Intervenção de Maria do Carmo Tavares, membro da Comissão para os Assuntos Sociais do PCP, Seminário «O Euro e a União Económica e Monetária. Constrangimentos e Rupturas»

A matriz ideológica da União Europeia é incompatível com o desenvolvimento e o bem estar dos povos

Nestes 28 anos em que Portugal se integrou na União Europeia e depois na União Económica e Monetária pela mão dos governos do PSD, CDS e PS que os portugueses e o País sentiram, e bem, grandes constrangimentos logo, na alienação de partes importantes da sua soberania, na situação económica, e um retrocesso social que pôs em causa mesmo direitos básicos.

Nos últimos anos a situação agravou-se pela imposição dos Programas de Estabilidade e Crescimento.

A política de austeridade imposta pelos governos do PS primeiramente e, agora, do PSD/CDS e pelas instâncias que constituem a Troika tem agravado a situação o que levou ao empobrecimento de vastíssimas camadas da população nomeadamente os trabalhadores, os desempregados, os reformados e os pensionistas, crianças e jovens, bem como à exclusão de muitos dos seus cidadãos, obrigou à emigração de jovens, muitos altamente qualificados e que fazem muita falta ao País.

A matriz ideológica da União Europeia é incompatível com o desenvolvimento e o bem estar dos povos porque a orienta insaciavelmente para atacar os direitos laborais e sociais, diminuir os salários e as pensões e submete-nos a aumentos brutais de impostos, o que leva a uma maior exploração, desigualdade e pobreza.

Outro eixo central da sua matriz é desmantelar e desprestigiar os serviços públicos e as políticas sociais para as entregar ao grande capital financeiro e fazer delas grandes áreas de negócio.

É devastador o que se está a passar no nosso País, a Constituição da República Portuguesa é desrespeitada com frequência. Se não fosse, em primeiro lugar, a luta dos trabalhadores da Administração Pública ao longo dos tempos, há muito que pouco restava do papel do Estado.

Calculistamente a ofensiva aos serviços públicos e aos direitos sociais que presta, tiveram como alvo os seus trabalhadores afirmando que havia trabalhadores a mais, e que ganhavam bem.

Introduziram unilateralmente alterações ao vínculo profissional da Administração Pública, diminuíram o valor dos seus salários (o que aconteceu pela primeira em Portugal), proibiram qualquer entrada de novos trabalhadores, segundo as regras estabelecidas.

Se for necessário excepcionalmente a contratação dos trabalhadores e através da sub-contratação de empresas privadas, essencialmente, na área da saúde e da Segurança Social, é uma vergonha como os privados ocupam os serviços da Estado, e estão a servir a população.

Mais de 75 000 trabalhadores da Função Pública foram forçados sair, nomeadamente por reformas antecipadas, sem serem substituídos e o Estado em 2015 prevê a extinção de mais 12 000 postos de trabalho. Por outro lado tem havido sucessivas reestruturações o que tem levado ao encerramento de Tribunais, de Escolas essencialmente básicas, serviços da Segurança Social, Centros de saúde, Valências Hospitalares, Urgências e, por outro lado, tem havido uma mega centralização de serviços.

As populações reconhecem que os serviços públicos estão a piorar e têm reagido manifestando a sua revolta e exigindo a reposição dos mesmos.

Estas políticas são profundamente desumanas, os serviços públicos que deveriam ser cada vez de mais proximidade, pelo contrário, no interior do país há Tribunais, Urgências, Centros de Saúde e Serviços da Segurança Social dezenas e dezenas de quilómetros sem haver transportes públicos compatíveis, o que é dramático para os idosos, os doentes e pessoas com poucos recursos que não podem aceder aos seus direitos sociais.

É necessário afirmar cada vez mais, como é referido que a crise social que estamos a viver não é dissociada das políticas da União Europeia e dos constrangimentos e orientações da União Económica e Monetária e que ela é incompatível de todo com a vida e os direitos das pessoas sendo, por isso, necessário roturas e políticas alternativas.

Não podemos continuar a ver o nosso Serviço Nacional de Saúde a definhar. Entre 2010 e 2014 a despesa da saúde sofreu um corte de 1 700 milhões de euros e para 2015 estão previstos menos 746 milhões de euros para cobrir as despesas orçamentadas.

Os cuidados de saúde estão a ficar distantes das pessoas, pois o número de médicos, enfermeiros e outros profissionais estão muito abaixo dos mínimos exigidos.

Há falta de condições de trabalho, há grandes cargas de trabalho o que leva à exaustão os profissionais pondo em risco a qualidade dos cuidados de saúde prestados. Muitos directores clínicos e hospitalares pediram demissão.

Muitas urgências hospitalares estão a funcionar numa base precária, os seus profissionais são sub-contratados a empresas multinacionais. Com a vinda da Troika aumentaram os custos da saúde para os utentes, com o aumento significativo das taxas moderadoras e da comparticipação nos medicamentos.

Quanto à protecção social têm sido os desempregados, os reformados e as crianças as mais penalizadas.

Num período em que justificava um reforço da protecção ao desemprego, dado o número de desempregados, as regras foram alteradas para diminuir a sua protecção. Há centenas de milhar de trabalhadores desempregados sem qualquer protecção, mesmo a protecção mais básica do Sistema de Segurança Social, que é o Rendimento Mínimo de Inserção, as suas regras já foram alteradas diversas vezes e o valor da prestação diminuído, afastando dezenas de milhar de beneficiários, quando o risco de pobreza aumentou no nosso país, em 2013 19,5% das pessoas estão em risco. Porém o mais grave é que 25,6% dos menores de 18 anos estão em risco de pobreza. O abono de família e todas as prestações não são aumentadas desde 2010 e as novas regras expulsaram 600 000 crianças e jovens de ter esse direito. As prestações sociais são cada vez mais assistenciais na medida em que deixaram de ser universalistas.

A comparticipação nos passes sociais escolares deixou também de ser universal, assim como a comparticipação para custear os encargos escolares, a atribuição de bolsas de acção social no ensino superior é mais restritivo.

Desde 2010, os rendimentos médios de trabalho diminuíram mais de 30%, o salário mínimo nacional é baixíssimo, as famílias empobrecem e ao mesmo tempo as prestações sociais diminuíram sendo de todo inaceitável e imoral.

Os reformados também não escaparam e têm sido profundamente lesados. Em primeiro lugar desde 2010 as pensões não têm sido aumentadas, com excepção do aumento ridículo algumas pensões mínimas, e por ser criada uma Contribuição Extraordinária de Solidariedade a aplicar às pensões assume como um Factor de Sustentabilidade o que foi agravado em 2014 cujo objectivo é reduzir a pensão estatutária a que a pessoa tem direito depois de uma vida de trabalho e a contribuir.

Foram reduzidas prestações por dependência, subsídio por morte, complemento solidário para idosos. Nada tem escapado a estes algozes até o subsídio de funeral diminuiu. A idade da reforma aumentou para 66 anos, muito mais havia para dizer. Como o PCP referiu no seu Encontro Nacional realizado há poucos dias, hoje como em nenhum outro momento desde o fascismo, coloca-se com tanta urgência de uma política que liberte o País da submissão e dependência externa e do domínio do capital monopolista. A dimensão dos problemas reclama ruptura com esta política destruidora, uma política alternativa e de uma alternativa política patriótica e de esquerda vinculada aos valores de Abril.

Uma política alternativa que combata a política à direita capaz de responder aos problemas do país e às aspirações dos trabalhadores e das populações que defenda os Serviços Públicos e as Funções Sociais, que ponha termo às desigualdades e à pobreza, que rejeite a submissão às imposições do Euro e da União Europeia.

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