Intervenção de

Lei de Enquadramento do Orçamento do Estado - Intervenção de Octávio Teixeira

Senhor Presidente Senhores Deputados

É uma evidência que a Lei de enquadramento do Orçamento do Estado, e o direito orçamental de uma forma mais geral, estão desactualizados e sofrem múltiplas insuficiências e deficiências. Quer quanto à regulamentação de alguns normativos constitucionais, quer no que respeita à adequação a novos sistemas e técnicas de gestão dos dinheiros públicos e à imposição de efectivos rigor e veracidade das contas públicas, quer ainda no que concerne ao controlo eficaz de toda (mas de toda) a actividade financeira do Estado nos âmbitos jurisdicional e político.

Por exemplo, carecem de adequado enquadramento legal a disciplina do orçamento da Segurança Social e o regime da elaboração e execução dos orçamentos dos fundos e serviços autónomos. Do mesmo modo que se impõe disciplinar o quadro legal da actividade financeira dos "institutos" de natureza empresarial ou para-empresarial que crescentemente vão proliferando, precisamente com o objectivo de fazer escapar parcela crescente da actividade financeira do Estado à disciplina orçamental e ao controlo político por parte da Assembleia da República. Como se impõe impedir o recurso pelos Governos a determinadas "engenharias financeiras" com o objectivo, mais uma vez, de fugir às regras, limites e controlos orçamentais. Ou ainda, e sem a preocupação de ser exaustivo, a habilitação legal de o Tribunal de Contas poder realizar, em permanência e tempo útil, o acompanhamento e a fiscalização da execução orçamental, bem como a fixação de prazos para o Governo entregar ao Tribunal de Contas a versão final da Conta Geral do Estado e para o Tribunal emitir o respectivo parecer, de forma a que a Assembleia da República possa, em tempo politicamente adequado, apreciar e votar a Conta Geral do Estado. Passando, ainda, por eventuais alterações processuais relativamente à discussão e votação do Orçamento do Estado na Assembleia da República.

Em suma, a Lei de Enquadramento necessita de uma profunda e ampla alteração. Que está por fazer e já deveria ter sido feita. Cabendo a responsabilidade política dessa omissão fundamentalmente ao Governo. Pois é ele, Governo, pelos meios técnicos de que dispõe, que melhor posicionado está para apresentar uma proposta de alteração de tão grande fôlego. Acrescendo que, face à iniciativa no final da legislatura anterior (apresentada em tempo que o Governo já sabia não poder vir a ser apreciada pela Assembleia da República), era legítimo supor que o actual Governo a retomaria em tempo útil. Mas responsabilidade que cabe igualmente a todos e cada um do Grupos Parlamentares.

Ao PSD cabe o mérito de ter tomado a iniciativa de propor o projecto de lei 191/VII, hoje em discussão. Mas o seu agendamento intempestivo corre o risco de lhe retirar a eficácia que poderia ter no desencadear de um processo de ampla e adequada revisão do enquadramento orçamental. Porque a verdade é que os objectivos do projecto de lei do PSD são por demais limitados. De facto, e em última análise, o grande objectivo deste projecto de alteração da Lei de Enquadramento do Orçamento do Estado prende-se com a limitação financeira das actividades que o Governo pode desenvolver à margem do Orçamento do Estado. Em certa medida, bem se pode dizer que é um acto de contrição do PSD: depois de ter autorizado a compra de submarinos em leasing, fora do enquadramento orçamental, sente e receia agora que o caminho aberto, em acumulação com as SCUT, possa levar a um completo desregramento das finanças públicas e, por isso, a necessidade de o limitar.

Porém, coloca-se aqui uma questão de fundo que é necessário dirimir e decidir: as práticas de desorçamentação devem ou não ser aceites? Pela nossa parte apontamos para não permitir a desorçamentação de qualquer parcela da actividade financeira do Estado. Independentemente do seu montante. São o princípio, o rigor, a verdade, o controlo e a fiscalização das contas públicas que estão em causa. Diferente e aparentemente, para o PSD parece que o que está em causa não é a desorçamentação, mas tão só o seu montante. Por acréscimo, quanto maior for a dívida pública maior é a capacidade concedida ao Governo para financiar, à margem do OE, "a construção de escolas, hospitais, prisões e demais obras públicas", a que hoje aludia o Deputado Durão Barroso num artigo de opinião.

Mas, limitado embora nos seus objectivos, a eventual aprovação do projecto de lei do PSD traduz alguns melhoramentos em relação à situação actual. Excluindo, evidentemente, a ideia peregrina de tentar impor a obrigatoriedade de o Orçamento do Estado não poder ter qualquer défice. Trata-se de um fundamentalismo mais profundo que o do "pacto de estabilidade". Desde logo porque este reveste a natureza de um mero acordo, um "pacto", que por consenso pode ser alterado em qualquer momento. Mas, fundamentalmente, porque o "pacto de estabilidade" aponta para o equilíbrio orçamental de forma tendencial (que não definitivamente impositiva) e se reporta à globalidade do sector público administrativo e não ao subsector Estado. Aliás, seria interessante ver, no quadro desta sua proposta, onde é que o PSD iria reduzir a despesa do Orçamento do Estado para 2000 em ... 560 milhões de contos! Um exercício que talvez o PSD possa fazer durante este debate...

Com esta ressalva de fundo, pela nossa parte não temos dificuldades em viabilizar o Projecto de Lei nº 191/VII na generalidade. Principalmente se por parte do PSD houver disponibilidade para que, em sede da especialidade, se possa vir a concretizar uma substancial alteração ao seu projecto, de forma a alargar o âmbito das alterações à actual Lei de Enquadramento do Orçamento do Estado.

 

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