Projecto de lei n.º 226/X
Cria o subsídio social de maternidade e paternidade
__________________________________________________________________________________________________________________________
Para pesquisar a situação: clique aqui
Preâmbulo
Cada criança que nasce não tem apenas valor para os pais. Representa, também um importante valor social, garante a continuação da própria sociedade. Por isso cabe ao Estado assegurar o apoio à criança que vai nascer, à mãe durante a gravidez e o parto, e aos pais na criação das condições sociais e humanas para a criança que decidem ter.
A Constituição da República estabelece, no seu Artigo 68º, que “A maternidade e a paternidade constituem valores sociais eminentes ”. Os pais e as mães têm direito à protecção social da sociedade e do Estado.
O Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português, em 1982, apresentou na Assembleia da República três projectos de lei sobre a “Protecção e Defesa da Maternidade”, sobre a “Garantia do direito ao planeamento familiar e à educação sexual” e sobre a despenalização da interrupção voluntária da gravidez. A matriz destes projectos visaram aprofundar os mecanismos de garantia do direito à uma maternidade livre, consciente e responsável e da protecção à função social da maternidade e da paternidade.
Desde então, um importante caminho foi trilhado no aprofundamento dos direitos de maternidade e da paternidade, de que o PCP foi sempre parte activa e empenhada. Aprofundamento de direitos que foi, entretanto, interrompido com o Código de Trabalho que prevê a redução do valor do subsídio de maternidade e da paternidade quando a trabalhadora ou o trabalhador opte por uma licença de 150 dias.
Tal como afirmámos, em sessão plenária da Assembleia da República, a 27 de Maio de 2005, aquando do pedido de apreciação parlamentar relativo ao subsídio de maternidade, “o que o anterior Governo fez, foi dividir o rendimento de quatro meses por cinco, e assim, à custa dos trabalhadores, anunciar esta medida de protecção e valorização da maternidade e paternidade rodeada da mais profunda hipocrisia uma vez que não garante o efectivo exercício desse direito. Com este Decreto – Lei, o que o anterior Governo queria era dissuadir o exercício deste direito, uma vez que o magro orçamento familiar da grande maioria dos trabalhadores os vai impedir de “optar” por uma licença de maternidade, paternidade ou adopção de 150 dias.
Para o Partido Comunista Português o entendimento dos preceitos constitucionais ligam-se à prossecução de medidas que efectivem o direito de ser mãe e ser pai, não em resultado de um acaso mas como uma opção livre, consciente e responsável, o que implica o direito a determinar o momento e o número de filhos que desejam e a partilha de deveres e responsabilidades entre os progenitores.
Mas o respeito da função social da maternidade e da paternidade implica, igualmente, a responsabilidade das entidades patronais relativamente à renovação das gerações cumprindo os seus deveres para com os direitos dos trabalhadores e das trabalhadoras no exercício pleno dos seus direitos de maternidade e da paternidade. Ao Estado cabe não só uma acção de fiscalização do cumprimento das leis, mas igualmente a adopção de medidas que promovam e afirmem as suas próprias responsabilidades na protecção desta importante função social.
Entretanto as questões demográficas têm vindo a ser enfatizadas a partir de importantes centros de decisão política centradas nas questões do envelhecimento e do aumento da esperança de vida, visando fundamentar e “credibilizar” um caminho de regressão de direitos civilizacionais traduzidos pelo aumento da idade legal de reforma e pela redução dos níveis de protecção social na velhice. Estas abordagens pretendem ignorar e subalternizar o papel fundamental da natalidade como factor determinante na redução do índice de envelhecimento.
Estas abordagens ignoram a urgência de uma avaliação rigorosa dos diversos factores que têm determinado a redução da taxa de natalidade e sobretudo ignoram a adopção de políticas de protecção desta importante função social.
E as políticas necessárias passam pela salvaguarda de direitos inalienáveis das mulheres no que respeita ao controlo da sua fertilidade, do direito à não discriminação laboral e social em função da maternidade. Não são aceitáveis, por isso, medidas que diminuam o acesso das mulheres à contracepção e à informação adequada sobre planeamento familiar, nem tão pouco a manutenção de medidas penais injustas e desadequadas da realidade social relativamente à interrupção voluntária da gravidez. Porque ser mãe e ser pai por escolha é uma conquista civilizacional sendo incontornável um caminho de aprofundamento do acesso à contracepção e de despenalização do aborto.
Para o PCP a salvaguarda dos direitos de maternidade e de paternidade implica, seguramente, o estabelecimento de relações laborais baseadas no respeito dos direitos de quem trabalha e no cumprimento dos deveres das entidades patronais para com a renovação das gerações – o que implica eliminar as discriminações no acesso ao emprego por parte das mulheres, pela perspectiva de virem a ser mães, as discriminações ao exercício dos direitos em função da maternidade e da paternidade por parte de homens e de mulheres.
E, neste domínio são crescentes os exemplos de incumprimento de direitos: são os níveis elevados de desemprego que excluem milhares de trabalhadoras e trabalhadores de exercerem os seus direitos de maternidade e paternidade.
Aumentam o número de trabalhadores em situação de desemprego prolongado que não cumprem os requisitos previstos na lei para acederem ao subsídio de maternidade e paternidade e aumentam igualmente o número de mulheres à procura do primeiro emprego ou em situação de ausência de actividade laboral que estão excluídas de acederem a importantes direitos de maternidade e paternidade.
São as consequências do alastramento de relações laborais marcadas por elevados índices de exploração e precariedade laboral e de flexibilização dos horários de trabalho que se repercutem penosamente em fortíssimos constrangimentos à livre decisão sobre o momento e o número de filhos que cada mulher e casal desejam, na pressão para prescindir do exercício de direitos quanto ao acompanhamento dos filhos e ainda no incumprimento dos direitos inerentes a esta importante função social.
A salvaguarda da função social da maternidade e da paternidade implicam necessariamente a adopção de políticas de família que desincentivem a perpetuação de modelos assentes na tradicional divisão de papeis entre mulheres e homens no trabalho e na família que sustentam a privatização das funções sociais do Estado (de que é exemplo a falta de uma adequada rede pública de creches e jardins de infância) e que pretendem centrar na mulher e na família a integral responsabilidade na renovação das gerações.
Importa, igualmente o reforço dos direitos de protecção social, designadamente através do Sistema de Segurança Social na protecção da maternidade e da paternidade envolvendo toda a sociedade.
São estes motivos que se vêm de aduzir que fundamentam o presente Projecto de Lei. A maternidade e paternidade conscientes devem ser protegidas, nomeadamente através do acautelamento do seu pleno exercício nos casos em que a mulher grávida ainda não exerce qualquer profissão nem tem meios para o sustento da criança que irá nascer. Desta forma, garante-se o acesso às necessidades mais básicas para que, num prazo idêntico às mães e pais trabalhadores, se possa prover a um sustento mínimo da criança.
Equipara-se o valor do subsídio social ao da pensão social, garantindo-se a sua atribuição por 120 dias, que cessará em caso de início de exercício de actividade laboral.
Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, os seguintes deputados abaixo-assinados do Partido Comunista Português, apresentam o seguinte:
PROJECTO DE LEI
Artigo 1º
Objectivo e âmbito
1 - O presente diploma define e regulamenta a protecção social nas situações de gravidez, maternidade e paternidade aos cidadãos nacionais, estrangeiros e apátridas residentes em que preencham as condições nele previstas.
2 – A protecção social nas situações previstas no número anterior concretiza-se através da atribuição de prestações pecuniárias, e estão integradas no subsistema de solidariedade do sistema público de Segurança Social.
Artigo 2º
Forma de atribuição das prestações
1 - As prestações pecuniárias concretizam-se na atribuição do subsídio social de maternidade e de paternidade.
2 – As prestações são de montante fixo e de atribuição mensal.
Artigo 3º
Residente
1 - Para efeitos da presente lei, e sem prejuízo do estabelecido em instrumento internacional a que Portugal se encontre vinculado ou de legislação especial aplicável, é considerado como residente:
a) O cidadão nacional que possua domicilio habitual em território nacional;
b) O cidadão estrangeiro, refugiado ou apátrida habilitado com título válido de autorização de residência em território nacional, sem prejuízo do disposto nos números seguintes.
2 - Consideram-se, ainda, equiparados a residentes para efeitos de atribuição das prestações previstas neste diploma:
a) Os refugiados ou apátridas portadores de título de protecção temporária válidos;
b) Os cidadãos estrangeiros portadores de títulos válidos de permanência, ou respectivas prorrogações, nos termos e condições, a definir em portaria conjunta dos Ministros de Estado e da Administração Interna, da Presidência e do Trabalho e da Solidariedade Social.
Artigo 4º
Das condições de atribuição das prestações
1 – A atribuição do subsídio social de maternidade e paternidade à mulher depende da verificação cumulativa das seguintes condições:
a) Não exercício de actividade laboral;
b) Não ser titular de prestações de protecção na eventualidade de desemprego;
c) Não ser titular de prestações de rendimento social de inserção.
2 – A atribuição do subsídio social de maternidade e paternidade ao pai depende da verificação das condições estabelecidas no número anterior do presente artigo, bem como:
a) Da incapacidade física ou psíquica da mãe, enquanto esta se mantiver,
b) Da morte da mãe.
Artigo 5º
Montante do subsídio
O montante dos subsídios é igual ao montante da pensão social.
Artigo 6º
Início da prestação
A atribuição da prestação tem início no prazo máximo de 30 dias após o deferimento do respectivo requerimento.
Artigo 7º
Período de concessão
O subsídio social de maternidade e de paternidade é atribuído pelo período de 120 dias.
Artigo 8º
Requerimento
As prestações devem ser requeridas pelos beneficiários no prazo máximo de 6 meses a contar do facto determinante da protecção.
Artigo 9º
Meios de prova
1 – Os factos determinantes da atribuição dos subsídios são declarados pelo beneficiário no requerimento, o qual deve ser acompanhado dos respectivos documentos comprovativos, designadamente:
a) Declaração dos estabelecimentos ou serviços de saúde;
b) Certidão do registo civil.
2 – Durante o período de concessão dos subsídios, os beneficiários são obrigados a comunicar à instituição de segurança social que os abrange qualquer facto susceptível de determinar a sua suspensão ou cessação, nos cinco dias úteis subsequentes à data do mesmo.
Artigo 10º
Suspensão do direito
1 – O direito às prestações previstas no presente diploma é suspenso se se deixar de verificar a condição de atribuição prevista na alínea a), do número 1 do artigo 4º.
2 – A suspensão do direito prevista no número anterior tem lugar no mês seguinte àquele em que a entidade gestora da prestação teve conhecimento dos factos determinantes.
Artigo 11º
Cessação
1 – O direito às prestações previstas no presente diploma cessa quando deixar de se verificar algum dos condicionalismos que não dê lugar à suspensão.
2 – Os efeitos da cessação reportam-se ao início do mês seguinte àquele em que deixarem de se verificar os condicionalismos previstos no número anterior.
Artigo 12º
Não cumulabilidade de prestações
As prestações concedidas ao abrigo do disposto neste diploma não são cumuláveis com rendimentos de trabalho, prestações de subsídio de desemprego ou subsídio social de desemprego.
Artigo 13º
Alteração à Lei n.º32/2002, de 20 de Dezembro
1 - Os artigos 53º e 57º da Lei n.º 32/2002, de 20 de Dezembro, passam a ter a seguinte redacção:
“Artigo 53º
Âmbito material
1 - …
a) …;
b) Maternidade e paternidade;
c) Anterior alínea b);
d) Anterior alínea c);
e) nterior alínea d);
f) Anterior alínea e).
2 - …
Artigo 57º
Prestações
1 - …
a)…
b) Subsídio nas eventualidades da alínea b) do artigo 53º;
c) Anterior alínea b)
d) Anterior alínea c)
e) Anterior alínea d).
2 - …
3 - …”
Artigo 14º
Regulamentação e entrada em vigor
1 – O Governo regulamentará a presente lei no prazo máximo de 90 dias após a sua publicação.
2 – A presente lei entra em vigor com a aprovação Orçamento de Estado posterior à sua publicação.
Assembleia da República, em 8 de Março de 2006