Intervenção de Ana Avoila, Coordenadora da Frente Comum e membro da Comissão Executiva do Conselho Nacional - CGTP-IN, Sessão Pública «Direitos dos trabalhadores e progresso social»

Não existe democracia sem uma Administração Pública de qualidade, ao serviço dos trabalhadores e das populações

Não existe democracia sem uma Administração Pública de qualidade, ao serviço dos trabalhadores e das populações

Não podemos falar de progresso social sem ter como ponto de partida a existência de uma Administração Pública que, por um lado, garanta os direitos dos seus trabalhadores e, por outro, esteja ao serviço do povo e do país. Com a Constituição da República Portuguesa como pano de fundo, cabe à Administração Pública garantir e efectivar as funções sociais do Estado a todos os cidadãos sendo a própria Administração Pública uma condição do exercício dos direitos fundamentais.

Por isso mesmo, vários governos PS, PSD e CDS-PP, na sua senda revanchista contra Abril têm vindo a prosseguir o seu principal objetivo que é também objetivo do grande capital: a reconfiguração do Estado. A consolidação de políticas de direita, com a ajuda da troika estrangeira nos últimos anos que, por toda a Europa submete económica e financeiramente as soberanias nacionais ao grande capital, tem vindo a concretizar o plano político de entrega aos privados de setores fundamentais da economia portuguesa através das privatizações do sector produtivo, comunicações, sector energético, do sector agrícola, de serviços públicos vendendo por «tostões» ao privado sectores que hoje são dos mais lucrativos no quadro da iniciativa económica privada.

PEC ante PEC, o caminho das privatizações das empresas e serviços públicos avançou, como avançaram os cortes salariais do PS, hoje recuperados por PSD e CDS-PP, como avançou a chamada «reforma da Administração Pública» com PRACE e PREMAC, desmantelando a estrutura de prestação dos serviços públicos pelo Estado com o encerramento de serviços e destruição de postos de trabalho – mais de 72 mil trabalhadores da Administração Pública no desemprego ou empurrados para a aposentação – e a destruição com o Governo de PS/Sócrates do vínculo de nomeação – pedra basilar do regime jurídico da contratação que garante a equidade e a transparência no exercício de funções públicas, bem como a dignidade nas carreiras e os direitos dos trabalhadores da Administração Pública.

Assim, a par da continuada degradação dos serviços públicos, o ataque aos trabalhadores da Administração Pública tem sido contínuo: sucessivos roubos salariais e nas pensões, cortes nos subsídios de férias e de natal, congelamento das progressões nas carreiras, inexistência de aumentos salariais, congelamento de todas as pensões acima dos 1º e 2º escalões das pensões mínimas, aumento do horário de trabalho para as 40 horas semanais, introdução da possibilidade do despedimento sem justa causa através da chamada requalificação, proibição de contratação nos serviços públicos deixando-os em situações de total ruptura, precarização das relações laborais, entre muitas outras medidas que agravam a situação económica e social dos trabalhadores.

Desde 2011 e com a previsão de mais roubos salariais por via da Lei n.º 75/2014 (que vieram recuperar os roubos do PEC III), o Governo arrecada com o congelamento dos salários 1.700 milhões de euros, com os sucessivos cortes salariais 4.400 milhões de euros, com o roubo dos subsídios em 2012, 1.200 milhões de euros, com o trabalho gratuito de milhares de trabalhadores por via do aumento do horário de trabalho das 35 para as 40 horas o Governo mete ao bolso 1.486 milhões de euros, montantes que são dos trabalhadores e que estes exigem que lhes sejam devolvidos.

Também as medidas contra quem trabalhou e descontou toda uma vida revelam bem o cunho de classe deste Governo: o aumento contínuo da idade da reforma, os roubos nas pensões, a Contribuição Extraordinária de Solidariedade nos últimos anos, o aumento das contribuições para a ADSE (que aumentaram 133% em sete meses cifrando-se hoje em 3,5%) e para a CGA, medidas que se somam às medidas gerais tomadas contra todos os trabalhadores e as camadas populares.

Neste mandato, e apesar das várias declarações de inconstitucionalidade, o Governo impõe despoticamente as suas medidas tiranas de empobrecimento dos trabalhadores da Administração Pública e prossegue mesmo com atitudes de total ilegalidade e desrespeito pelos trabalhadores, como é paradigmático o caso do recurso aos Contratos Emprego Inserção em que ilegalmente o Governo coloca trabalhadores no desemprego a ocupar necessidades permanentes dos serviços públicos, pagando-lhes uma bolsa enquanto os mantém no desemprego e se livra deles ao fim de um ano para colocar outras pessoas, situação que motivou uma reclamação da Federação Nacional dos Sindicatos dos Trabalhadores em Funções Públicas e Sociais à OIT.

Já para 2015 o Governo PSD/CDS-PP propõe-se a continuar com os cortes salariais, enganando os trabalhadores com a suposta devolução. Não existe qualquer devolução: o Governo mantém os cortes mas em menor proporção, aumenta o IRS, mantém a sobretaxa ao mesmo tempo que reduz o IRC, ou seja, o imposto sobre o lucro das empresas e apresenta um pacote fiscal que agravará, e muito, os custos que as famílias já hoje pagam enquanto um pequeno número de fortunas não pára de aumentar, como ainda ontem anunciou a imprensa: lucros da corticeira Amorim sobem 15,5% até Setembro.

Aliás, a proposta de orçamento para 2015 é uma proposta de continuidade da austeridade, amarrando os portugueses a um Tratado Orçamental aceite por PS, PSD e CDS-PP que exige mais despedimentos na Administração Pública, mais encerramentos de serviços públicos, menos investimento público. A troika estrangeira, por seu lado, continua em Portugal, submetendo o país a uma avaliação de 6 em 6 meses pelo menos até 2035, ou seja, mais 21 anos a atacar a soberania nacional e popular, enquanto Portugal paga 38,43 mil milhões de euros de juros agiotas. Ora, apenas um ano de juros pagos a esta troika estrangeira serviriam para repor o nível salarial de todos os trabalhadores da Administração Pública durante 3 anos.

Contudo, estas políticas já provaram o seu fracasso: não só não têm servido qualquer interesse público como têm aumentado o défice, a taxa de desemprego e provocado o empobrecimento generalizado da população, a par de um processo de destruição das funções sociais do Estado e da sua reconfiguração capitalista e um ataque sem precedentes à Constituição da República Portuguesa.

Por isso mesmo os trabalhadores e os seus sindicatos de classe têm dado a resposta necessária: mais recentemente e desde a quinzena de luta convocada pela CGTP-IN em Setembro não tem existido uma única semana em que os trabalhadores não estejam em luta contra este Governo. Falo das greves dos enfermeiros, da greve dos assistentes operacionais, técnicos e outros profissionais do sector da saúde, a greve e paralizações dos funcionários judiciais, a luta dos trabalhadores civis dos estabelecimentos fabris do Exército e empresas de defesa contra a extinção das Oficinas Gerais de Fardamento e Equipamento, Oficinas Gerais de Material de Engenharia e Manutenção Militar, a luta dos trabalhadores da administração local pelas 35 horas de trabalho, a grandiosa manifestação da Administração Pública no dia 31 de Outubro em defesa dos serviços públicos e das funções sociais do Estado e as várias lutas desenvolvidas quer nos locais de trabalho, quer em acções de rua nestes últimos anos que têm exigido dos trabalhadores uma maior consciencialização, mobilização e unidade nas suas lutas.

Tais lutas continuarão, exigindo a demissão deste governo e de qualquer outro que prossiga com as mesmas políticas de ataque aos trabalhadores, de empobrecimento das camadas populares, de desmantelamento da Administração Pública, de verdadeira afronta às camadas mais desfavorecidas das populações.

Não existe democracia sem uma Administração Pública de qualidade, ao serviço dos trabalhadores e das populações, que garanta o exercício dos direitos constitucionais de todos e ao mesmo tempo o direito dos seus trabalhadores a um posto de trabalho e a um trabalho digno e com direitos. É pela Administração Pública que lutamos. É pela defesa da Constituição. Pela demissão do Governo, por eleições antecipadas, por um Governo patriótico e de esquerda. E venceremos.

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