Intervenção, Debate: Alternativas à crise na União Europeia, promovido pelo PCP e GUE/NGL

Intervenção de José Lourenço - «Privatizações - Argumentos vários. Um crime contra o País.», no debate sobre “Alternativas à crise na União Europeia: Direitos, Produção, Solidariedade e Soberania”

As privatizações são uma das pedras angulares da Política Neoliberal que tem presidido às teorizações e sobretudo às práticas políticas de sucessivos governos do PS, PSD e CDS/PP nas últimas décadas, sempre acompanhadas pela liberalização dos mercados e a desregulamentação dos mecanismos de orientação e direcção económica.

A aplicação de todas estas políticas neoliberais, conduziram o País ao triste estado em que se encontra hoje: desemprego profundo, com perto de 800 mil trabalhadores desempregados, dívidas elevadíssimas, défices permanentes e cada vez mais acentuados, enormes dependências e desigualdades que ao arrepio da história se vão acentuando.

Na justificação do esbulho do património público, abundam na propaganda das privatizações mentiras sistemáticas e mistificações persistentes.
Dizia esta propaganda, na 2ª metade da década de 90:
“ As privatizações permitem que o Estado se afaste do papel de accionista em empresas onde o interesse nacional já não exige a sua presença, para dedicar mais recursos à saúde, à educação e à segurança, sectores onde a sua acção é decisiva para o bem estar colectivo”, fim de citação.

Pura mentira e mistificação, muitas das empresas que foram privatizadas eram empresas de sectores estratégicos e, a sua privatização permitiu que estes sectores passassem a ser dominados pelas velhas famílias monopolistas nacionais aliadas com interesses maioritários de capitais estrangeiros.
Outra mentira contida nos parágrafos acima reproduzidos dizia que desta forma o Estado iria dedicar mais recursos `a saúde, à educação e à segurança, sectores onde a sua acção é decisiva para o bem-estar colectivo.

A esta distância passados pelo menos 15 anos destas afirmações, depois de encerrados centenas de centros de saúde e o que isso significou na degradação de cuidados de saúde, depois de encerradas milhares de escolas de uma forma cega e o que isso significou na qualidade do ensino para milhares de crianças e depois do encerramento de esquadras e da situação a que se chegou na nossa PSP e GNR, sem meios humanos, sem instalações dignas e sem qualquer perspectiva de carreira para os agentes policiais, seria cómico e apetecer-nos-ia dizer que grande lata têm estes senhores, se tudo não tivesses tido em muitos casos consequências trágicas para as nossas populações.   

Outra tese, hoje caída em desuso, pelo comportamento da GALP, EDP, BRISA, PT, etc, etc dizia “Privatização igual a fim de monopólios e mais concorrência”. O aborrecido é que a história recente das privatizações demonstra exactamente o contrário. De facto substituíram-se monopólios públicos dirigidos e regulados pelo Estado, pela vontade majestática de monopólios privados!

Como é extraordinária a propaganda das vantagens para trabalhadores e consumidores. Uns, foram despedidos aos milhares. Os outros passaram a ter ou continuaram a ter preços e tarifas e comissões, na energia, nas comunicações e transportes, nos serviços financeiros, etc, elevadíssimos comparados com os seus “concidadãos europeus” com poderes de compra, salários e pensões, várias vezes superiores!!! Os exemplos são em demasia!
Outro objectivo afirmado e muito propagandeado foi o da redução da Dívida Pública. Mas sobre esse grande objectivo basta dizer que quando as privatizações se iniciaram formalmente em 1989, a Dívida Bruta do Estado representava 54,3% do nosso PIB, hoje essa Dívida representa 82,3%. Isto é, 22 anos depois do início das Privatizações, depois de se terem arrecadado 36 mil milhões de euros, a Dívida Pública quase duplicou em relação a 1989.

A Dívida Pública transformou-se num buraco sem fim nem fundo, onde desapareceram milhões e milhões de euros sem nunca a saciarem!

Mas o objectivo central das privatizações, nunca confessado pelos sucessivos Governos mas que a realidade veio demonstrar, foi sem qualquer dúvida a reconstituição dos grupos económicos monopolistas, liquidados pelo 25 de Abril e as nacionalizações.

A reconstituição e restauração dos grandes grupos económicos portugueses, agora associados fortemente ao capital estrangeiro, fez-se à luz dos seus interesses dominantes nesta fase final do século XX e início do século XXI.
Quer isto dizer que estes mesmos grupos passaram a desenvolver as suas actividades em áreas a coberto da chamada concorrência externa e na produção dos chamados bens não transaccionáveis, onde elevados lucros estão sempre assegurados.

Os grupos económicos privados, os novos grupos privados, não foram nem serão «núcleos de racionalidade económica», mas núcleos de racionalização de interesses privados, segundo o seu muito antigo, conhecido e natural critério de racionalidade: a maximização da taxa de lucro.

Afinal foi isto que disse o patrão dos bancários Ricardo Salgado há cerca de 3 semanas quando em entrevista ao Expresso afirmou e cito “ …os administradores da PT são pagos não para fazer filantropia, mas para obter, dentro do que é legal, a maximização dos resultados” e agora acrescento eu nem que para tal se multipliquem os lucros por 8 e se reduzam os impostos para menos de metade, que foi o que se verificou com a PT em 2010.

Temo-lo dito e nunca será demais repeti-lo, nas últimas décadas fruto da adesão à CEE, da liberalização da circulação de capitais, das Privatizações, grande parte do nosso aparelho produtivo foi desmantelado e a nossa dependência do exterior atingiu níveis nunca vistos.

Tudo isto é em grande parte fruto das privatizações, já que os rendimentos pagos ao exterior têm vindo a subir em flecha nos últimos anos, estando hoje próximos dos 20 mil milhões de euros ano.

Digo rendimentos pagos ao exterior porque basta fazer-mos um exercício de verificarmos a composição accionista dos grandes grupos económicos nacionais: Galp, PT, EDP, BCP, BES, Santander Totta, BPI e BRISA, para verificarmos que cerca de 50% do capital accionista está nas mãos de estrangeiros e os lucros e a respectiva distribuição de dividendos tem subido em flecha nos últimos anos.

Só os grandes grupos económicos que resultaram do processo de privatizações e que estão no PSI 20, arrecadaram de lucros líquidos entre 2004 e 2009, cerca de 27 mil milhões de euros, ou seja a preços correntes quase que deram de lucros em 6 anos, o valor porque foram privatizados.

Por aqui facilmente se conclui que a juntar ao crime cometido contra a nossa economia com o Processo de privatizações, pelo que isso representou na destruição do nosso aparelho produtivo, a venda foi feita a pataco e o Estado não só deixou de receber estes dividendos como a compensação não surgiu do lado do IRC cobrado.

Planeamento Fiscal é coisa que não falta nestes grandes grupos económicos, veja-se o caso recente da PT, do Grupo Jerónimo Martins e dos principais Bancos Nacionais Privados e, quando ele se mostra insuficiente, ainda existem por esse mundo uns paraísos fiscais, onde ninguém pergunta a ninguém, quem és, de onde vens e para onde vais!

Depois de tudo isto, conhecidos todos estes resultados, não deixa de constituir um crime ainda maior querer prosseguir com o processo de privatizações, alienando o pouco que ainda resta e utilizando o estafado argumento da redução da dívida pública.

Todos sabemos já os resultados do pacote de privatizações aprovado, os 6 mil milhões de euros serão arrecadados, sectores importantes passarão para as mãos dos grandes interesses privados nacionais e internacionais, mais trabalhadores irão para o desemprego, o país ficará mais pobre, o tecido económico nacional mais frágil e a dívida pública continuará a crescer.

Definitivamente é necessário e urgente uma outra política, em que os interesses de Portugal e do povo português seja determinante no rumo a seguir pela política nacional. Uma outra política em que o Estado tenha uma posição dominante nos sectores estratégicos da nossa economia.

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