Intervenção de Armando Farias, Sessão pública Direitos, desenvolvimento e soberania – a alternativa à política de direita

Os efeitos da política de direita no emprego, nos salários, na contratação colectiva e nas condições de trabalho

Camaradas,

Depois de trinta e oito anos de política de direita, em que os sucessivos governos do PS, do PSD e do CDS-PP, sozinhos ou coligados, aplicaram diligentemente a cartilha do capital, quer na definição e implementação de medidas dirigidas para o aumento da exploração dos trabalhadores e a concentração da riqueza quer por via do comprometimento dos interesses nacionais com o projecto imperialista das principais potências capitalistas europeias, o nosso país encontra-se hoje, na actual etapa da submissão ao abominável pacto de agressão, numa situação politicamente insustentável, economicamente ruinosa, social e culturalmente catastrófica.

O volume impressionante depostos de trabalho que foram destruídos, aliado ao aumento do desemprego, expressa-se em números absolutamente intoleráveis e desmente, por si só, as mentiras propagandeadas pelo governo quanto a um fantasioso “virar de ciclo” no que respeita ao emprego. De facto, o governo não só não pode esconder que nos últimos cinco anos foi negado o direito ao trabalho a mais de 700 mil trabalhadores, como também não pode ignorar que no final de 2013 o nível de emprego caiu para um valor histórico, extremamente baixo.

Quanto ao perfil dos desempregados, também aumentou significativamente o número de trabalhadores em situação de desemprego de longa duração e de muito longa duração, o que mostra que é falaciosa a argumentação do governo ao justificar os cortes no valor das prestações de desemprego como incentivo à procura de emprego por parte dos trabalhadores nesta situação. Na realidade, a maioria dos desempregados não recebe hoje subsídio de desemprego e não tem quaisquer outros meios de protecção social. Quanto àqueles que ainda recebem subsídio de desemprego ou subsídio social de desemprego, as restrições de acesso são cada vez maiores e os valores das prestações cada vez mais reduzidos.

Outros factores têm hoje, também, uma importância fulcral no aumento do desemprego, total ou parcial, designadamente a precariedade dos vínculos laborais, com mais de um quinto dos trabalhadores vinculados por contratos de trabalho não permanente, assim como uma elevada liquidação do emprego por conta própria. A situação é especialmente dramática para os jovens trabalhadores, com uma taxa de desemprego próxima dos 40% e a precariedade a atingir cerca de dois terços dos jovens até aos 25 anos.

O desemprego, aliado à baixa dos salários, está a provocar a emigração forçada de milhares de portugueses que partem com as suas famílias para procurar trabalho noutras paragens, criando riqueza fora do país onde nasceram porque lhes é negado o direito de trabalharem, viverem e ser felizes na sua pátria.

A emigração abrangeu mais de 220 mil pessoas em 2011 e 2012, o que amorteceu os efeitos da perda de empregos na taxa de desemprego. Esta situação afecta a capacidade produtiva do país, tanto mais que uma parte significativa destes emigrantes são jovens com elevadas habilitações e trabalhadores qualificados, contribui para o envelhecimento da população e debilita a segurança social.

Os problemas do emprego não se resolvem com paliativos ou programas de propaganda, como aqueles que o governo anunciou recentemente – o “Garantia Jovem”, que inclui uma série de medidas, a maior parte delas já existentes no IEFP (impulso jovem, contratos de emprego-inserção, etc.), que se enquadram numa perspectiva do emprego como uma ocupação temporária, alguns estágios, mas sem garantia de trabalho efectivo, nem de direitos e condições de estabilidade e igualdade dentro das empresas.

Com estes programas, o governo pretende também convencer os jovens a criarem as suas próprias empresas, o que é revelador do seu profundo desprezo pelos trabalhadores, pois não ignora que tal não é possível, face ao definhamento do mercado interno, devido ao cortes dos salários e das pensões, sendo que a precariedade e a emigração constituem a única oferta que o governo tem para dar aos jovens.

Na verdade, a redução do desemprego só é possível com o aumento dos salários, das pensões e o consumo das famílias, de forma a estimular o crescimento económico, a par de outras políticas dirigidas para o aumento da produção nacional, do investimento público e o fim do encerramento dos serviços públicos.

Entretanto, o governo, na sequência da decisão do Tribunal Constitucional que declarou inconstitucionais os critérios introduzidos na lei para facilitar os despedimentos por extinção do posto de trabalho, voltou agora a aprovar novas alterações, mas insistindo em critérios que continuam a violar os princípios constitucionais da segurança no emprego e da proibição dos despedimentos sem justa causa.

Num momento em que o país precisa urgentemente de medidas dirigidas para travar a destruição de postos de trabalho e promover a criação de emprego, esta medida do governo está ao arrepio das necessidades do país, revela a desvalorização da pessoa do trabalhador e insere-se num processo dirigido à concretização, em Portugal, de um modelo baseado na liberalização dos despedimentos, em baixos salários e em vínculos de trabalho crescentemente precários, tal como é defendido pelo FMI.

Relativamente aos salários, tem-se sido brutal o processo de expropriação e transferência dos rendimentos do trabalho para o capital. Só nos últimos quatro anos, a expropriação foi superior a 20%, afectando todos os trabalhadores dos sectores privado, público e empresarial do Estado. O sector público tem sentido particularmente visado, com a redução dos salários e os cortes nos subsídios de férias e de natal, para além do aumento do horário normal de trabalho das 35 para as 40 horas, o que representa igualmente uma desvalorização salarial, por via da redução do salário-hora.

Mas, a redução salarial ocorre também no sector privado, por diversas vias, incluindo a alteração da legislação de trabalho para reduzir outras prestações pecuniárias, a não actualização do salário mínimo e o bloqueamento da contratação colectiva. Para além de todos os trabalhadores sofrerem um brutal aumento dos impostos, a par do agravamento do custo de vida, particularmente do aumento de preços dos produtos e bens de primeira necessidade.

O congelamento do salário mínimo nacional desde 2011 tem um grande impacto laboral e social, porque constitui um travão à melhoria dos restantes salários e porque são quase meio milhão de trabalhadores que auferem o salário mínimo, que em valores líquidos, está no limiar de pobreza.

Os cortes, e os impostos, ao incidirem também nas pensões dos reformados e pensionistas, alguns com carácter permanente, têm provocado o empobrecimento generalizado das famílias, lançando na pobreza extrema e na exclusão social, muitos milhares de portugueses.

Entretanto, as 25 maiores fortunas existentes em Portugal representaram, em 2013, 10,1% do PIB, o que traduz um aumento de 17,8% da riqueza produzida pelos trabalhadores que foi transferida para o capital. Isto mostra bem, como os grupos económicos e financeiros usam o pretexto da “crise” para aumentar os seus lucros, reforçar o seu poder económico e agravar a exploração dos trabalhadores.

O Orçamento do Estado para 2014 prolonga as dificuldades com que o país está confrontado e agrava, sobretudo, a situação dos mesmos sobre quem têm recaído todos os sacrifícios. Reforçando em mais de 4,4 mil milhões de euros as chamadas medidas de “austeridade”, o OE/2014 mostra bem a natureza de classe das opções que têm vindo a ser tomadas: de um lado são impostos mais sacrifícios para os trabalhadores, os pensionistas e as camadas mais desprotegidas da sociedade, a par da ofensiva destruidora sobre as Funções Sociais do Estado (Educação, Saúde, Segurança Social) e os serviços públicos (na justiça, na cultura, no Poder Local, etc.); do outro lado, são canalizados mais recursos para os grupos económicos e financeiros, mais uma vez premiados com muitos milhares de milhões de euros, por via da descida do IRC, dos juros da dívida pública, das parcerias público-privadas, das rendas excessivas no sector da energia, dos contractos SWAP, para além de outros contractos ruinosos e inúmeros privilégios e benefícios fiscais dados ao capital.

No domínio da contratação colectiva, mantém-se a tendência para a quebra continuada de convenções negociadas e publicadas, bem como a diminuição do número de trabalhadores cobertos pelas convenções. A situação em 2013 foi ainda mais agravada devido à diminuição significativa do número de acordos referentes a convenções sectoriais, à não publicação, em regra, das portarias de extensão das convenções (apenas 9 PE’s, o que compara com 116 em 2010), mas sobretudo, porque o próprio direito de negociação e contratação colectiva tem sido particularmente visado, nomeadamente através da emissão de um número crescente de normas ditas imperativas, que visam reduzir o núcleo de matérias susceptíveis de livre negociação.

No que toca aos regimes de caducidade e sobrevigência, confirma-se o que já se previa que viesse a acontecer, ou seja, constituem instrumentos de chantagem utilizados pelo patronato para acelerar, simplificar e agilizar por todos os meios possíveis e imaginários os processos de caducidade das convenções em vigor, a fim de liquidar os direitos dos trabalhadores nelas consagrados e promover a celebração de novas convenções, que reflictam o novo equilíbrio de forças na relação laboral resultante das revisões da lei entretanto verificadas, isto é, menos direitos para os trabalhadores e poderes patronais mais latos em todos os aspectos.

O boicote à negociação colectiva expressa-se, também, na apresentação de propostas patronais inaceitáveis, que têm o objectivo de reduzir ou mesmo eliminar direitos laborais e sociais, ou introduzir regimes de «adaptabilidade», quer se trate do «banco de horas», do «trabalho suplementar não remunerado», da «adaptabilidade grupal» ou dos «horários concentrados», entre outras formas, todas elas visando alargar os mecanismos de flexibilização do tempo de trabalho.

Ao contrário do falso discurso de modernidade que o patronato e o governo querem vender aos incautos, o que temos aqui são medidas que visam legalizar o que é ilegal, ou seja legalizar a precariedade, tendo como objectivo o prolongamento generalizado dos tempos de trabalho, que podem chegar a 60 horas semanais, além de implicarem reduções dos salários, dos subsídios de turnos, do trabalho nocturno, do trabalho prestado em dia de descanso semanal e realização de trabalho não remunerado, porque a adaptabilidade de horários prevista permite mais horas de trabalho sem o acréscimo de custos decorrente do pagamento de trabalho suplementar.

Salientamos, por último, que no mesmo sentido do aprofundamento do modelo instituído pelo Código do Trabalho, o governo prossegue o objectivo de apresentar novas alterações focadas na desvalorização da contratação colectiva, priorizando a individualização das relações de trabalho, o reforço dos poderes unilaterais das entidades patronais, a redução dos custos do factor trabalho, o enfraquecimento dos direitos colectivos, enfim, o total desrespeito pela dignidade dos trabalhadores.

Camaradas,

Apesar dos tempos difíceis que vivemos, a classe operária, os trabalhadores e as suas organizações de classe desenvolvem e intensificam a luta nos locais de trabalho e nas ruas, confirmando-se como força social insubstituível e determinante na defesa dos seus direitos e interesses e na luta transformadora, por um Portugal desenvolvido, democrático e soberano.

É esse caminho de acção e de luta que é preciso continuar, estando já marcadas numerosas lutas pelo aumento dos salários, pela defesa do emprego, dos direitos, da contratação colectiva, das funções sociais do Estado e dos serviços públicos. Grandes acções e lutas de massas vamos, também, realizar em Março, Abril e Maio, no âmbito do lema lançado pela CGTP-IN – Abril e Maio de Novo com a Força do Povo.
Assim, já no próximo dia 27, lá estaremos nas Marchas de Lisboa e Porto, para exigir a demissão do Governo, a convocação de eleições antecipadas e a ruptura com o pacto de agressão.

Por uma Política Alternativa, Patriótica e de Esquerda!
Com os Valores de Abril no Futuro de Portugal!

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