Segurança
Social, evolução histórica
A Segurança Social desempenha um papel importante, quer para
assegurar o legítimo direito a uma reforma digna, quer para mitigar as
consequências do capitalismo.
Os problemas da pobreza, como foi já referido, radicam nas
contradições e na injustiça latente do sistema capitalista. O capitalismo e a
sua crescente concentração de riqueza remetem milhares de portugueses para a
pobreza.
Mesmo sabendo que a Segurança Social mitiga o problema e não
o resolve, o PCP valoriza a Segurança Social enquanto importante instrumento de
combate às injustiças sociais.
O Governo PS levou a cabo uma contra reforma da Segurança
Social que atacou o cariz universal e solidário desta e introduziu a visão neo
liberal, preconizada pelo Banco Mundial e FMI, o que acarreta menos protecção
na velhice e a aposta nos regimes complementares que irão agravar as injustiças
sociais no que respeita à idade e ao montante da reforma.
Tendo em conta que uma boa parte da pobreza se concentra na
nossa população mais idosa, podemos afirmar que esta contra reforma irá agravar
este problema.
Para percebermos a evolução, o caminho e as propostas
apresentadas pelo nosso Partido importa analisar o percurso histórico da
Segurança Social, ainda que de uma forma não muito detalhada, para assim
contextualizar e objectivamente comparar as diferentes opções preconizadas por
sucessivos Governos.
Embora seja difícil precisar quando é que surgiram os
primeiros "mecanismos" de protecção social, a verdade é que foi no forte quadro
do associativismo operário do século XIX e nos centros industriais e urbanos
que surgiram as associações de socorros mútuos.
Estas associações dedicavam-se à assistência na saúde, à
atribuição de prestações em casos de incapacidade temporária ou permanente para
o trabalho, bem como à atribuição do subsídio de Funeral.
Contudo, rapidamente se percebeu que estes mecanismos de
protecção social eram claramente insuficientes, pelo que se deram passos, ainda
que muito incipientes, na protecção na velhice.
Assim, surgem, em 1919, os sistemas de seguros sociais
obrigatórios que se destinavam aos trabalhadores por conta de outrem com baixos
rendimentos. Nessa altura foi estabelecido um patamar, uma espécie de plafonamento, a partir do qual não havia
protecção. (nota é o chamo plafonamento horizontal)
É relevante o facto de, em 1935, com a publicação do
Estatuto do Trabalho Nacional, e ainda com níveis de protecção muito baixos e
assente num cariz meramente assistencialista, o financiamento já se apoiar nas
contribuições dos trabalhadores e das entidades patronais. Outro aspecto
interessante era o facto de estar a funcionar nessa altura o sistema puro de
capitalização.
Em 1962, com a publicação da Lei 2115 de 15 de Junho,
mantém-se o financiamento do sistema com base nas contribuições dos
trabalhadores e patrões, evoluindo-se, contudo, de um sistema de capitalização
puro para um sistema de capitalização mitigada.
Assim, a ideia, ou melhor, a existência de um sistema de
capitalização, pura ou mitigada, além de ser antiga, existiu durante todo o
período negro do fascismo em Portugal, estando associado a baixíssimos níveis
de protecção social e a gravíssimas injustiças sociais.
Antes de entrar no período histórico, verdadeiramente
marcante na evolução da protecção social - o pós 25 de Abril de 1974 -, importa
referir que a 1 de Janeiro de 1974 é eliminado o limite superior das
retribuições sujeitas a contribuição para a Caixa Nacional de Pensões. Ou seja,
é nesta altura eliminado o plafonamento horizontal,
ideia que, curiosamente, é recuperada posteriormente, mantendo-se essa
possibilidade na actual Lei do PS, nomeadamente no seu artigo 58º.
Entramos assim no período na nossa história em que a
protecção social deu passos muito significativos. Na verdade, o 25 de Abril de
1974 é um marco histórico no que à protecção social diz respeito.
De modelos e mecanismos parcelares de protecção social
passamos a ter um modelo unificado de Segurança Social assente na ideia,
verdadeiramente revolucionária, da universalidade e da justiça social.
Vejam-se, alguns extractos do Decreto-Lei n.º 203/74, de 15 de Maio.
"A vitória alcançada pelo Movimento das Forças Armadas Portuguesas, destituindo
o regime que não soube identificar-se com a vontade do Povo, à qual impediu
todas as vias democráticas de expressão, permite definir os princípios básicos
que esperamos contribuam de modo decisivo para a resolução da grande crise
nacional.
Em execução desses princípios, compete ao Governo Provisório:
Lançar os fundamentos de uma nova política económica, posta ao serviço do povo
português, em particular das camadas da população até agora mais
desfavorecidas;
Adoptar uma nova política social que, em todos os domínios, tenha como
objectivo a defesa dos interesses das classes trabalhadoras e o aumento
progressivo, mas acelerado, da qualidade de vida de todos os portugueses;
5. Política social:
a) Criação de um salário mínimo, generalizando-o progressivamente aos vários
sectores do mundo do trabalho;
...
d) Adopção de novas providências de
protecção na invalidez, na incapacidade e na velhice, em especial aos órfãos,
diminuídos e mutilados de guerra;
e) Definição de uma política de protecção da maternidade e da primeira
infância;
f) Aperfeiçoamento dos esquemas de seguro contra acidentes de trabalho e
doenças profissionais;
...
h) Substituição progressiva dos sistemas de previdência e
assistência por um sistema integrado de Segurança Social ;
i) Criação de novos esquemas de abono de família;"
Na verdade é com a Revolução de Abril que se conquistam
importantes protecções sociais: a protecção no desemprego, a pensão social,
melhorias significativas nos regimes dos trabalhadores agrícolas, e entre
outras, importantes e significativas melhorias nas prestações familiares.
É nesta altura que se quebra a perspectiva assistencialista
da protecção social, passando as diferentes prestações sociais a serem
encaradas como verdadeiros direitos.
Em 1977 cria-se uma nova estrutura orgânica da Segurança
Social.
Após esta fase histórica, e até à aprovação da primeira Lei
de bases em 1984, salienta-se a criação do Seguro Social Voluntário, alterações
ao subsídio de desemprego, alterações ao regime de pensões de invalidez e
velhice, entre outras alterações nas prestações familiares.
A primeira Lei de Bases da Segurança Social surge 1984 com a
Lei 28/84 de 14 de Agosto. A Lei de Bases define a macro estrutura da Segurança
Social. Nela se definem as prestações sociais, quem tem direito a elas, os
princípios, a administração do sistema, o campo material, o financiamento, os
regimes de protecção social, as garantias e contencioso, a organização e
participação e as iniciativas particulares.
Quanto aos princípios, e dentro dos mais relevantes,
destaca-se o princípio da universalidade, que consiste no alargamento
progressivo do âmbito de aplicação pessoal do sistema, o princípio da
igualdade, que consiste na eliminação de quaisquer discriminações, e o
princípio da solidariedade, que consiste na responsabilidade colectiva pela
realização dos fins do sistema e envolve o concurso do Estado no seu
financiamento.
Quanto à composição do sistema de Segurança Social, este
diploma define, como fazendo parte do sistema, o regime geral e o regime não
contributivo, que se concretizam em prestações garantidas como direitos. É
depois definida a acção social e, por fim, os esquemas de prestações
complementares.
Quanto ao financiamento é determinado que o regime geral da
Segurança Social é financiado pelas contribuições dos trabalhadores e, quando
se tratem de trabalhadores por conta de outrem, das respectivas entidades
empregadoras. O regime não contributivo, bem como a acção social, eram
financiados por transferências do orçamento de Estado.
Nesta Lei de Bases é admitida a criação de esquemas de
protecção complementares, que estão autonomizados, e portanto fora do sistema,
cabendo o seu financiamento única e exclusivamente aos interessados.
Entre 1984 e 2000, ano em que se modificou a Lei de bases da
Segurança Social, assistimos a alterações na generalidade das prestações sociais.
Em 2000, com a Lei 17/2000 de 8 de Agosto, alteram-se as
"Bases gerais do sistema de solidariedade e de Segurança Social ".
Quanto aos princípios mais relevantes, mantém-se o princípio
da universalidade, que consiste no acesso de todos os cidadãos à protecção
social, o princípio da igualdade que consiste na não discriminação dos
beneficiários, e o princípio da solidariedade, que consiste na
responsabilização colectiva dos cidadãos entre si, no plano nacional, laboral e
intergeracional na realização das finalidades do sistema, envolvendo o concurso
do Estado no seu financiamento.
São ainda
introduzidos os princípios da equidade social, que consiste no tratamento
igual de
situações iguais e no tratamento diferenciado de situações desiguais, o princípio da diferenciação positiva
que consiste na flexibilização das prestações, em função das necessidades e das
especificidades sociais, o princípio da inserção social que visa acções
positivas que eliminem as causas de marginalização e exclusão social, o princípio
da conservação dos direitos adquiridos e o princípio do primado da responsabilidade pública que
determina que é dever do Estado criar as condições necessárias à efectivação do
direito a Segurança Social .
Quanto à macro
estrutura, a Lei 17/2000 determina que o sistema de solidariedade e de
Segurança Social é composto pelo subsistema de protecção social de cidadania, o
subsistema de protecção familiar e o subsistema previdencial. Ficavam, assim,
de fora do sistema os regimes complementares.
Para facilitar a
compreensão veja-se o seguinte esquema:
Lei 17/2000
(visa
compensar a perda ou redução de rendimentos da actividade profissional)
À margem do
sistema de Solidariedade e de Segurança Social estavam os regimes
complementares, que podiam ser de iniciativa particular ou regimes
profissionais complementares.
É de notar que foi neste diploma que se estabeleceu o
princípio de que o cálculo das pensões devia, de um modo gradual e progressivo,
ter por base os rendimentos de trabalho, revalorizados, de toda a carreira
contributiva.
Importa lembrar que, nesta altura, em sede de concertação
social, foi decidido que só a partir de 2017 é que seriam calculadas as
pensões, tendo em conta toda a carreira contributiva. Esta meta justificava-se,
na altura como hoje, para atenuar os baixos salários que a generalidade dos
trabalhadores auferiam no início das suas carreiras contributivas bem como os
efeitos das curtas carreiras contributivas, dada a juventude do sistema público
de Segurança Social em Portugal.
Outro aspecto a relevante é a consagração neste diploma
estava o princípio da diversificação das fontes de financiamento, nomeadamente
"a ampliação das bases de obtenção de recursos financeiros, tendo em vista,
designadamente, a redução dos custos não salariais da mão-de-obra."
É ainda determinado que compete ao orçamento de Estado o
financiamento das prestações familiares que não dependam da existência de
carreiras contributivas, da protecção social de cidadania e da acção social.
Passados dois anos, e com um
Governo de maioria PSD/CDS-PP, surge uma nova revisão das Bases da Segurança
Social. A Lei 32/2002 de 20 de Dezembro introduz significativas modificações na
macro estrutura da Segurança Social.
De entre as alterações mais
significativas destacam-se, quanto aos princípios: o princípio da
subsidiariedade social que assenta no reconhecimento do papel das pessoas, das
famílias e dos corpos intermédios na prossecução dos objectivos da Segurança
Social, e o princípio da coesão geracional traduzido no equilíbrio e equidade
geracionais na assunção das responsabilidades do sistema;
Contudo é na estrutura da Segurança Social que se introduzem
as alterações mais significativas, nomeadamente quanto aos regimes
complementares e aos plafonamentos
aqui, novamente, introduzidos.
Para melhor compreensão veja-se o seguinte gráfico:
Lei 32/2002
Assim, facilmente se percebe que a modificação na estrutura
visa atribuir a mesma dignidade, incluindo no sistema os regimes complementares
o que é necessariamente articulado com a introdução do plafonamento nos seguintes termos:
"Artigo 46.º
1 - O montante das quotizações dos trabalhadores por conta
de outrem e das contribuições das entidades empregadoras é determinado pela
incidência da taxa contributiva do regime dos trabalhadores por conta de outrem
sobre as remunerações até ao limite superior contributivo, igualmente fixado na
lei.
(...)
4 - Entre o limite superior contributivo, a que se refere o
n.º1 do presente artigo e um valor
indexado a um factor múltiplo do valor do salário mínimo nacional garantido à
generalidade dos trabalhadores por conta de outrem, a lei pode prever, salvaguardando os direitos adquiridos e em
formação bem como o princípio da solidariedade, a livre opção dos beneficiários
entre o sistema público de Segurança Social e o sistema complementar;
(...)
7 - A determinação legal dos limites contributivos a que se
refere o n.º 2 e 4 deverá ter por base uma proposta do Governo, submetida à
apreciação prévia da Comissão Executiva do Conselho Nacional de Segurança
Social previsto no artigo 116º, que garanta a sustentabilidade financeira do
sistema público de Segurança Social e o princípio da solidariedade."
O Governo PSD/CDS-PP recuperou o plafonamento horizontal estabelecendo um limite a partir do qual o
trabalhador não está obrigado a descontar para a Segurança Social , que havia
sido eliminado do sistema de Segurança Social em 1 de Janeiro de 1974. Com a
sua reintrodução, abrem-se, assim, as portas à privatização de importantes
receitas da Segurança Social.
A
nova Lei de bases da Segurança Social do Governo PS seu conteúdo fundamental e
seus objectivos
O PS aprovou as Bases Gerais
em que assenta o sistema de Segurança Social, propondo, para o efeito, a
revogação da Lei n.º 32/2002, de 20 de Dezembro, que aprovou as bases gerais do
sistema de solidariedade e Segurança Social.
O Governo afirma no preâmbulo da Lei que pretende "o lançamento de uma terceira geração de
políticas sociais assente, por um lado, na garantia da sustentabilidade
económica, social e financeira do sistema de Segurança Social e, por outro, na
prioridade dada ao combate à pobreza."
Por outro lado afirma o Governo que "Iniciado em meados dos anos noventa - com a concretização, ao abrigo
da Lei n.º 17/2000, de 8 de Agosto, de novos princípios em matéria de financiamento
e de uma nova fórmula de cálculo das pensões de reforma -, o processo de
reforma da Segurança Social foi, inadvertidamente, interrompido a partir de
Abril de 2002. Importa agora retomá-lo no ponto acertado, impondo-se, para
tanto, uma atitude política de realismo, de bom senso e de responsabilidade" .
Afirma ainda o Governo que "A proposta que ora se apresenta traduz, na
verdade, um corte perante as soluções contidas na ainda vigente Lei n.º
32/2002, de 20 de Dezembro, quer no plano da concepção genérica do Sistema (sua
estrutura e dimensão relativa de cada um dos seus subsistemas e regimes), quer
no plano dos princípios informadores, e contrapõe-lhe uma visão que se
considera mais progressista no modo de conceber a Segurança Social atendendo
aos constrangimentos que hoje a condicionam.
Esta
proposta pretende romper com a opção, contida na Lei n.º 32/2002, de 20 de
Dezembro, que punha em causa o princípio do primado da gestão pública do
sistema, com consequências certamente gravosas do ponto de vista social e até
económico"
Na verdade, da análise da Lei estas afirmações não encontram
correspondência no articulado da mesma, bem pelo contrário como quedará
demonstrado adiante.
Senão vejamos,
Afirma o Governo no preâmbulo que "A proposta agora apresentada pelo Governo
consagra importantes mudanças, desde logo, quanto à arquitectura do sistema.
Este aparece estruturado segundo três patamares que se pretendem articulados e
funcionando de forma integrada, garantindo a todos os cidadãos o acesso à protecção
social. Assim, em primeiro lugar, o sistema de protecção social de cidadania
que se encontra, por sua vez, dividido nos subsistemas de acção social, de
solidariedade e de protecção familiar. Em segundo lugar, o sistema previdencial
e, em terceiro, o sistema complementar, constituído, por seu lado, pelo regime
público de capitalização e pelos regimes complementares de iniciativa colectiva
e individual".
Ora, neste parágrafo o Governo reconhece de forma taxativa a
adopção da teoria dos três patamares. Esta teoria, que não é nova, assenta na
ideia da construção de um sistema de Segurança Social enfraquecido para a
prestação ou garantia dos direitos mínimos aos que se encontram abaixo do
limiar da pobreza, voltando assim a uma perspectiva assistencialista de
protecção social, abandonado com o 25 de Abril de 1974. Este nível de protecção
constitui o primeiro patamar. O segundo patamar, que é o sistema previdencial,
é aqui secundarizado. Por fim, o terceiro patamar, constituído pelos regimes
complementares, onde os cidadãos se tornam autores autónomos da sua própria
segurança, o que inevitavelmente irá conduzir a níveis de protecção melhores
para os mais favorecidos, para os mais ricos, deixando um sistema de Segurança
Social enfraquecido, de fracas prestações e que apenas garante os mínimos para
as classes sociais mais desfavorecidas. Tal constitui um claro retrocesso
social e histórico.
Quanto aos princípios que regem as bases gerais em que
assenta o sistema de Segurança Social, importa referir que todos os princípios
se mantêm em termos muito idênticos à Lei 32/2002, não havendo aqui nenhuma
novidade ou ruptura.
Analisemos a macro estrutura do sistema.
Para facilitar a compreensão e um possível comparação com a
Lei 17/2000 e a Lei 32/2002 veja-se o seguinte gráfico:
Lei 4/2007
Ora, da análise da macro estrutura, e se comparada com a
estrutura da Lei 32/2002, (Governo PSD/CDS)
facilmente se percebe que não existem diferenças de fundo, ao contrário
do que o Governo pretende fazer querer no preâmbulo da Lei.
Na verdade mantém-se a macro estrutura da Lei do Governo
PSD/CDS-PP. Aliás, o Governo, através desta Lei, torna mais clara a existência
de três patamares, mantendo ao mesmo nível e dentro do sistema os regimes
complementares.
Assim quando o Governo, afirma que estabelece um corte com a
Lei 32/2002, isso não corresponde à verdade. Nem tão pouco houve uma aproximação
à lei 17/2000. A prová-lo está uma estrutura que concretiza a política dos três
patamares e consequentemente mantém os regimes complementares dentro do
sistema, com a necessária existência de plafonamentos
para a concretização desta estratégia.
Vejamos o artigo 58.º da actual Lei.
"Artigo 58.º
Limites contributivos
1 -
A lei pode ainda
prever, protegendo os direitos adquiridos e em formação e garantindo a
sustentabilidade financeira da componente pública do sistema de repartição e
das contas públicas nacionais e o respeito pelo princípio da solidariedade, a aplicação de limites superiores aos
valores considerados como base de incidência contributiva ou a redução das
taxas contributivas dos regimes gerais, tendo em vista nomeadamente o reforço
das poupanças dos trabalhadores geridas em regime financeiro de capitalização.
2 -
A determinação
legal dos limites referidos no número anterior é baseada em proposta
fundamentada em relatório que demonstre, de forma inequívoca, o cumprimento dos
requisitos mencionados no número anterior e será obrigatoriamente precedida de
parecer favorável da comissão executiva do Conselho Nacional de Segurança
Social."
Este artigo cria um plafonamento
horizontal, com a possibilidade de aplicação de limites superiores ao valor considerado
para as contribuições. É por exemplo o que propõe o CDS-PP com a criação de um
tecto a partir do qual não seria obrigatório descontar para a Segurança Social.
Mas esta Lei vai mais longe e introduz um plafonamento
"vertical", uma vez que admite a redução da taxa contributiva para ser gerida
em sistema de capitalização. É o que propõe o PSD com a redução da taxa social
única dos trabalhadores de 11% para 5% sendo os restantes 6% entregues ao
sistema de capitalização.
Assim a Lei do Governo PS não se distancia das propostas dos
partidos da direita, bem pelo contrário: adopta, aceita e incorpora as duas
propostas, não fechando assim nenhuma das portas que visam a privatização do
sistema de Segurança Social.
É curioso, mas também significativo, que a expressão sistema
público de Segurança Social, existente na Lei 32/2000 e abandonada na Lei
17/2002, não seja recuperada pela actual de Lei.
Outro aspecto, aqui sim inovador da Lei, é o n.º 4 do artigo
63.º que determina que o cálculo das pensões de velhice e de invalidez, tendo
por base os rendimentos de trabalho, revalorizados, de toda a carreira
contributiva.
Importa recordar que foi com um Governo do Partido
Socialista, então liderado pelo Primeiro Ministro António Guterres, que se
acordou que esta nova fórmula de cálculo das pensões só entraria em vigor em
2017, para assim evitar os efeitos nefastos nas já reduzidas pensões dos
Portugueses.
A data de 2017 tinha, como tem, total sentido pelo que não
corresponde à verdade quando no preâmbulo o Governo diz " ao abrigo da Lei n.º 17/2000, de 8 de Agosto, de novos princípios em
matéria de financiamento e de uma nova fórmula de cálculo das pensões de
reforma - o processo de reforma da Segurança Social foi, inadvertidamente,
interrompido a partir de Abril de 2002. Importa agora retomá-lo no ponto
acertado, impondo-se, para tanto, uma atitude política de realismo, de bom
senso e de responsabilidade".
Ora, a antecipação da fórmula de cálculo não é realista e
não corresponde a uma atitude de bom senso porque a consequência imediata para
os trabalhadores vai ser uma redução significativa nas pensões. Dados do próprio Governo, mostram claramente isso. De acordo com um
relatório que o governo anexou ao Orçamento do Estado para 2006, a aplicação
dessa nova fórmula determinaria reduções que atingiria 8% em 2020 e, em 2030,
cerca de 12%.
Outra medida prevista na presente Lei é a introdução do "factor de
sustentabilidade" no artigo 64.º.
"Artigo 64.º
Factor de sustentabilidade
1 - Ao montante da pensão estatutária, calculada nos termos
legais, é aplicável um factor de sustentabilidade relacionado com a evolução da
esperança média de vida, tendo em vista a adequação do sistema às modificações
resultantes de alterações demográficas e económicas.
2 - O factor de sustentabilidade é definido pela
relação entre a esperança média de vida verificada num determinado ano de
referência e a esperança média de vida que se verificar no ano anterior ao do
requerimento da pensão."
O Governo justifica esta medida devido à evolução da esperança
média de vida, isto é, o Governo quer reflectir, no montante da pensão, a
evolução positiva da esperança média de vida, o que é o mesmo que dizer que a
pensão se reduz na proporção em que aumenta a esperança de vida.
O chamado "factor de sustentabilidade" consiste em, uma vez
calculada a reforma a receber por parte do trabalhador, aplicar a esse valor
uma redução que varia de acordo com a evolução da esperança média de vida.
Este factor, chamado pelo Governo como de sustentabilidade, e a antecipação
da fórmula de cálculo, leva a uma redução da taxa de substituição muito
significativa, como demonstra o gráfico que se segue elaborado pelo próprio
Governo.
Assim, as propostas do Governo determinam que a taxa de
substituição passe dos actuais 84% para apenas 55% em 2050.
Para percebermos o impacto destas medidas nos níveis de
protecção dos Portugueses, temos que referir que em
2005, de acordo com dados do próprio Ministério do Trabalhão e da Segurança
Social, a pensão média total dos Portugueses era de apenas 349,97 euros, e que
cerca de 85% dos reformados tinham pensões inferiores ao Salário Mínimo
Nacional.
Pelo que resulta claramente destes factos que a reforma
iniciada pelo Governo não irá contribuir em nada para a dignificação das
pensões, bem pelo contrário.
Aliás, este sistema é muito semelhante ao existente na
Suécia pelo que interessa recordar as palavras do Sr. Karl Gustaf Scherman,
Presidente Honorário da Associação Internacional da Segurança Social, que numa
intervenção aquando da realização do colóquio internacional sobre a reforma da
Segurança Social afirmou que as alterações introduzidas na Suécia levaram a
cortes insustentáveis nas pensões na Suécia, país que tem níveis de protecção
elevadíssimos se comparados com Portugal. Mais disse ser importante começar a
olhar para o lado das receitas, para a criação de mais emprego e para o aumento
da natalidade.
Aquando da apresentação destas medidas, o Governo apresentou
duas alternativas para compensar esta redução das pensões: ou os trabalhadores
descontariam mais, o que a grande maioria dos trabalhadores não consegue
suportar, ou trabalhariam para além dos 65 anos, para assim atenuar os efeitos
nefastos destas medidas. Assim na prática, para a generalidade dos
trabalhadores, nomeadamente os que têm salários mais baixos, poderem auferir
uma pensão digna, terão que necessariamente trabalhar para além dos 65 anos.
O PS aprovou a convergência dos regimes da função pública
com os regimes do sistema de Segurança Social e prevê que a Lei irá estabelecer
o regime jurídico da protecção obrigatória em caso de acidente de trabalho,
abandonando a perspectiva que existia de integração da protecção dos acidentes
de trabalho no regime geral da Segurança Social, integração que estava prevista
na lei de bases 28/84, na lei 17/2000, e que foi abandonada na Lei 32/2002 do
Governo PSD/CDS-PP.
Por fim importa salientar que a Lei, profícua em medidas
sobre as despesas (leia-se medidas que implicam reduções nas pensões), pouco ou
nada evolui ou adianta no lado das receitas.
É esta a evolução. A aposta no sistema de três pilares onde
o Estado assegura pensões de miséria e em que é o próprio trabalhador a
construir a sua protecção na velhice. Tendo em conta as injustiças sociais, os
salários e a escandalosa distribuição da riqueza, facilmente se percebe que
este caminho só pode conduzir a mais pobreza.
O PCP afirmou a sua alternativa. A aposta num sistema
público, universal e solidário de Segurança Social é possível e sustentável. O
Partido apresentou propostas e medidas que podiam garantir a sustentabilidade
da Segurança Social sem atacar os direitos e expectativas dos trabalhadores.
As nossas propostas: combate à fraude e evasão, novo código
contributivo, novo sistema de contribuições baseado no VAB. Estas, entre muitas
outras medidas, permitiriam percorrer outro caminho que não este.
|