais de trabalho ou de outras formas de contratação que não assegurem um vínculo com estabilidade correspondente às tarefas que desempenham.

Estas questões centrais, que são uma boa parte dos problemas com que o Estado se confronta, têm a ver com o desrespeito do anterior Governo pelos direitos dos trabalhadores da Administração Pública.

A questão que colocamos é no sentido de saber se o Governo, hoje, neste debate, está em condições de dar resposta a estas preocupações e a estes problemas, que aqui identificámos, dos trabalhadores da Administração Pública e do sector empresarial do Estado.

(…)

Sr. Presidente,
Sr. Primeiro-Ministro,

Gostaria apenas de deixar uma nota de preocupação, relativamente a uma questão que não referiu e que, para o PCP, é importante, refiro-me à dimensão da precariedade existente na Administração Pública. Isto porque, desde os contratos de inserção às diversas formas de precariedade, também temos a conceção de que, para um posto de trabalho permanente, deve haver um contrato de trabalho efetivo. E, portanto, nesse sentido, solicitamos que, nas vossas preocupações e propostas, tenham em conta a precariedade que se abate sobre milhares de trabalhadores da Administração Pública.

Gostaria também de colocar uma outra questão. Há uma denúncia, feita pelo ex-diretor da Autoridade Tributária e confirmada por esta mesma autoridade, de que, em Portugal, os mais ricos entre os ricos não pagam os impostos devidos, sonegando ao Estado e à comunidade um valor estimado na ordem dos 3000 milhões de euros anuais em sede de IRS.

Sabe-se que a Autoridade Tributária, recorrendo às suas bases de dados e à informação externa, procedeu ao levantamento dos contribuintes que detêm um património superior a 25 milhões de euros ou rendimentos anuais superiores a 5 milhões de euros. São para já 240 pessoas que, em 2014, pagaram, em sede de IRS, apenas 48 milhões de euros, um valor claramente insignificante, tendo em conta os elevadíssimos rendimentos e património dessas pessoas.
Uma empresa que vende serviços de consultadoria fiscal considera que estes contribuintes milionários constituem um universo de 1000 pessoas que fogem aos impostos. São 3000 milhões de euros de fuga aos impostos, é muito dinheiro! Quase me apetecia citar o Dr. Durão Barroso, que, numa altura, dizia: «É uma pipa de massa!». E, é! São 3000 milhões de euros que fogem ao fisco.

Quem nunca foge e paga sempre são os que vivem do rendimento do seu trabalho e os pequenos e médios empresários. E a questão que queria colocar é no sentido de saber se, por um lado, o Governo tem na sua posse elementos sobre a verdadeira dimensão desta situação e se, por outro, está a pensar tomar medidas adequadas para pôr fim a este escândalo. Isto porque, Sr. Primeiro-Ministro, não tardará vermos aqueles que passam a vida a invetivar os que pretendem repor direitos e rendimentos legítimos aos trabalhadores e às populações, pois fazem vista grossa a este grave problema nacional. E este é um problema decisivo para que, no plano orçamental, se encontrem as receitas necessárias para dar resposta aos problemas dos trabalhadores, do povo e do País.
Da nossa parte, consideramos que está na hora de serem tomadas medidas que dotem a Autoridade Tributária e Aduaneira dos meios e instrumentos que permitam o combate às evasões fiscais dos contribuintes mais ricos, mas, também, uma nova alternativa de política fiscal mais justa, mais adequada às necessidades do País.

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